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PepsiCo: entenda como a marca cresce pela via agrícola

Com faturamento global de US$ 86,3 bilhões, companhia planeja dobrar de tamanho no Brasil nos próximos quatro anos com a força de sua divisão de alimentos e uma forte relação com o campo

Crédito: Claudio Gatti

Nos últimos quatro anos, a PepsiCo Brasil dobrou de tamanho. O objetivo do presidente Alexandre Carreteiro é repetir o resultado até 2027 (Crédito: Claudio Gatti)

Por Lara Sant’anna

“Somos uma empresa agrícola.” Essa é uma definição não convencional para o trabalho da gigante americana PepsiCo. Mas é isso que o presidente da operação brasileira, Alexandre Carreteiro, reitera diversas vezes ao longo da entrevista à DINHEIRO. Que base agrícola é essa? São 97 fazendas parceiras para fornecimento de insumos (considerando batata e coco), e 420 mil toneladas de matéria-prima agrícola compradas a um custo anual de US$ 250 milhões. Com 70 anos de atuação no Brasil, 90% do faturamento da PepsiCo no País vem dos alimentos, com destaque para os salgadinhos. Apenas 10% vem das bebidas — além do refrigerante, Gatorade, H2OH! e Lipton.

O ano do septuagenário da companhia no Brasil ficou registrado como o de maior investimento na história: R$ 1,2 bilhão para 2023, dinheiro que está sendo usado para a expansão da capacidade de fabricação, com novas linhas produtivas e maior tecnologia nas plantas, além de inovação e sustentabilidade.

O aporte garante o objetivo da empresa de dobrar a operação nacional em quatro anos, mantendo o ritmo do último quadriênio, quando teve uma ajudazinha da pandemia. Com mais tempo em casa, as pessoas aumentaram o consumo de salgadinhos, o que refletiu positivamente.

Com a volta à normalidade, os altos índices de consumo se mantêm, com a categoria de salt snack crescendo 20% ao ano na companhia. E no que depender da PepsiCo não vai parar por aí. “A gente quer liderar esse crescimento, ser um dos motores da PepsiCo global. O Brasil tem esse potencial”, disse Carreteiro.

Para fortalecer sua operação de snacks, PepsiCo possui um programa de agricultura que fomenta a plantação de batata no País (Crédito:Rogério Machado)

Ciente desse plano, fica mais fácil visualizar a empresa agrícola que ele descreve. As principais matérias-primas que a companhia compra são:
* milho,
* batata,
* coco.

O milho é adquirido como commodity em negociação com grandes produtores. Já o coco e a batata fazem parte do programa de agricultura desenvolvido pela empresa no Brasil há 26 anos.

O projeto estimula a produção desses alimentos ao ter contrato direto com os produtores e auxiliar com pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias agrícolas, além do uso mais consciente do solo.

Apenas de coco verde a empresa compra 120 mil toneladas por ano de 72 pequenos produtores de Pernambuco e da Bahia.

Além disso, aproximadamente 33% do que é utilizado na produção da água de coco Kero Coco vem de uma fazenda própria localizada em Petrolina (PE). São aproximadamente 650 hectares com 140 funcionários.

A PepsiCo Brasil tem mais de 20 marcas. Os alimentos, que incluem snacks, Quaker, Toddy e Kero Coco, representam 90% do faturamento

(Divulgação)

Já para a batata, que é a base para as marcas Lay’s, Ruffles e Stax Elma Chips, a PepsiCo tem parceria com 25 produtores em seis estados, que são responsáveis pela plantação e colheita de 125 mil toneladas por ano, o que equivale a 35% do volume total para chips cultivado no Brasil.

Diferentemente do tubérculo convencional comprado no mercado, os utilizados pela PepsiCo são exclusivos. As batatas são melhoradas genéticamente para oferecer mais resistência e adaptabilidade ao clima e ao solo do Brasil, o que garante maior produtividade da plantação.

Os insumos da PepsiCo também se diferenciam por terem características específicas no formato. Para manter o padrão de qualidade do corte na fábrica e dos pedaços que serão ingeridos pelo consumidor, eles são desenvolvidos para ter um tamanho mais padronizado, além de serem redondos. Também são mais duros e brancos.

PepsiCo possui uma fazenda de coco verde em Petrolina, responsável pela produção de 1/3 do coco utilizado pela empresa no Brasil (Crédito:Johnnis Alves)

Toda essa estrutura alimenta a PepsiCo para vender mais salgadinhos e conseguir crescer a operação como esperado. A Elma Chips figura nas primeiras posições de todas as categorias. O mesmo vale para a aveia Quaker e os produtos Toddy.

