Economia

A injeção da Galderma

Farmacêutica especializada em cuidados com a pele cresce com base na estética injetável e investe US$ 200 milhões na ampliação da fábrica de ácido hialurônico

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Para a Galderma, Brasil tem importante relevância no desenvolvimento da estética injetável (Crédito: istockphoto)

Por Lara Sant’Anna, de Estocolmo

Quando olhamos muito para um objeto, um desenho, ou até mesmo um texto, começamos a encontrar imperfeições. Palavras que poderiam ser substituídas ou uma linha que ficou torta. Passamos a observar detalhes. O mesmo vale para o nosso rosto ou corpo. Quando olhamos demais para eles, encontramos novas marcas e decidimos que algo precisa ser alterado — muitas vezes com base em pressões vindas dos padrões de beleza de ocasião. De toda forma, é um mercado tão antigo quanto crescente, em particular no caso dos procedimentos injetáveis que não exigem cirurgias (aplicação de toxinas botulínicas, ácido hialurônico ou bioestimuladores de colágeno). Na briga pela liderança desse universo está a suíça Galderma.

A empresa, que surgiu em 1981 de uma joint venture entre Nestlé e L’Oréal, desde 2019 é independente e alavanca seu crescimento com os produtos injetáveis.

O carro-chefe é o Restylane, o primeiro ácido hialurônico injetável lançado no mundo. A fábrica do produto está passando por expansão, com investimento de aproximadamente US$ 200 milhões, que vai triplicar sua capacidade produtiva.

O Restylane foi lançado no mercado em 1996 pela farmacêutica sueca Q-med, comprada pela Galderma em 2011. Atualmente, a fábrica de Uppsala, na Suécia, produz as seringas. São 15 milhões de unidades por ano e ao final das obras de expansão, em 2024, a planta irá produzir 45 milhões, com espaço para crescer ainda mais.

Desde seu lançamento nos anos 90, a Galderma estima que foram realizados com seu produto 55 milhões de tratamentos — e cada um deles pode exigir o consumo de mais de uma ampola.

O investimento em Uppsala é justificado pelo potencial do setor. Levantamento da Grand View Research estima que o mercado de injetáveis facial deva alcançar US$ 27,6 bilhões em 2030, contra US$ 12,7 bilhões em 2022. Na Galderma, o setor de estética injetável teve crescimento de 22,3% no ano passado, impulsionando os resultados da empresa, que no período alcançou US$ 3,7 bilhões em faturamento.

Crescimento constante

Para 2023, a empresa projeta incremento de vendas líquidas de 6% a 9%. “Estamos cumprindo nossa ambição de liderança na categoria em dermatologia por meio de foco na execução comercial, portfólio e expansão geográfica, nosso pipeline de inovação e lançamentos de produtos”, disse o CEO da Galderma, Flemming Ørnskov.

O ácido hialurônico é um dos queridinhos da estética atualmente. Por ser produzido pelo próprio corpo, é uma opção mais segura — o procedimento entra para repor ou estimular o que nosso corpo já carrega.

No portfólio da Galderma, o produto possui diversas versões, cada uma com um tipo de tecnologia e formulação que permite aplicação diferenciada, considerando os objetivos do paciente.

Esse portfólio possibilita desde aplicação para estruturar o rosto, com um produto que simula um osso, até para preenchimento dos lábios, com uma linha feita especificamente para essa região, mais maleável, considerando as movimentações e musculatura da boca.

Além do Restylane, outro sucesso da empresa é o bioestimulador de colágeno Sculptra. A estimativa é que a partir dos 20 anos perdemos 1% de colágeno ao ano e o produto ajuda a estimular essa produção.

Ele é muito usado por famosas e influenciadoras para reduzir a flacidez do corpo e tirar celulites. O produto está disponível em mais de 40 países, e o Brasil é um dos principais mercados.

A Galderma, inclusive, tem influenciadores e embaixadores de peso para o Sculptra, como a apresentadora Sabrina Sato e a cantora Ivete Sangalo.

(Göran Ekeberg)

A empresa também produz toxinas botulínicas e está desenvolvendo a RelabotulinumtoxinA (QM-114), um neuromodulador exclusivo, pronto para uso, com uma cepa proprietária de toxina botulínica tipo A.

