Negócios

Direcional constrói recordes, na carona do MCMV

Após captar quase R$ 430 milhões, construtora prevê crescimento diante das novas regras do programa Minha Casa, Minha Vida e da redução gradual da Selic, que deve impactar positivamente nos financiamentos da classe média

Crédito:  Daniel Mansur Stúdio Pixel

A Direcional entregou 24 empreendimentos pelo Brasil no primeiro semestre. Banco de terrenos tem VGV de R$ 35 bilhões (Crédito: Daniel Mansur Stúdio Pixel )

Por Angelo Verotti

São 42 anos de atuação na construção civil brasileira. Mas, com certeza, 2023 ficará marcado na história da Direcional Engenharia. A construtora especializada no segmento econômico — de baixa renda ­­— celebrou resultados recordes em vendas e em lançamentos no segundo trimestre. O movimento foi coroado pelo follow-on realizado em julho, quando levantou R$ 429 milhões. Boa parte do dinheiro deverá ser utilizada como capital de giro nos negócios da companhia, que envolvem também a marca Riva, empresa voltada ao segmento de classe média. “Estamos bem otimistas com os resultados operacionais, lançamentos, vendas etc. Foi um semestre muito forte para nós”, afirmou à DINHEIRO Ricardo Ribeiro, CEO da Direcional.

O crescimento da operação fica evidente nos números. Entre abril e junho, por exemplo, a Direcional superou pela primeira vez na história a marca de R$ 1 bilhão em vendas brutas em um trimestre, alta de 15% sobre o período entre janeiro e março deste ano e de 13% em comparação ao segundo trimestre de 2022.

A companhia também comemorou os recordes de lançamentos, com VGV de R$ 1,5 bilhão, alta de 84% na comparação anual e de 138,3% em relação aos primeiros três meses de 2023, e de lucro líquido, de R$ 104 milhões, 365% superior à igual época do ano passado e de 78% em relação ao primeiro trimestre deste ano.

Os resultados, segundo o executivo, estão diretamente relacionados às novas regras do governo federal para o Minha Casa, Minha Vida (MCMV), além do desempenho “positivamente surpreendente” da Riva, apesar da maior restrição dos bancos na concessão de crédito, de extrema importância para o segmento.

Com a inflação “muito comportada” no momento, Ribeiro acredita na queda gradual da taxa Selic, iniciada em agosto (13,75% para 13,25% ao ano) e que deve impactar nos custos dos financiamentos.

As mudanças no MCMV que beneficiam a Direcional e outras construtoras do segmento incluem o incremento do teto dos imóveis enquadráveis no programa, ajuste na curva de subsídio e nas taxas de juros.

O preço máximo de venda dos imóveis que se enquadravam no programa (faixa 3), por exemplo, era de R$ 264 mil. Isso em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Em Manaus e nas capitais do Nordeste, era de R$ 219 mil. E, em Belo Horizonte, de R$ 236 mil. “Hoje é de R$ 350 mil no Brasil inteiro”, afirmou.

“Estávamos preparados para um ano muito duro e estamos com uma performance melhor do que imaginávamos.”
Ricardo Ribeiro, CEO da Direcional

Ricardo Ribeiro, CEO da Direcional (Crédito:Divulgação)

Como a Direcional tem operação mais diversificada do ponto de vista geográfico, com atuação em oito estados e no Distrito Federal, as perspectivas decorrentes dessa nova realidade de teto do programa só aumentam.

Sem contar outros benefícios vindos das novas regras, como a redução da taxa de juros para as faixas de renda mais baixas.

“Porque os produtos dependiam anteriormente de um crédito escasso e caro, o da poupança”, disse o CEO. “Agora, as pessoas conseguem financiar com recursos do Minha Casa, Minha Vida, o que quer dizer que as taxas de juros que hoje estão em média em 10,5 % ao ano serão de, no máximo, 8,16%, ou até menos.”

Performance Melhor

A empolgação com as novas regras e as perspectivas para o MCMV se estendem à Riva, categoria voltada à classe média. “Estávamos preparados para um ano muito duro e estamos tendo uma performance melhor do que imaginávamos”, disse o CEO.

