FSC Amazônia 10 perguntas

Entrevista

10 perguntas para Daniela Teixeira Vilela, diretora-executiva do FSC Brasil

Willian Diez

10 perguntas para Daniela Teixeira Vilela, diretora-executiva do FSC Brasil

Editora Três
Edição 30/06/2023 - nº 1331

Por Lana Pinheiro

Organização não governamental criada para impedir o avanço da destruição das florestas tropicais do mundo, o Conselho de Manejo Florestal — mais conhecido pela sigla FSC, de Forest Stewardship Council — avança nos trabalhos de proteção da Amazônia brasileira. Além de manter as certificações que atestam o manejo responsável do bioma, começa a trabalhar para conectar a economia local com consumidores das demais partes do País.

Os objetivos, segundo Daniela Vilela, diretora-executiva da iniciativa, passam por fazer os produtos da floresta mais conhecidos, preparar os produtores comunitários para relações comerciais que tragam impacto de qualidade para as comunidades e ajudar as empresas a prepararem processos para incluí-los. Assim, pretendem aumentar a relevância da região para a população. “A narrativa de que o defensor da floresta e das terras indígenas é contra o crescimento econômico é totalmente desconectada com os benefícios diretos que a Amazônia traz”, afirmou nesta entrevista à DINHEIRO.

Como a sra. avalia o processo de conscientização do brasileiro sobre a manutenção da Amazônia como um bioma que precisa ser preservado?
Estamos engatinhando. O volume de ações de preservação está aumentando, mas, infelizmente, ainda são pontuais. Muitas são exceções que não acontecem porque a empresa acredita verdadeiramente na agenda, mas sim para atender uma pressão do acionista ou da opinião pública.

Falta ao empresário entender o poder econômico da floresta em pé?
Ainda é forte a percepção de que a floresta é obstáculo ao desenvolvimento. A narrativa de que o defensor da floresta e das terras indígenas é contra o crescimento econômico é totalmente desconectada com os benefícios diretos que a Amazônia traz, sejam eles produtos comercializáveis ou o fato de ser crucial para a manutenção dos recursos hídricos, da qualidade do ar e da biodiversidade. Esse tipo de informação enviesada é muito danoso para o País.

Pela primeira vez a FSC, mais conhecida por ser uma certificadora de manejo florestal, participou de uma feira de alimentos naturais. Qual o propósito?
Aproximar produtores coletivos e comunitários do consumidor, sejam eles empresas ou o cliente final. Na Naturaltech levamos o açaí da Amazonbai (Cooperativa dos Produtores Agroextrativistas do Bailique e Beira Amazonas), no Amapá; e os óleos de breu e copaíba, produzidos pelos extrativistas da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) de Uatumã, no Amazonas. Na feira, conseguimos expor esses parceiros ao público comprador, fomentar negócios e levar informação sobre esse modelo produtivo para as pessoas. Nós continuamos com o trabalho de áreas certificadas, mas queremos promover a mudança cultural da demanda para que os produtos da biodiversidade sejam conhecidos e a floresta em pé seja valorizada por todos.

As empresas estão prontas para fazer negócios com esse produtor respeitando suas características para incluí-lo como fornecedor?
Incluir o empreendedor social na cadeia exigirá mudanças das empresas. Estamos em um momento de aprendizado para os dois lados. As organizações precisam entender que os negócios comunitários têm configurações específicas de produção, de tempo de resposta, de fluxo de caixa, quanto de organização social mesmo. E os empreendedores comunitários precisarão entender como fazer negócio com as marcas e com consumidores de outras culturas.

Ainda que não seja em alta escala, algumas varejistas já têm seus marketplaces sustentáveis. É moda ou visão de negócio?
A demanda de empresas querendo incluir produtos de origem responsável em seus portfólios está crescendo. Mas há tanta desinformação que a dificuldade passa por questões simples de por onde começar até como ajustar os processos internos para incluí-los com respeito. Essa mesma desinformação confunde o consumidor sobre o que é ou não verdadeiro, legítimo. Por isso, a FSC passou também a orientar as empresas que desejam incluir produtos de origem na floresta em frentes como construção de uma política de suprimentos e como as corporações podem fomentar essa escolha também ao longo da sua cadeia. Quando uma grande marca resolve promover mudanças dentro da sua área de influência, a gente vê o quanto isso reverbera de forma positiva e escalável.

E como você avalia o greenwashing nas certificações florestais?
Em certificações temos um mercado muito maduro e consolidado dentro da área de produtos derivados de florestas plantadas como papel, embalagens, fibras e compensados. Quando falamos de mercadorias com origem em florestas naturais, temos um grande desafio: não conseguimos precisar o que vem de áreas comprovadamente legais. Ou seja, não dá para saber se são produtos ilegais ou não. Como consumidores precisamos ter consciência disso para saber o quanto as nossas decisões impactam no manejo dessas florestas. Não estou defendendo que não se compre produtos da floresta, deve-se comparar sim, mas na medida do possível por produtos responsáveis.

Como o consumidor pode fazer isso?
Uma maneira é procurando por produtos certificados, rastreáveis. Claro que muitas vezes é impossível chegar exatamente na origem, até porque quando perguntamos para as empresas ou lojas, a resposta é lacônica, sem respaldo algum. Mas antes essa consciência, essa pressão do consumidor sequer existia. Pesquisar e buscar informações são os primeiros passos para a mudança.

Como está o envolvimento das autoridades públicas na economia da floresta?
Detectamos que algumas autoridades públicas que estão regulamentando, fiscalizando ou falando sobre a agenda não entendem o que é uma área certificada, não sabem o que é o FSC e nem o que uma certificação FSC significa. Para contribuir para que tenham mais informação na hora de criar leis ou de implementar ações, decidimos levá-los à floresta, mostrar o que é um manejo certificado, quais as ações e impactos das ações feitas ali.

Como a FSC enxerga os impactos do esvaziamento dos ministérios do Meio Ambiente, dos Povos Originários e a aprovação de medidas antiagenda ambiental pelo Congresso?
Precisamos entender exatamente o que o esvaziamento significará na prática. As políticas ambientais que precisam ser implementadas — exemplo do Cadastro Rural Ambiental (CAR) — deixarão de sê-las porque não estão mais na pasta do Meio Ambiente ou só é uma mudança de quem irá gerenciar o projeto? Não sabemos. Já o marco temporal tem um potencial de geração de conflito bastante significativo. Falando em FSC, o nosso alerta é para que empresas em áreas de risco se preparem pois podem se ver envolvidas em conflitos no campo ou no ambiente jurídico.

As demandas da bancada ruralista podem ser um tiro no pé do agro?
O setor florestal de forma geral está muito tranquilo com essa situação pela sua regularidade. Eles são constantemente auditados, suas áreas monitoradas. Mas é claro que o agronegócio tem muitas pendências com relação ao CAR. Ainda que eu possa parecer ingênua, minha esperança reside no fato de que independentemente do ministério responsável pelo controle e fiscalização, a lei seja cumprida.