Quando os grandes vencem
Por Jorge Sant’Anna
O cientista político e economista austríaco Joseph Schumpeter foi um dos primeiros a considerar o efeito das ondas de inovação tecnológicas no desenvolvimento da economia e sociedade. Em Capitalismo, Socialismo e Democracia ele cunhou o termo “Destruição Criativa”, uma análise profunda de como novas tecnologias produzem grandes transformações econômicas e sociais. Novos modelos emergentes atraem mais fontes de capital e financiamento. Uma nova ordem de negócios e econômica se forma, praticamente destrói tudo que existia e origina uma mudança de paradigma e uma “nova economia” com “explosões de oportunidades”.
Foi assim, por exemplo, com a revolução industrial no século 18. A sociedade, economia e o formato dos agrupamentos humanos se transformaram em metrópoles, com o surgimento da indústria mecanizada, máquinas a vapor e ferrovias.
Vivemos hoje uma transformação estilo Schumpeter. Novas tecnologias e desafiantes estão desestruturando o “velho” e criando uma nova ordem, mas num processo não tão previsível em que nem sempre os incumbentes desaparecem e dão espaço para startups e Unicórnios.
O fluxo de capital para os “desafiantes” é incerto e grandes ideias morrem prematuramente, como ocorreu no Brasil e no mundo desde 2021. Segundo a plataforma Distrito, no primeiro semestre de 2023 as startups brasileiras captaram US$778,1 milhões, 51,4% menos que no semestre anterior, demonstrando que o cenário global e local ainda impacta o apetite para investimentos de risco.
“Vivemos hoje uma transformação estilo Schumpeter. Os desafiantes estão desestruturando o velho e criando uma nova ordem, mas num processo não tão previsível em que nem sempre os incumbentes desaparecem e dão espaço para startups”
Houve descontinuidades nos planos de crescimento e sobrevivência de startups. Desde 2022 há muitas demissões, projetos importantes foram cancelados ou há recuperação judicial. Por outro lado, há segmentos em que muitos incumbentes se movem silenciosamente em alta velocidade.
O livro A Vingança de Golias, de Todd Hewlin e Scott Snyder, traz exemplos de como grandes empresas se movimentam e protagonizam o ecossistema de inovação. Um exemplo é o da General Motors, que, com a crise de crédito internacional de 2008, entrou em recuperação judicial. Após um bem-sucedido turnaround, a companhia se tornou um dos principais construtores do futuro da indústria automotiva no mundo. Com uma gestão inovadora e consistente, via desenvolvimento próprio ou aquisições, mergulhou nos mercados de veículos elétricos, autônomos e transporte compartilhado. Cada dólar investido valeu a pena: desde 2016 o valor de mercado da GM cresceu cerca de 50%, para US$ 46 bilhões. E especialistas acreditam que a concorrente Tesla perderá participação significativa no mercado de EV para a GM até 2026.
Aparentemente os incumbentes têm enormes vantagens competitivas, mas, por vício, modelo mental e ou incapacidade de gestão não conseguem alavancá-las e integrá-las como fez a GM com sua capacidade de auto investir em inovação, alcance e reconhecimento de marca, relacionamento extenso com clientes, base instalada, base de dados histórica, patentes concedidas e proteções regulatórias, o que permitiu à GM sair da posição de defesa para a vanguarda da inovação.
Volatilidades dos desafiantes e o excelente aproveitamento das vantagens competitivas dos incumbentes podem alterar a profecia da “Destruição Criativa”. É fabuloso assistir este jogo de transformação ao vivo, como fazemos hoje.
Jorge Sant’Anna é diretor-presidente e cofundador da BMG Seguros e membro do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Bancos