Até 2022, a PepsiCo também mantinha uma operação de biscoitos, com a marca Mabel, mas a vendeu, uma vez que a oportunidade de crescimento e a participação de mercado não eram satisfatórias para a empresa. “Estamos focando no que tem muito mais possibilidade de expansão. Em biscoito éramos número seis, com pouca possibilidade de ganhar. Então esse portfólio não fazia sentido”, disse Carreteiro.

(Johnnis Alves)

E as bebidas?, você pode estar se perguntando. Bom, no Brasil elas são produzidas e distribuídas pela Ambev, o que ocasiona outra estratégia comercial e, por isso, de menor participação nos resultados da empresa no País e na América Latina, onde o modelo é replicado. Além, claro, da menor participação de mercado, já que a concorrência da Cola-Cola é forte por aqui.

Regionalização

Para o crescimento, a regionalização é arma importante. A empresa divide o mapa do Brasil em quatro regiões e, para cada uma delas, desenha uma estratégia de desenvolvimento de produto e portfólio.

“A regionalização nos permite cruzar hábitos com sabores regionais e isso é superlegal.”
Alexandre Carreteiro, presidente da PepsiCo Brasil

Exemplo desse caso é o Cheetos bola, comercializado apenas no Nordeste, mas que por pedido dos consumidores passou a ser disponibilizado em todo o Brasil.

Para que essa regionalização funcione, entram os investimentos. A PepsiCo mantém um centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Sorocaba (SP) que atende, também:
* Argentina,
* Chile,
* Colômbia,
* Equador,
* Paraguai,
* e Uruguai.

Além disso, possui oito fábricas no Brasil. Isso garante que um novo produto possa ser produzido em seis meses, desde a ideia.

Cecília Dias, VP de marketing da PepsiCo Brasil, diz que eles observam as preferências dos consumidores por região do País e ocasiões de consumo. “Insights que posteriormente são levados ao time de P&D e se transformam em inovações”, afirmou Cecília.

Produtos que fazem sucesso na operação global também são nacionalizados, como foi o caso do recém-lançado Pop Corners, salgadinho de milho preparado com ar quente, e do Cheetos Crunchy, líder de vendas da marca no México e nos Estados Unidos e que deve chegar ao País em breve.

Nos esforços de marketing há, também, uma apropriação de pautas sociais pelas marcas.
* Doritos e seu apoio à comunidade LGBTQIAP+;
* eQlibri e ações pela equidade de gênero;
* Lay’s e a sustentabilidade do campo.

Outra frase muito repetida por Carreteiro foi “do campo ao pacote em 48 horas”. Que é a grande campanha da batatinha, que disputa uma narrativa de alimento fresco e simples. A PepsiCo promete que 90% de suas batatas são colhidas e embaladas nesse período de tempo.

Os 10% restantes são utilizados como estoque, caso aconteça algum imprevisto. Assim, a empresa mantém batatas prontas para serem enviadas para as fábricas, não prejudicando a produção.

Sustentabilidade

Já diria Drummond que havia uma pedra no caminho. Para a PepsiCo, essa pedra é também o motivo do seu crescimento. Já ficou claro que para a empresa crescer precisa aumentar a quantidade de produtos alimentícios que comercializa, o que significa ampliar o consumo de salgadinhos.

Mas em tempos de busca por alimentação mais balanceada e um consumo mais crítico dos ultraprocessados, ter uma operação baseada em snacks pode ser um problema.

A pesquisa Taste Tomorrow, desenvolvida pela Foodtech Puratos, aponta que 88% dos brasileiros buscam informações no rótulo dos produtos nas padarias e supermercados e 78% visam alimentos produzidos de forma sustentável. A pesquisa ouviu adultos entre 25 e 50 anos de classe média e alta.

Isso abre espaços de mercado. A Vitalin, indústria de alimentos sem glúten, também percebeu o aumento da preocupação por soluções mais saudáveis. Segundo Flávia Passos, gerente de negócios da empresa, os consumidores estão mais informados e têm uma decisão de compra mais consciente. “Esse é um grande desafio das indústrias, que o produto seja o menos processado possível.”

Levantamento realizado por pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), da Universidade de São Paulo (USP), da Fiocruz e da Universidad de Santiago de Chile, divulgado em 2022, estima que somente no Brasil o consumo de ultraprocessados esteve relacionado à morte prematura de 57 mil pessoas em 2019. Na classificação desse tipo de alimentos entram embutidos, congelados, refrigerantes, além de outros com alto teor de sódio, açúcar ou gordura saturada.

Compromisso

A PepsiCo firmou algumas metas públicas nesse sentido. Até 2025, a empresa espera ter no mínimo 67% do portfólio com 100 calorias ou menos provenientes de açúcares adicionados por 355 ml. No Brasil, até 2021 (último dado divulgado), 58% do volume de vendas de bebidas possuíam essa característica.

