O colchão do governo

Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Carlos José Marques: "É disposição do governo e está no rol de atenções do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o ataque a alguns privilégios e vantagens monetárias angariadas pelos chamados super-ricos" (Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Por Carlos José Marques

Nesses dias de bonança econômica e de bons resultados nos índices e nas aprovações de projetos estratégicos para a gestão Lula (como o do Arcabouço Fiscal e da Reforma Tributária), o governo tenta acionar um arsenal de medidas que garantam alguma sobra de caixa para fazer frente ao tamanho das contas públicas. Preocupação bem-vinda, diga-se de passagem, após a esbórnia fiscal praticada pela gestão anterior que deixou um rombo gigantesco, na casa dos bilhões, difícil de fechar — via manipulações irresponsáveis em preços de combustíveis e concessões sem fim de emendas secretas. No leque de ações que estão sendo buscadas encontra-se o projeto de lei para taxar investimentos em paraísos fiscais e a mudança de tributação dos fundos exclusivos, focados na altíssima renda. É disposição do governo e está no rol de atenções do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o ataque a alguns privilégios e vantagens monetárias angariadas pelos chamados super-ricos. Desse naco de recursos é que o time de Lula almeja angariar parte da receita necessária para fazer frente aos compromissos. Muito embora a resistência, pelo lobby sempre eficiente da turma, ser grande no parlamento. O próprio presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, já avisou que qualquer medida na direção dos dividendos dos mais favorecidos da pirâmide social fica para o ano que vem, depois de votada toda a pauta de ajustes de impostos já em andamento. Enquanto o alvo maior não é atingido, a tropa de Haddad mira a tributação das apostas esportivas, outro naco extremamente rentável e que estava fora do raio de ação federal. Não mais. Deliberações de cobrança de pedágios nessas operações entraram no radar. Cálculos internos da Fazenda estimam que será necessário arrecadar ao menos R$ 120 bilhões extras para a meta oficial de zerar o déficit em 2024. As potenciais novas receitas precisam entrar a tempo na peça orçamentária para ter validade. Os técnicos correm para fechar os números. Atacar recursos da alta renda é um desafio e tanto que, historicamente, vem sendo evitado para não contrariar apoios estratégicos na hora de campanhas eleitorais. O financiamento privado ainda constitui uma fonte vital para muitos candidatos a postos públicos. O governo atua com cuidado nessa seara para não errar na dosagem, porém terá um trabalho hercúleo para costurar apoios no Congresso e sabe disso. O que está em jogo é incluir no plano de futuras arrecadações a extinção dos chamados juros sobre capital próprio (JCP), que hoje funcionam como uma remuneração aos sócios sobre investimentos na empresa e têm tratamento contábil mais vantajoso. A meta é pegar os fundos fechados, em geral constituído por uma única pessoa ou de relação familiar. Em outra frente, as reservas internacionais vêm crescendo e engordaram cerca de US$ 22,7 bilhões extras nos primeiros 200 dias de governo Lula, em parte graças a um empurrão do câmbio, mas também por conta da perspectiva de investidores de voltarem a ver o Brasil como um porto seguro. De uma forma ou de outra, o governo vem colocando em marcha um conjunto efetivo de propostas para manter sua palavra e metas de apresentar números no azul.