“Temos um sólido plano de expansão”
Para o executivo que desde o ano passado ocupa a posição número 1 da montadora alemã no País, a marca tem se beneficiado da tendência de alta demanda global por veículos exclusivos e luxuosos, mas para um mercado em rápido crescimento como o Brasil, equilibrar demanda e oferta é fundamental
Editora Três
Edição 23/06/2023 - nº 1330
Por Celso Masson
Desde que a montadora de carros esportivos Porsche chegou oficialmente ao Brasil, em 2015, as vendas saltaram de 732 unidades para 3.202 no ano passado. Mesmo com modelos que ultrapassam a casa de R$ 1 milhão. A julgar pelos números, não existe crise para o segmento no País. “Com certeza estamos felizes e orgulhosos da história que temos escrito no Brasil ao longo dos últimos anos, com nossos parceiros e clientes”, afirmou à DINHEIRO o CEO da Porsche no Brasil, Peter Vogel. Segundo ele, porém, essa ótima performance não é exclusiva do mercado local. Em 2022, a marca bateu recordes de faturamento, com receita de 37,6 bilhões de euros e 309.884 de veículos entregues.
“Nós nos beneficiamos da tendência da demanda global por veículos exclusivos e luxuosos, bem como tecnologias excepcionais e sustentabilidade”, disse o executivo que assumiu o cargo no Brasil em setembro, mês do IPO da empresa na Alemanha.
DINHEIRO — Que fatores foram decisivos para a Porsche alcançar resultados tão bons no Brasil?
Peter Vogel — Resultados como esses só são possíveis devido a um plano de desenvolvimento de longo prazo e parceiros varejistas fortes e comprometidos. Desde que a Porsche Brasil foi fundada, trabalhamos juntos e com muita dedicação para melhorar nossa operação, estar mais próximos de nossos clientes e oferecer melhores serviços e experiências. Temos um sólido plano de expansão da rede de concessionárias. A partir de 2015, novas localidades foram agregadas, caso de Belo Horizonte, Goiânia e Fortaleza, entre outras capitais e cidades do País.
Esse processo envolveu algum tipo de adaptação específica para atender ao cliente brasileiro?
Foram introduzidas novas soluções, como pacotes de manutenção e serviços financeiros, entre outras. Implementamos também várias plataformas de experiência, como os programas Driving Experience. Para o futuro, a eletrificação terá um papel importante. Por isso, a Porsche Brasil e sua rede de concessionárias já investiram mais de R$ 32 milhões para construir um ecossistema de recarga abrangente. E seguimos avançando: acabamos de anunciar uma parceria com a Audi e a Raízen, investindo mais R$ 24 milhões na instalação de novos carregadores rápidos para conectar as principais cidades do Brasil.
O mercado brasileiro responde por menos de 1% das vendas globais da Porsche. Isso significa que ainda há muito espaço para crescer por aqui?
O Brasil é um país lindo, com desafios e também muitas oportunidades. A eletrificação é um ótimo exemplo: mais de 75% da eletricidade gerada no Brasil vem de fontes verdes e renováveis. Esse número é muito superior ao que encontramos em outros países, colocando o Brasil em uma ótima posição para o futuro.
“Mais de 75% da eletricidade gerada no Brasil vem de fontes verdes e renováveis. Esse número coloca o País em uma ótima posição para o futuro”
E quais são as expectativas para o Brasil em 2023?
O objetivo para 2023 é continuar a crescer de forma moderada, rentável e, assim, manter de forma consistente o curso de expansão dos últimos anos. O foco permanecerá na demanda e oferta equilibradas. Isso significa que buscaremos crescimento qualitativo e não puramente na quantidade de entregas. Um exemplo é a recente inauguração do segundo Porsche Center em São Paulo, onde podemos receber mais clientes e oferecer maior capacidade de atendimento.
O IPO da Porsche, no ano passado, foi o maior da Alemanha desde a Deutsche Telekom, em 1996, e levantou 19,5 bilhões de euros. O que isso representa para o negócio e para o futuro da marca?
A abertura de capital foi um passo em direção a uma maior autonomia e dá à Porsche mais liberdade e agilidade em suas decisões de negócios. A Porsche agora é uma empresa independente. Somos rentáveis, ágeis e flexíveis. Isso nos dá uma grande base sobre a qual construímos valor para o acionista. Conseguiremos obter o melhor dos dois mundos: os benefícios do nosso posicionamento de luxo com as sinergias do grupo VW. Acreditamos que isso nos coloca em uma posição sem paralelo na indústria automotiva.
Carros estão cada vez mais tecnológicos, com sistemas de direção autônoma e eletrificação em todo o mundo. Como essas tendências afetam o desenvolvimento de modelos esportivos?
A Porsche sempre se destacou por uma competência excepcional nas áreas de tecnologia e inovação. O próprio nome da empresa afirma ser especialista: Dr. Ing. significa doutor em engenharia [a empresa foi registrada em 1931 como Dr. Ing. h.c. F. Porsche AG]. A esse respeito, é importante lembrar que desenvolvemos tecnologia para o benefício dos clientes e condutores. No caso da direção automatizada, o objetivo não é ser a primeira empresa a comercializar veículos com essa função. Para a Porsche, o desenvolvimento se concentra na maior utilidade possível e na alta confiabilidade. Falando em eletrificação, é um fato conhecido que, para o ano de 2030, a meta da Porsche é que mais de 80% de suas entregas de carros novos sejam modelos totalmente elétricos. O Porsche Taycan é a melhor expressão de como vemos essa nova tecnologia, que não só contribui para a alta eficiência energética com também para o desempenho e a esportividade. O Taycan não é só um carro elétrico, é o Porsche entre os elétricos.