O segmento computou R$ 380 milhões em Volume Geral de Vendas (VGV) no segundo trimestre, contra R$ 236 milhões na comparação anual.

No segmento em que a Riva atua, logo acima do teto do Minha Casa Minha Vida, de até R$ 600 mil, Ribeiro percebeu uma demanda muito resiliente, apesar do cenário mais desafiador do ponto de vista de custo do crédito e de disponibilidade, além de uma oferta muito baixa.

“O VGV chegou a R$ 614 milhões no semestre, alta de 50% em relação aos primeiros seis meses do ano passado, quando foram negociados R$ 407 milhões.”

A Riva também acabou beneficiada por decisão do Conselho Curador do FGTS, que em razão da demanda no MCMV autorizou um aumento no orçamento destinado ao programa superior a R$ 20 bilhões. E com o incremento nos tetos do MCMV um volume muito grande de imóveis da Riva passou a se enquadrar no programa federal.

Ribeiro acredita que, com o custo controlado, o preço de venda dos imóveis não precisará ser reajustado na mesma proporção apresentada no período da pandemia. “Com preços mais estáveis, é de se esperar também que a gente tenha um volume maior de famílias com condição de compra dos nossos imóveis”, disse.

Mercado

A companhia lançou 24 empreendimentos no primeiro semestre, 15 deles no segundo trimestre. Na visão do CEO, dois motivos justificam a disparidade: o primeiro trimestre, naturalmente, é sazonalmente mais fraco, por causa das férias e do Carnaval.

“E tentando tirar essa questão sazonal, a gente lançou no primeiro semestre um pouquinho mais de R$ 2 bilhões, que foi um crescimento de quase 50 % em relação ao primeiro semestre de 2022.”

Outro motivo, segundo ele, é que os lançamentos, em geral, se concentram a partir do segundo trimestre. “A perspectiva é de ter um segundo semestre bastante positivo, assim como foi no ano passado.”

Terrenos para a investida não devem faltar. A companhia dispõe de um landbank de R$ 35 bilhões pelo Brasil para receber empreendimentos da Direcional e da Riva.

“É um banco de terrenos que nos dá um conforto muito grande para, dependendo da demanda gerada pelas novas condições do programa Minha Casa, Minha Vida, ajustar o tamanho da nossa operação e dos nossos produtos.” Um diferencial competitivo estratégico.

Outro lado

A expectativa de crescimento demonstrada pelo CEO para o segundo semestre contrasta com uma preocupação revelada pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). Os lançamentos no segundo trimestre apresentaram redução de 15,8% na comparação anual — 64,3 mil contra 73,6 mil de 2022 —, movimento constatado também no acumulado do semestre, quando foram lançadas 119,9 mil unidades, 19,1% a menos frente ao mesmo intervalo. Para a entidade, os números acendem um alerta em relação à produção imobiliária.

Uma preocupação, porém, que pode ser apenas ajuste e positiva para reequilibrar o mercado. De acordo com o economista-chefe do Secovi São Paulo, Celso Petrucci, houve aumento discreto de 0,5% nas vendas de unidades residenciais entre abril e junho frente ao trimestre anterior.

Os números superaram os de lançamentos em mais de 10 mil unidades, demonstrando a aderência dos produtos disponíveis ao mercado comprador.

Com base nos dados de unidades lançadas e vendidas no acumulado dos últimos 12 meses, constatou-se que, desde o final de 2022, os lançamentos estão menores que as vendas. A diferença do acumulado supera 15 mil unidades. Assim, fica minimizada a redução de lançamentos.

Mas pode haver outro tipo de reflexo. A pesquisa mostra que é o menor patamar dos últimos dois anos, o que seria preocupante, de acordo com Petrucci. “A oferta está bastante reduzida em relação ao que o mercado tem de força para consumo”, disse.

No entanto, na visão dele, as medidas econômicas do governo federal aliadas à redução da Selic, com sinalização de novas quedas nos juros nos próximos meses, devem influenciar na confiança dos incorporadores para lançamentos de empreendimentos nos trimestres seguintes, o que pode mudar o quadro.