Lula destrava acordo Mercosul e União Europeia
Lula e líderes europeus avançam no diálogo para a concretização do acordo ainda este ano, depois de duas décadas de negociações
Por Jaqueline Mendes
Após mais de 20 anos de negociações, o acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia está mais perto de se tornar realidade. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu com líderes europeus para concretizar o que ele chamou de “um acordo equilibrado”.
Lula afirmou que o Brasil vai cumprir com sua parte na questão do clima, o principal entrave para a assinatura do acordo até aqui, e que o governo brasileiro vai dar uma resposta às exigências do bloco europeu dentro das próximas três semanas.
O acordo deve ser ratificado ainda este ano.
“Queremos assegurar uma relação comercial justa, sustentável e inclusiva. A conclusão do acordo Mercosul-União Europeia é uma prioridade e deve estar baseada na confiança mútua, e não em ameaças”, disse Lula em Bruxelas, durante a reunião de cúpula entre a União Europeia e a Comissão dos Estados Latino-americanos e do Caribe (Celac).
O presidente vem criticando as exigências ambientais do acordo e as punições em caso de desmatamento. Para ele, não se pode ameaçar parceiros.
Por isso, na tentativa de colocar panos quentes nos pontos de divergências e desatar o nó do acordo, a presidente da Comissão Europeia (CE), Ursula von der Leyen, disse que é possível superar todos os entraves para que o tratado comercial seja assinado até o fim do ano.
Ela demostrou otimismo de que, como pretende Lula, a parceria se concretize nos próximos meses. Tanto que prevê benefícios para as duas regiões, com mais empregos e melhor qualidade de vida.
“Queremos trabalhar de mãos dadas com nossos parceiros da América Latina, e isso será possível se conseguirmos resolver as diferenças e concluir o acordo entre a UE e o Mercosul”, disse Ursula.
Preocupações
As diferenças citadas pela líder da UE não são pequenas. Apesar de o acordo ter sido aprovado em 2019, a conclusão depende da resolução de desentendimentos ambientais e redução do protecionismo europeu a setores sensíveis numa concorrência direta com o Brasil, como o agro.
Os franceses se preocupam principalmente com a indústria láctea, enquanto poloneses e outros países do leste europeu são tradicionais produtores de grãos. Mas o prolongamento da guerra na Ucrânia e o recente fim do acordo com Moscou para exportação de grãos produzidos na Ucrânia aumentam a preocupação dos países europeus com um eventual desabastecimento mundial ou disparada dos preços.
Por outro lado, a Alemanha, maior economia da Europa, tem interesse no mercado consumidor sul-americano para vender seus produtos industriais. Os alemães querem também ter acesso mais rápido e barato a minérios como lítio, níquel, grafeno e outros insumos usados em baterias, que a Europa demanda para sua transição energética e que o solo da América do Sul possui de sobra.
A Alemanha está focada no acordo com o Brasil para fazer frente ao forte avanço chinês no segmento de eletrificação de automóveis. Há ainda interesse na aproximação com as cadeias produtivas da nova matriz energética. É evidente que para a Alemanha há uma realidade, e para a França, há outra.
Hoje, as maiores exportações da UE para o bloco sul-americano são:
* máquinas,
* farmacêuticos e químicos,
* equipamentos de transporte.
O Mercosul vende para a UE principalmente:
* produtos minerais,
* grãos (café e soja),
* bebidas e tabaco.
Em bloco, a UE (com mais de 90 bilhões de euros em trocas) é o segundo maior parceiro comercial dos países que formam o Mercosul, atrás apenas da China.
O presidente francês, Emmanuel Macron, e o chanceler alemão, Olaf Scholz, negaram que a Europa esteja fazendo ameaças ao Brasil ou ao Mercosul, como disse Lula. Macron afirmou que a França tem uma posição firme a favor da abertura das economias, mas que as relações comerciais têm que ser coerentes com a agenda climática do bloco.
“Dissemos que deve haver cláusulas-espelho, ou seja, os regulamentos que impomos em termos de clima e biodiversidade para nossos agricultores devem ser respeitados.”
Já o alemão Scholz disse ser a favor que o acordo entre os dois blocos se dê ainda neste ano e afirmou querer finalizar a negociação logo.
“Pessoalmente, apoio muito e, pelo menos com quem pude falar, fiquei com a impressão de que eles também querem muito concluir isso rápido. Minha esperança é que, mesmo que ainda haja uma ou duas pedrinhas a serem removidas do caminho, a dinâmica torne isso possível”, afirmou o chanceler.