Tecnologia

A nova onda da Adobe: fazer arte com IA

Dona do monopólio de softwares para design gráfico lança inteligência artificial que promete revolucionar o mercado e aumentar produtividade dos profissionais

Crédito: Istockphoto

Arte com Inteligência Artificial: uma mistura que envolve corações, mentes e muita polêmica (Crédito: Istockphoto)

Por Victor Marques

Desde que a Adobe nasceu só se fala em Adobe. A empresa detém o monopólio de softwares para design gráfico desde a década de 90, quando a segunda versão do Photoshop dominava os palcos tanto da edição de fotografia, quanto do design no geral. Com a ferramenta preferida do mercado, a empresa desenhou uma história de sucesso, tornando-se hoje a principal do segmento, com US$ 219 bilhões em valor de mercado e receita de US$ 17 bilhões em 2022, resultado 12% maior que em 2021 ­— o lucro chegou a US$ 7,95 bilhões. Para manter a posição forte de liderança no segmento, anunciou em setembro do ano passado a aquisição do Figma, um forte concorrente que vinha ganhando força. Neste ano, olhando para o boom da inteligência artificial (IA), anunciou sua nova ferramenta, o Firefly: um sistema de IA completo que, por agora, tem aplicações principalmente no Photoshop e no Adobe Express para criação e edição de imagens mediante comandos de texto.

“A IA generativa é a próxima evolução da criatividade e produtividade orientadas pela IA”, disse em comunicado oficial David Wadhwani, presidente de Negócios de Mídia Digital da Adobe. “Irá transformar a conversa entre o criador e o computador em algo mais natural, intuitivo e poderoso.”

Para ele, o Firefly ajuda a Adobe com ‘ingredientes criativos’ gerados e alimentados por IA diretamente para os fluxos de trabalho dos clientes, aumentando a produtividade e a expressão criativa para todos os criadores.

Uma maneira de dar superpoderes para trabalhar na velocidade de sua imaginação, como divulgou a marca no anúncio oficial. Os usuários poderão usar suas próprias palavras para gerar conteúdo da maneira que imaginarem, desde imagens, áudio, vetores, vídeos e 3D até ingredientes criativos, como pincéis, gradientes de cor e transformações de vídeo, com maior velocidade e facilidade.

A IA entra com variações ilimitadas de conteúdo e alterações repetidas, tudo rápido e simples. A ferramenta junta em um só lugar funções que já são encontradas de certa forma em outras ferramentas no mercado, como Midjourney (da empresa de mesmo nome) e o DALL-E (da OpenAI).

“A expectativa é de que no futuro ela integre toda a cadeia de experiência da companhia, o que inclui todo o pacote de softwares de edição, entre outros”, disse à DINHEIRO Alex Affonso, gerente regional de Capacitação e instrutor Latam da Adobe.

No momento, a função está disponível apenas para quem se inscrever no acesso limitado de testes, o beta da plataforma, que já gerou mais de 100 milhões de assets, ou imagens, desde seu início.

Alex Affonso, gerente regional Latam da Adobe: “O Firefly no futuro vai integrar toda a cadeia de experiência da companhia.” (Crédito:Divulgação)

Polêmicas

O trunfo principal do Firefly está no Adobe Stock, o banco de imagens proprietário da empresa. A IA gera todos os conteúdos quase que 100% a partir dessa base, o que reduz muito as preocupações de direitos autorais e outras regulações. Já é tudo da Adobe.

Um ótimo começo, sendo que uma das principais preocupações do mundo hoje é regular a IA, visando proteger principalmente os interesses dos autores originais dos conteúdos.

Os roteiristas nos EUA estão em greve por esse motivo e fotógrafos do mundo todo estão mais que assustados, sendo que uma fotografia feita com IA ganhou o Sony World Photography Awards, um dos maiores concursos de fotografia do mundo.

Em janeiro deste ano, a União Europeia já anunciou publicamente o desejo de regulamentar a ferramenta, e agora em junho o projeto parece estar perto de um fim.

