Como adoecemos nossas empresas
Por Jorge Sant’Anna
O relatório anual The Mental State of the World in 2022 (lançado em março de 2023) mostrou um quadro assustador para o Brasil. Elaborado pelo Mental Health Million Project, com dados de 500 mil pessoas de 64 países, é o maior banco de dados de perfis abrangentes de bem-estar mental do mundo.
O Brasil está no terceiro pior lugar, 11 pontos abaixo da média geral. O estudo revela que a população global ainda não se recuperou da queda no bem-estar psíquico da pandemia da Covid-19 e que quase um terço do mundo ainda enfrenta problemas de saúde mental.
Vivemos uma nova pandemia, ainda mais devastadora. A Organização Mundial da Saúde classificou o estresse como “a epidemia de saúde do século 21”. O esgotamento crônico é cada vez mais associado ao mundo corporativo.
Pesquisa global da consultoria McKinsey (fevereiro-abril de 2022), com 15 mil funcionários e 1 mil tomadores de decisão de RH em 15 países, indica que um em cada quatro funcionários teve sintomas de burnout. O burnout pode ter grande impacto na vida e bem estar com sintomas como exaustão, distanciamento mental, comprometimento cognitivo e emocional que podem levar à depressão e transtornos de ansiedade.
“Se o estresse corporativo é a epidemia de saúde do século 21, a liderança despreparada e arrogante é seu principal vetor viral. Temos que aprender a liderar a partir do futuro que emerge e não mais a partir de lições do passado”
O ser humano e outros amimais contam com mecanismos de enfrentamento de crises severas, como a reação de luta ou fuga, ou reação aguda ao estresse. “Lutar ou fugir” representa as escolhas de nossos ancestrais quando confrontados com perigo. A resposta fisiológica e psicológica ao estresse prepara o corpo para reagir ao perigo, com a liberação de hormônios como adrenalina e cortisol.
Se o estresse corporativo é a epidemia de saúde do século 21, a liderança despreparada e arrogante é seu principal vetor viral. Temos que aprender a liderar a partir do futuro que emerge e não mais a partir de lições do passado.
Pupilas dilatam, o fluxo sanguíneo diminui para as áreas superficiais do corpo e aumenta para os músculos, cérebro, pernas e braços, produzindo palidez ou vermelhidão no rosto; o batimento cardíaco e a frequência respiratória se elevam; os músculos ficam tensos e preparados para a ação, o que pode causar tremores.
O componente principal de reações como estas, fundamentais para a sobrevivência, é uma enxurrada de hormônios como o cortisol no organismo. Em quantidades adequadas, o cortisol é saudável, regula funções vitais. Mas estar em constante estado de luta ou fuga, com estressores repetidos, gera excesso de cortisol e complicações físicas e emocionais graves, como fadiga crônica, depressão, problemas gastrointestinais, dores de cabeça e enxaquecas, disfunções cardíacas, pressão e níveis de colesterol altos e distúrbios metabólicos.
Os agressores da vida corporativa são mais assustadores, repetitivos e ferozes do que os dos nossos ancestrais, com ambientes altamente competitivos, baixíssimo nível de segurança psicológica, requerimento de performance muito acima das competências pessoais e falta de colaboração e de alinhamento de propósitos.
Os executivos modernos se esquecem de que o principal papel do líder é inspirar, liderar pelo exemplo e gerar valor por tempo indefinido e, não, extrair resultados de curto prazo a qualquer preço.
Se o estresse corporativo é a epidemia de saúde do século 21, a liderança despreparada e arrogante é seu principal vetor viral. Como nos ensina Otto Scharmer, em O Essencial da Teoria U — Princípios e aplicações fundamentais, temos que aprender a liderar a partir do futuro que emerge e não mais a partir de lições do passado.
Jorge Sant’Anna diretor-presidente e cofundador da BMG Seguros E membro do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Bancos