O produto já apresentou resultados promissores nos testes clínicos para redução de linhas de expressão, como os conhecidos pés de galinha.

Segundo o head global de Estratégia de Produtos da Galderma, Gerry Muhle, “esta solução revolucionará a categoria de neuromoduladores e é uma grande expectativa para a companhia”, disse. “Nós também estamos trabalhando em outros preenchedores de ácido hialurônico para a linha Restylane”, disse Muhle.

O País tem grande relevância na Galderma. Mundialmente, é o terceiro maior mercado de dermatologia, atrás dos Estados Unidos e da China.

Para a empresa, no entanto, a filial brasileira é a segunda maior em faturamento.

Além das vendas, a importância nacional está nos profissionais e na criação de pesquisa e conhecimento na área de injetáveis.

Os brasileiros têm criado técnicas de aplicação dos produtos e ajudado a desenvolver o segmento, sendo reconhecidos mundo afora. De acordo com o cirurgião plástico e membro titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica Daniel Boro, o crescimento da medicina estética tem impulsionado os médicos na busca por conhecimento.

“Os próprios médicos passaram a querer estudar mais tanto sobre a partícula e o mecanismo de ação de cada produto, quanto sobre anatomia. Hoje temos conceitos anatômicos que há cinco anos não tínhamos.”
Daniel Boro, cirurgião plástico e membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica 

Galderma tem time de peso de influenciadores e artistas, como a apresentadora Sabrina Sato. Mais acima, a fábrica da marca na Suécia (Crédito:Divulgação)

A relação da Galderma com os profissionais é uma alavanca de crescimento. Em 2022, foram mais de 100 mil profissionais treinados em todo o mundo. Esse relacionamento é estruturado com a Gain (Rede de Estética Injetável da Galderma, na tradução), que possui vários eventos e ações, entre eles, a Gain Uniq — que congrega os principais profissionais do País para fomento de pesquisa e troca de experiência — e a Gain Connect, plataforma para educação continuada.

Por meio dela, aqueles que estão começando no universo de injetáveis podem realizar cursos e treinamentos sobre os produtos e aplicações.

Ela também possui o propósito de ajudar na sobrevivência das clínicas e, para isso, oferece conteúdos sobre gestão dos negócios.

Essa preocupação com o treinamento é importante para prevenir casos mal sucedidos nas aplicações, no que ficou conhecido nas redes sociais como “demonização facial”, e consequente marketing negativo quanto aos procedimentos.

Para Boro, a indústria ocupa um espaço importante na educação, já que as universidades possuem restrições de orçamento ou até mesmo de pesquisas. “É do interesse da indústria desenvolver novas técnicas e investir em educação para tentar produzir mais com os produtos dela”, disse Boro.

Diversificação

* Estética injetável é uma das três áreas de atuação da Galderma.
* As outras incluem Dermatologia Terapêutica, com produtos medicamentosos para tratamento de acnes, por exemplo;
* e Cuidados Dermatológicos, que teve crescimento de 30,7% em 2022.

A área é responsável pela marca Cetaphil, a principal da empresa na venda direta para o consumidor.

Segundo Juan Gaona, que lidera a operação da Galderma na América Latina, o tripé de atuação permite que a empresa entenda melhor o paciente e ofereça mais opções de tratamento aos médicos.

“A companhia se estruturou entre as unidades autônomas, o que permite que a gente tenha foco em cada um desses negócios.”
Juan Gaona, líder da operação da Galderma na América Latina

Mas o conhecimento acaba sendo transversal e estratégico. “Porque também trabalhamos de maneira conectada ao que chamamos de plataforma integral de dermatologia.”

Flemming Ørnskov comanda a Galderma na briga pela liderança na categoria de dermatologia (Crédito:Tristan Paviot / Capa Pictures)

A Galderma tem a seu favor um mercado em constante desenvolvimento, movido por tendências estéticas e pela busca eterna da beleza.

Graças às inovações e aos investimentos em pesquisa, os pacientes conquistam resultados cada vez melhores e a indústria fatura com a continuidade que os tratamentos exigem, gerando um círculo virtuoso e bilionário.