A segurança é um atributo que influencia na compra? Como a empresa trabalha para tornar seus carros mais seguros para quem viaja a 300 km/h?
Se você der uma olhada nos tempos de volta [na pista] em Nürburgring, verá que o desempenho agora é muito mais acessível aos pilotos. Em 2020, nosso sedã Panamera Turbo S completou a volta em 7 minutos e 25 segundos. O Carrera GT, nossa lenda dos anos 2000, com motor V10, completou a mesma pista em 7 minutos e 28 segundos. Abordamos o desenvolvimento do carro de uma forma muito holística, procurando oportunidades de melhoria em todos os aspectos, a cada geração. O mesmo princípio é naturalmente aplicado à segurança, uma combinação de sistemas passivos e ativos projetados para auxiliar e proteger motoristas, passageiros e pedestres. No Brasil, temos o limite de 120 km/h em vias públicas e ele deve ser sempre respeitado. Por essa razão, para dar aos clientes a experiência de melhorar suas habilidades de direção esportiva e acessar todo o potencial de seus veículos, oferecemos várias oportunidades para fazê-lo em ambientes controlados e seguros — como os programas Track Experience, incluindo nosso novo programa Sport Challenge, nosso próprio evento de track day [literalmente, dia de pista, para pilotos não profissionais].
A pandemia de Covid-19 afetou a indústria automotiva global com escassez de produtos, principalmente semicondutores. Isso levou a longas filas para carros novos. Como está o fornecimento de autopeças agora?
Ainda existem riscos para as cadeias de suprimentos, principalmente no que diz respeito à disponibilidade de componentes individuais, como semicondutores, e logística. Em cooperação com nossos parceiros, monitoramos continuamente a situação com componentes críticos, bem como a situação com fornecedores. Com relação aos semicondutores, examinamos nossos produtos de maneira estruturada quanto a possíveis indisponibilidades e determinamos como podemos eliminar os riscos dos produtos e desenvolver inovações e soluções adequadas. Devido à escassez de semicondutores, mudamos nossa abordagem na aquisição. Estamos estabelecendo parcerias diretas com fabricantes, concluindo contratos de hedge e também realizando investimentos próprios. Os tempos de espera por veículos novos para clientes variam muito em todo o mundo, dependendo do mercado e da série do modelo. Nossos veículos são altamente personalizáveis, refletindo os sonhos e desejos dos nossos clientes. Dependendo das opções escolhidas, podem ser esperados prazos de entrega maiores.
Qual sua opinião sobre o incentivo do governo federal para baratear os carros populares?
As políticas anunciadas recentemente estão focadas em veículos abaixo de nossa faixa de preço de entrada. Portanto, não estamos em uma posição que nos permita participar do debate e comentar sobre isso.
Assumir o comando de uma empresa em crescimento é sempre um desafio. Qual foi a maior dificuldade até agora no cargo de CEO da Porsche Brasil?
Não uma dificuldade, mas sim uma missão. A Porsche existe para ajudar seus clientes a realizarem seus sonhos. Em um mercado em rápido crescimento como o Brasil, equilibrar demanda e oferta é fundamental. A Porsche Brasil e seus parceiros precisam estar preparados para oferecer experiências e serviços de alta qualidade a todos os novos clientes que agora estão se juntando à nossa família.
“Ainda existem riscos para as cadeias de suprimentos, principalmente no que diz respeito à disponibilidade de componentes individuais, como semicondutores, e logística”
Os brasileiros são bons consumidores da marca? Cuidam bem de seus carros?
Os brasileiros são muito apaixonados quando se trata de carros e automobilismo. No ano passado, reunimos 813 modelos Porsche e mais de 17 mil pessoas em Interlagos para o nosso festival anual, o Sportscar Together Day. Esse é um número impressionante, uma das maiores reuniões da Porsche já registradas. Esperamos alcançar um novo recorde este ano com a próxima celebração do 75º aniversário da Porsche, em novembro.
Quais são os compromissos da Porsche para reduzir as emissões de CO2 e em relação à sustentabilidade de um modo geral?
A Porsche está comprometida com o acordo climático de Paris — e também estabeleceu metas ambiciosas. Pretende ser neutra em CO2 até 2030 em toda a cadeia de valor e no ciclo de vida dos veículos recém-vendidos. Nosso programa de descarbonização adota medidas específicas: seguimos a lógica de evitar e reduzir as emissões de CO2; apenas o último passo para nós é a compensação. Em 2030, a participação dos novos veículos totalmente eletrificados da Porsche está planejada para ser superior a 80%. Além disso, estamos investindo no desenvolvimento e industrialização de E-Fuels [combustíveis sintéticos feitos a partir de hidrogênio e dióxido de carbono, sem petróleo]. Acreditamos que os E-Fuels podem contribuir significativamente para reduzir as emissões de CO2 da frota híbrida no futuro. Nosso compromisso, no entanto, também inclui a adoção de várias medidas para reduzir a pegada em nossas operações, incluindo os parceiros varejistas com os quais trabalhamos.