Artigo

É a má política, estúpido

É inócua a busca por explicações para a economia brasileira se não olharmos com atenção para o perfil de políticos que estamos colocando no Legislativo

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Paula Cristina: "Bolsonaro não apenas fez parte da má política por 23 anos, ele a ampliou ao dar voz, espaço e orçamento em sua passagem pelo Alvorada" (Crédito: Divulgação)

Por Paula Cristina

A capa da edição 1335 da DINHEIRO trouxe uma discussão sobre o turning point do Brasil no universo dos investimentos. Sob o título O Brasil na Rota dos Investidores, o texto, de autoria desta que vos escreve, desencadeou uma microexplosão nas redes sociais. De um lado os que diziam que Lula só conseguiu algo porque o antigo ministro da Economia, Paulo Guedes, arrumou a casa. Do outro, os que garantem que as coisas estariam melhores não fosse o governo Bolsonaro. Sobraram acusações sobre ditadores dos dois lados e faltou massa encefálica para o entendimento do Brasil real. Quem está certo? Ninguém. A verdade é que Lula e Bolsonaro estão intrinsecamente ligados no que pode ser definido como a má política.

Mas antes de explicar como as duas figuras mais populares da política brasileira podem figurar no mesmo lado da moeda, uma pausa semântica. Bom e mau são adjetivos que remetem à eficiência. Qualquer outro entendimento moral ou ideológico deve ser associado a bem e mal, e não é sobre isso que trataremos. Um bom ladrão é o que rouba dos ricos e dá aos pobres? Não. Um bom ladrão é o que rouba e nunca é pego. Um mau mecânico é o que cobra mais de mulheres? Não. Um mau mecânico é o que não consegue consertar um carro.

Com tais métricas postas, e focando na eficiência ao invés do certo e errado, seguimos. O filósofo francês Gilles Deleuze definiu no livro Mil Platôs: Capitalismo e Esquizofrenia a questão da seguinte forma: “Os problemas se apresentam sempre desse jeito. Boa ou má, a política e seus julgamentos são sempre molares, mas é o molecular, com suas apreciações, que a ‘faz’”. Isso significa que a ideia de que um político é capaz de moer ou de fazer voar uma economia ignora a estrutura molecular da política. Aquela que, pelo volume, se apodera de sua estrutura e transforma seus rumos.

Nessa linha de raciocínio, a má política é aquela que se prova ineficiente para resolver as questões do País. E sua estrutura destrutiva é dada onde há mais volume dela. Hoje a maior representação da má política é Arthur Lira. Presidente da Câmara e com um passado nebuloso que envolve ex-esposas, kits robóticas e assessores endinheirados, ele é mais uma proeminente cria da má política. Àquela fisiológica. Que recebe e distribui favores em beneficio pessoal. Que rasga a ideologia por vaga em comissão. Aquela que já existia antes da ditadura, que se reorganizou nos anos de chumbo e se constitucionalizou em 1988.

Verdade seja dita, nenhum Centrão na história do Brasil recente tem mais poder do que o liderado por Arthur Lira. (Por que choras, Eduardo Cunha?). Quando o termo Centrão foi cunhado, lá em 1987 e puxado por Sarney e a turma que queria segurar os rompantes progressistas na Assembleia Constituinte, ninguém imaginava que ele viraria o que é hoje.

Mas, no final das contas, se todo o problema está no Centrão, por qual razão Lula e Bolsonaro são representantes da má política? Porque ambos, em seus diferentes tempos, contribuíram para dar tração a ela. Bolsonaro institucionalizou a estupidez em todas as esferas do Poder e assim chegamos ao ministro da Saúde que não sabia o que era o SUS (e foi o segundo deputado federal mais votado no Rio de Janeiro). Membro do baixo claro do Centrão (apesar de negar durante parte do governo), Bolsonaro colocou tanta gente incapaz em cadeiras de decisão que não foi difícil vê-lo se tornar a Rainha da Inglaterra (RIP) enquanto Ciro Nogueira, então chefe da Casa Civil (e figura conhecida do tradicional centrão), orquestrava os caminhos do País com Lira. Não podemos esquecer: Bolsonaro não apenas fez parte da má política por 23 anos, ele a ampliou ao dar voz, espaço e orçamento em sua passagem pelo Alvorada.

Figurando no campo da democracia, e prezando por escolhas mais inteligentes para cargos de decisão, Lula ganha um ponto em relação a Bolsonaro, mas não sai totalmente ileso na dinâmica da política ineficiente. Foi em seus governos que a máquina pública ganhou uma proporção gigantesca e passou a abrigar amigos, aliados, companheiros, e, evidentemente, membros da má política. Mensalão, mensalinho, orçamento secreto. Na Câmara dos Deputados, dos vereadores, nas assembleias legislativas. Lula tornou possível que milhões de Bolsonaros pudessem fazer parte da micropolítica para criar uma onda que hoje trava o País e impede qualquer tipo de crescimento sustentável, de longo prazo e que nos dê um horizonte melhor do que ter que escolher entre um ou outro.

*Paula Cristina é editora de Economia da DINHEIRO