Também busca não exceder 1,3 mg de sódio por caloria em 75% do volume global de alimentos. A meta mundial é que até 2025 no mínimo 75% do portfólio de alimentos tenham no máximo 1,1g de gorduras saturadas por 100 calorias. Em 2021, 66% do volume de vendas do portfólio estava dentro dessa meta.

Para Carreteiro, esse “é um trabalho muito de longo prazo que a gente tem feito e continuará fazendo”, disse. “Essa pegada para nós é muito importante e a gente sempre acredita que uma alimentação equilibrada é o melhor.”

Outra parte da sustentabilidade da PepsiCo diz respeito a sua produção, desde as plantações. Na sua fazenda de coco, iniciou um projeto para realizar a plantação de cacau junto aos coqueiros, garantindo cooperação entre culturas e aumento de 60% na rentabilidade dos produtores.

Além disso, há um plano de melhoria no manejo de água. A fábrica de Itu (SP), após sofrer com falta de recursos hídricos municipais, hoje não consome água da fonte.

A fábrica recebe efluentes de outras unidades e com um sistema de tratamento próprio garante melhor controle e manejo hídrico em toda a produção.

E a ideia é levar esse modelo para as outras plantas. Assim, o presidente cumpre outro conceito repetido ao longo da conversa, o de crescimento sustentável.

ENTREVISTA
Alexandre Carreteiro, presidente PepsiCo Brasil

Alexandre Carreteiro: “A gente tem aqui potencial de expansão para dobrar novamente” (Crédito:Claudio Gatti)

No relatório global a companhia destaca a importância dos mercados emergentes, mas também pontua como eles possuem desafios de competição, preço, diferenças culturais e questões políticas. Como o Brasil se comporta nesse cenário?
Todos esses desafios estão aqui. Uma empresa que completa 70 anos no Brasil está para o longo prazo. Há poucos países com uma população acima de 200 milhões de habitantes com esse tamanho continental. Isso naturalmente coloca o Brasil em uma posição de destaque pelo tamanho do mercado e pelas oportunidades regionais. Então, para nós, o trabalho é realmente quantificar e capturar esse crescimento. Por isso a gente investe em inovação, em regionalização, no campo e trabalha essa cadeia de valor. Estamos fazendo o maior investimento nesses 70 anos agora, não porque são 70 anos, mas porque o potencial está aqui. A gente vê ainda uma possibilidade de crescer muito o consumo em todas as categorias que temos.

Como é o crescimento do Brasil comparado ao restante do mundo?
Ano passado, a América Latina cresceu 21%, o que foi acima do resto do mundo e nós crescemos um pouco acima da América Latina. A gente continua este ano numa pegada de crescimento duplo dígito. A gente quer liderar o crescimento, ser um dos motores da PepsiCo global. Com certeza a gente tem aqui potencial de expansão grande para dobrar novamente.

O relatório global também cita as novas regras de etiquetagem como um desafio no Brasil, considerando a percepção que as pessoas podem ter do produto. Como vocês têm trabalhado essa questão?
Nós trabalhamos com todos esses pontos de redução de açúcar e de sódio há muitos anos, por isso vemos com muito bons olhos quando há regulamentação como o Brasil está colocando. Nos últimos dez anos, a gente reduziu em 40% o sódio nos nossos alimentos. Somos uma das primeiras empresas a eliminar completamente a gordura trans. Quando você vê gordura saturada, a gente migrou o nosso óleo para um ingrediente à base de girassol, de canola. Quando você analisa essa evolução ao longo dos anos, a gente está muito bem posicionado globalmente e 85% dos nossos produtos não vão ter selo pelo trabalho contínuo realizado ao longo dos anos.

O varejo tem passado por uma transformação de formatos nos últimos anos. Como isso impacta vocês enquanto indústria?
A transformação do varejo é muito benéfica para a gente. A beleza do nosso modelo, de trabalhar tanto a cadeia de valor, é que temos uma grande fortaleza no pequeno varejo. Temos um modelo de negócio no qual chegamos a mais de 250 mil pontos de venda diretamente. Isso é uma grande fortaleza para gente, porque temos um conhecimento não só do cliente, mas do consumidor. Um feedback instantâneo. Conseguimos adequar o nosso portfólio a cada região, microrregião e rua. A gente vê, sim, onde tem crescimento em formatos menores, onde o consumo das famílias está mais desafiador. A beleza do nosso portfólio é essa, que a gente consegue capturar todo tipo de consumidor. Uma penetração em mais de 92% dos lares brasileiros. E conseguimos entender esse consumidor e o comprador em todo tipo de compra, em todos os momentos de consumo.