Os EUA foram mais rápidos. O governo do país legislou em março para que as imagens geradas por inteligência artificial não possam ter direitos autorais.

“Quando uma tecnologia de IA recebe apenas uma solicitação de um humano e produz trabalhos escritos, visuais ou musicais complexos em resposta, os ‘elementos tradicionais de autoria’ são determinados e executados pela tecnologia — não pelo usuário humano”, afirmou o escritório oficial de direitos autorais dos EUA (Usco) em comunicado oficial.

Enquanto isso, o escritório criou uma iniciativa para explorar ainda mais a lei de direitos autorais e questões políticas relacionadas à IA, seguindo solicitações do Congresso e do público.

O escritório planeja solicitar comentários públicos ainda este ano sobre uma série de questões de direitos autorais relacionadas ao uso de IA.

A IA do Firefly utiliza o Adobe Stock como banco de imagens, reduzindo os problemas com direitos autorais (Crédito:Divulgação)

Para Hugo Rodrigues, presidente do conselho do McCann Worldgroup para WMcCann, Craft Brasil e Aldeiah, desde que foi anunciada, havia uma expectativa alta pela chegada do Firefly, exatamente por ser uma ferramenta de inteligência artificial generativa que tem como diferencial o fato de estar integrada ao editor de imagens mais usado no mundo, o Photoshop.

Pelo menos em tese, pode fazer com que o uso da ferramenta no processo criativo seja absorvido pelos profissionais da área de maneira mais orgânica, sem fricções.

“É como se você pudesse usá-lo de forma mais integrada ao próprio processo de criação. É um avanço importante”, disse.

Outro ponto destacado por ele é o de proteção de direitos autorais. Como foi treinado com material livre de proteção de direitos autorais, isso dá mais garantias para o uso desses criativos por marcas, sem riscos legais.

No papel, a Adobe parece ter o futuro do design gráfico nas mãos. Mas no mundo da tecnologia, tudo pode acontecer.

Entrevista com Hugo Rodrigues, presidente do conselho do McCann Worldgroup

O Firefly mudará o mundo do design gráfico?
Ainda é cedo para falar sobre impactos definitivos no design gráfico e, inclusive, para fazer comparações com outros modelos de IA generativa de imagens. Em tese, pode fazer com que o uso da ferramenta no processo criativo seja absorvido pelos profissionais da área de maneira mais orgânica, sem fricções. Em resumo, é como se você pudesse usá-lo de forma mais integrada ao próprio processo de criação. É um avanço importante.

Postos de trabalho serão suprimidos?
Eu não sou muito adepto de exercício de futurologia. Mas acredito que a IA não vai matar posições, ela pode permitir que as pessoas deixem de trabalhar de fim de semana e fora do horário de trabalho em atividades corriqueiras, que podem ser automatizadas. Não vejo como um inimigo, mas como um aliado para a eficiência.

Hugo Rodrigues, presidente do conselho do McCann Worldgroup: “A falta de supervisão em operações automatizadas abre espaço a erros” (Crédito:Divulgação)

Quais as preocupações?
Receio que a IA possa afetar negativamente a nova geração de criativos e o processo de pensamento original, assim como a prática de habilidades artísticas. Além disso, a falta de supervisão humana nas operações automatizadas pode abrir espaço para erros, falhas de segurança e outros problemas operacionais.

Vocês já estão testando a ferramenta internamente?
Temos estimulado seu uso como parte do processo de criação. É um recurso muito eficiente para esboçar ideias, fazer drafts realistas. Gosto muito desse uso, que tem como foco prioritário trazer um ganho em eficiência.

Quais outras ferramentas têm potencial?
O Midjourney e o DALL-E são as principais ferramentas que têm sido usadas e mostrado potencial importante no uso profissional. O Google também anunciou duas ferramentas de inteligência artificial generativa que podem ser importantes. A Stability AI lançou um modelo de IA generativa de código aberto, o Stable Diffusion, que pode gerar mais avanços.