Tecnologia

Contra desigualdades da IA

Empresa de tokenização Yaak Ventures quer conscientizar o ecossistema da inteligência artificial sobre discriminações enraizadas em bases de dados que servem de amostra para treinar algoritmos

Crédito: Marcos Samerson

Para Thiago Yaak, Hollywood é um bom exemplo dos desafios que vêm sendo enfrentados com o uso de IA (Crédito: Marcos Samerson)

Por Victória Ribeiro

Ele nasceu no Rio de Janeiro, mas se autodeclara nativo do metaverso. Com essa dupla cidadania, Thiago Yaak combina influências da cultura carioca e da tecnologia em sua startup, a Yaak Ventures, fundada em 2019. Criador de obras como Samba Crypto AI e Cryptorastas (que ganhou repercussão internacional ao ser divulgada pelo rapper Snoop Dogg), ele não se limita a produzir tokens não fungíveis (NFT, na sigla em inglês), misturando ferramentas de inteligência artificial, redes e blockchain para criar obras de arte e instalações únicas que quebram a barreira entre os mundos físico e virtual.

Mais que isso, ele tem buscado driblar os desafios éticos relacionados à autoria das produções, discussão cada vez mais presente no âmbito dos direitos autorais e um desfio para criadores em meio a conteúdos produzidos com base na cópia do que está publicado nas redes.

Para Yaak, as artes provenientes do uso de inteligência artificial têm uma vantagem. “Quando adquire uma obra digital, você pode ver, admirar, imprimir ou não, sem ter nenhuma desvantagem comum a um item físico, como logística ou deterioração”, afirmou.

Isso, contudo, não impede que a produção desse tipo de arte esbarre em desafios de outra natureza, inclusive ética.

Iniciada em maio deste ano e conduzida por atores e roteiristas, a atual greve de Hollywood é um exemplo do conflito que emerge das relações de trabalho em atividades criativas.

Além das reivindicações salariais, os profissionais comandam a primeira greve simultânea em 60 anos como forma de demonstrar descontentamento com o uso das novas tecnologias para retocar e produzir suas imagens sem autorização.

“Hollywood é um bom exemplo dos desafios que vêm sendo enfrentados com o uso de IA. Quando usamos dados de alguém para reproduzir sua imagem sem autorização, estamos falando de um rompimento com a ética.”
Thiago Yaak, da startup Yaak Ventures

E completa: “Tudo bem, eu tenho os dados aqui, mas preciso controlar quem, quando e como eles vão ser utilizados. A autorização é essencial para que a gente possa fazer um bom uso dessa tecnologia.”

Como a desigualdade surge na tecnologia

Além do uso de dados desautorizados, o CEO da Yaak Ventures entende que negligenciar a ética é uma forma de reproduzir e reforçar desigualdades. Isso porque a inteligência artificial é criada com base em uma seleção de dados agrupados em data sets e que funcionam para treinar algoritmos. Segundo Yaak, esses data sets podem conter vieses discriminatórios que partem de seus próprios desenvolvedores.

“Se você faz um sistema de reconhecimento facial para identificar criminosos e, por razões sociais, esse campo tem mais negros do que brancos, então você pode estar ensinando a inteligência que negros têm maior propensão a serem identificados dessa forma”, disse Yaak.

Segundo ele, para superar esse desafio, a adoção de novas tecnologias deve ser realizado de forma consciente, partindo de uma perspectiva de raça, gênero, sexualidade, classe e cultura.

Além disso, o CEO defende a criação de medidas técnicas e regulatórias que definam diretrizes éticas para o desenvolvimento das IA e a promoção da transparência, através do diálogo entre órgãos reguladores, pesquisadores, setor privado e civil.

“É necessário garantir que todas as empresas trabalhem com base em normas e diretrizes. Na prática, isso ainda é um pouco difícil porque nem sequer temos uma definição específica do conceito de IA. Temos muitas definições, mas nenhuma unanimidade”, disse Yaak. “Para assegurarmos a ética, ainda precisamos passar por pontos como definição, uso e trânsito entre dados e pessoas. Ainda há muito para caminhar.”

Obras reúnem mais de 10 mil imagens únicas

Inspirada pelo bailar de porta-bandeiras e mestres-salas, a coleção Samba Crypto AI traz o DNA brasileiro como marca da presença dos NFTs ao ultrapassar o mercado nacional.

Usando uma rede de inteligências artificiais para recriar a fluidez dos movimentos, a exuberância das fantasias e a matemática escondida por trás das expressões icônicas do carnaval, a coleção tem mais de 10 mil imagens únicas que variam de R$ 500 e R$ 50 mil reais.

Segundo dados do DappRadar, que levanta negociações em plataformas de blockchain, o volume global de vendas de NFTs gerou cerca de US$ 24,7 bilhões em 2022. O valor equivale a R$ 118 bilhões e quase igualou o pico de 2021, quando chegou na casa dos US$ 25 bilhões.

Na opinião do artista Thiago Yaak, a relação entre o metaverso e o mercado de capitais é indiscutível, mas ainda há muito caminho a ser percorrido para que o mercado brasileiro consiga de fato compreender os potenciais das produções com o uso das novas tecnologias.