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Brasil amarga lanterna no ranking da filantropia

Ranking mundial de doações coloca Brasil na 79ª posição. Mas não há motivo para ter vergonha. França, Portugal e Japão estão ainda piores na lista, mesmo oferecendo mais isenções fiscais

Crédito: Paula Bronstein

Em Portugal, doações para entidade de ajuda humanitária têm um regime especial de dedução que chega a 15% do imposto de renda a pagar (Crédito: Paula Bronstein)

Por Wagner Matheus, de Lisboa

De acordo com o Mapa das Organizações da Sociedade Civil, um estudo realizado pela Secretaria-Geral da Presidência da República em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o total doado para organizações filantrópicas no Brasil em 2020 foi de R$ 16,9 bilhões. Embora muitos brasileiros tenham se sensibilizado com a situação de penúria causada pela pandemia de Covid-19 e aderido a campanhas para ajudar quem mais precisava, o valor das doações no primeiro ano da crise sanitária representa um aumento de apenas 3,8% em relação a 2019.

Por trás da baixa adesão à pratica não está necessariamente a indiferença com o sofrimento alheio e sim a falta de incentivos que permitam às pessoas físicas e jurídicas brasileiras deduzir do imposto de renda o dinheiro destinado a instituições sem fins lucrativos e a ONGs. A regra fiscal em vigor no País limita a dedução em 2% do imposto de renda para ações de impacto social. É pouco.

De acordo com o World Giving Index 2021, da Charities Aid Foundation (CAF), que classifica os países com base em três comportamentos de doação (em dinheiro, voluntariado e ajuda a estranhos), o Brasil ocupa a 79ª posição no ranking mundial da filantropia.

O relatório mostra que, em 2020, 58% da população adulta do Brasil afirmou ter feito uma doação em dinheiro, enquanto 19% relatou ter se voluntariado e 33% disse ter ajudado um estranho. Os países que ocupam as cinco primeiras posições no ranking mundial de doações filantrópicas são Indonésia, Quênia, Nigéria, Mianmar e Austrália.

Legislação capenga

O mesmo estudo mostrou que as doações de pessoas físicas têm sido a principal fonte de recursos para as organizações filantrópicas no Brasil. Em 2020, elas representaram cerca de 55% do total.

As doações de empresas e de outras fontes, como governos e organismos internacionais, também têm contribuído para o financiamento das atividades das organizações filantrópicas no País.

Segundo Andrea Lopes Figueiredo, vice-presidente do Instituto Fefig, focado no setor de educação, o Brasil poderia estar entre os 20 primeiros no ranking de filantropia caso houvesse mais incentivo.

“Infelizmente, não há lei, em âmbito municipal, estadual ou federal, comparável à Lei Rouanet, incentivadora da cultura”, disse. “Acredito que isenções tributárias para pessoas físicas e jurídicas teriam um papel importante no aumento de doações filantrópicas.”

Andrea Lopes Figueiredo VP DO Instituto Fefig: “Acredito que isenções tributárias para pessoas físicas e jurídicas teriam um papel importante no aumento de doações filantrópicas” (Crédito:Divulgação)

Segundo ela, não há nada no horizonte de curto a médio prazo que garanta mudanças. A única iniciativa no Congresso referente ao tema é do deputado federal Beto Richa (PSDB–PR), que prevê acabar com a retenção de imposto dos valores que são endereçados a entidades que atuam nessa área, como Cruz Vermelha e Médicos Sem Fronteiras.

Hoje, remessas internacionais para essas organizações estão sujeitas a uma alíquota padrão de 15%. Em muitos países, a isenção nesses casos é total.

Curiosamente, segundo os dados do estudo WGI, se não é a riqueza de um país que torna as pessoas mais generosas (basta ver as primeiras posições), tampouco é o nível de educação.

Tanto assim que no final da fila do ranking de doações, entre 114 países pesquisados, está o Japão, onde apenas 12% da população doou algum valor em 2020. Também na lanterna estão Portugal (113ª colocação), Itália (111ª) e França (106ª). Olhando para essa lista, até que o Brasil não está tão mal.

Como é a legislação lá fora

ESTADOS UNIDOS
Pela legislação, as doações para organizações filantrópicas são dedutíveis do imposto de renda federal e, em alguns casos, também do imposto devido ao governo estadual. As deduções fiscais variam de acordo com o tipo de doador e a natureza da doação. Pessoas físicas que fazem doações para organizações filantrópicas reconhecidas pelo governo federal podem deduzir até 60% de sua renda bruta ajustada anual em doações em dinheiro, enquanto as empresas podem deduzir até 10% de sua renda bruta ajustada anual. De acordo com um relatório divulgado pela Giving USA, em 2021 as doações à caridade nos EUA totalizaram US$ 471,44 bilhões (R$ 2,514 trilhões). Isso representa um aumento de 10,6% em relação a 2019, último ano antes da pandemia. As principais áreas de doação foram para instituições religiosas, educação, organizações humanitárias, saúde e cultura.

FRANÇA
As pessoas podem se beneficiar de uma dedução de imposto de renda para doações feitas a organizações elegíveis. A redução é baseada em uma escala móvel, com diferentes alíquotas aplicáveis dependendo do valor doado e do tipo de organização. Geralmente, os doadores podem se beneficiar de uma dedução de até 66% do valor doado, com um limite máximo de 20% de sua renda tributável. Para certas organizações, como aquelas envolvidas em ações humanitárias ou sociais, a taxa de dedução pode ser maior, alcançando até 75%.

PORTUGAL
Doações de cidadãos especificamente à organização Médicos Sem Fronteiras, que realiza ajuda humanitária de urgência a vítimas de conflitos armados, epidemias, catástrofes e exclusão, garantem dedução equivalente a 25% do valor dos donativos, mas até o limite de 15% do imposto de renda a pagar.