Bioinspiração
Por Luís Guedes
Desde o surgimento da vida, há aproximadamente 3,8 bilhões anos, um gigantesco ecossistema vem sendo engendrado pela Natureza. O mundo natural é uma fonte de inspiração incrível sobre como fazer o que é necessário, como utilizar racionalmente os recursos, como colaborar alinhando interesses e como conceber formas e estruturas estética e funcionalmente perfeitas.
A concepção científica mais aceita afirma que a flora e fauna vêm, de modo lento, mas constante, se adaptando às condições sempre mutantes do ambiente. A força-motriz da adaptação privilegia os resilientes e faz nosso mundo girar. Ocorre que os humanos giraram tão rápido, acelerados pela tecnologia do século 20, que escapamos dessa engrenagem e hoje nossos celulares, SUVs e copos de plástico nos põem em rota de colisão com a natureza. Aparentemente, trocamos o ECO pelo EGO…
O movimento de retorno é uma realidade, apesar de ainda pouco efetivo na grande ordem das coisas. A logística reversa e iniciativas ESG estão nessa linha — há muito o que fazer e as empresas engajadas com o seu tempo já estão fazendo. Tem crescido a disposição de pesquisar e adotar princípios inspirados na natureza como modelo — essa é a linha de pesquisa da Biomimética.
“A natureza evolui em favor do equilíbrio do ecossistema, nunca de uma espécie. Ao que parece, nós, humanos, consideramos o crescimento como um grande objetivo por si só — ter mais, tanto mais quanto possível”
A natureza é o mais próximo que temos da perfeição. Os organismos são mestres na resolução de problemas, aproveitando ao máximo os recursos e se adaptando, como espécie, a ambientes dinâmicos e muitas vezes desafiadores à sua própria existência. Embora pareça estar em constante equilíbrio, o mundo natural opera em um estado contínuo de perturbação e transformação. A biomimética busca nessa dinâmica autogerida a inspiração para solução de problemas corporativos, seja para desenvolver produtos e serviços, seja para resolver problemas do portão para dentro. Ao aprender com o design elaborado pela natureza, as empresas podem conceber novas ideias para produtos, processos e serviços surpreendentemente transformadores.
Motivo de atenção de CEOs de diversas latitudes, o modelo de negócios de uma organização pode ser entendido como a forma pela qual se ganha — ou pretende ganhar — dinheiro. Um modelo (antigo e comum) é o de maximização do lucro com base na relação custo-benefício entre as iniciativas e seus resultados de curto ou curtíssimo prazo. Se pudermos ganhar mais dinheiro do que empenhar na empreitada, nós iremos e o resto é poesia, não negócio. O “modelo de negócios” da natureza é baseado na relação custo-benefício de energia, ajustado para o nível da sobrevivência coletiva e não da acumulação pela espécie prevalente. Um leão não caça mais de um gnu porque está ‘à sua disposição’… A natureza evolui em favor do equilíbrio do ecossistema, nunca de uma espécie. Ao que parece, nós, humanos, consideramos o crescimento como um grande objetivo por si só— ter mais, tanto mais quanto possível, sempre pareceu o objetivo. Temos inspiração de sobra para desenvolver um novo sistema operacional, sustentável, resiliente, coletivamente vantajoso.
Faço o convite às corajosas leitoras, aos determinados leitores, a repensar com o olhar de sobrevivência coletiva a relação com fornecedores, colaboradores, governo e com a sociedade que todos servimos.
Luís Guedes é professor da FIA Business School