ESG

O adeus de Bruno Assami à Unibes: um legado cultural e filantrópico

Após mais de 40 anos de atuação como gestor na área cultural, Bruno Assami anuncia seu desligamento da Unibes Cultural, que ajudou a criar em 2015, e deixa sua visão singular sobre o que é preciso para que as empresas criem um valor simbólico para a sociedade

Crédito: Juan Esteves

Bruno Assami, que em 2015 ajudou a criar a Unibes Cultural. (Crédito: Juan Esteves)

Por Celso Masson

Em dezembro, quando se mudar do Brasil para o Sudeste Asiático, onde pretende viver pelos próximos três anos com o marido suíço, Bruno Assami encerrará um ciclo de quatro décadas como gestor de alguns dos mais importantes equipamentos voltados à promoção e divulgação da cultura na capital paulista. Depois de passagens pelo Itaú Cultural, Instituto Tomie Ohtake e Museu de Arte de São Paulo, ele está há oito anos à frente da Unibes Cultural. Fundada em 2015 como um desdobramento da centenária União Brasileiro-Israelita do Bem-Estar Social, a entidade surgiu com a proposta de pensar a cultura como vetor de desenvolvimento humano, inclusão e geração de renda, de modo complementar às atividades de educação, saúde e assistência a populações vulneráveis exercidas pela instituição criada e mantida pela comunidade judaica em São Paulo.

Anualmente, a Unibes realiza mais de 15 mil atendimentos com o propósito de ajudar as pessoas a transformarem suas histórias de vida. E foi a partir dessa experiência de filantropia que decidiu criar um hub de cultura e empreendedorismo criativo.

Como diretor-executivo da instituição desde antes de ela ser formalmente constituída (quando ainda era Centro de Cultura Judaica), Assami ajudou a formatar não apenas o modelo de gestão do equipamento como também definiu as bases de sua inserção na vida da metrópole.

“Eu gosto de pensar que nós pudemos trazer uma nova agenda temática para dentro de uma instituição cultural. Se há um legado propositivo é o de arregimentar novos atores da sociedade que estavam fora das demais organizações”, afirmou ele.“Uma das características que nos diferencia é a pluralidade temática. Atuamos em 28 eixos temáticos, incluindo os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável definidos pela ONU”.

A Unibes se diferenciou ao dar voz a agentes que permaneciam fora da maior parte das instituições ligadas à cultura (Crédito:Andre Hoff)

Ele cita como exemplo o fato de ter mapeado a produção artística de refugiados e dar maior visibilidade a esse universo criativo. “Ainda que não tenhamos a pretensão de transfomar a vida cultural da cidade, temos o papel de germinar novas conexões entre os agentes e o público. Na Unibes, o elegebetismo está sendo falado pela comunidade LGBT, assim como o conhecimento de povos originários é trazido pelos indígenas”.

Pode parecer um detalhe, mas dar voz e protagonismo a esses atores faz diferença. Tanto que a Unibes se tornou referência em temas que permanecem ausentes de outros institutos culturais. Um exemplo foi a exposição imersiva Diálogo do Escuro, projeto criado pela Dialogue Social EnterpriseTM, da Alemanha, que passou por mais de 40 países antes de ser montada na Unibes.

Embora o cargo de diretor-executivo que ocupa desde 2015 tome a maior parte de seu tempo, Assami acumula outras funções. Coordena a Arena Cultura, projeto em fase de implementação pelo Hospital de Amor, em Barretos (SP), para se tornar o primeiro polo difusor sobre a prevenção do câncer. E é conselheiro cultural do Consulado de Portugal em São Paulo.

Esse trânsito por diferentes organizações e estruturas permitiu ao gestor desenvolver uma visão privilegiada sobre o papel da filantropia, seja praticada por empresas ou por pessoas físicas. “Quando eu sou convidado para desenhar uma nova organização baseada na atuação filantrópica, ou que expresse o valor simbólico de uma empresa na sociedade, a primeira coisa que eu digo é que ela precisa enxergar seu papel no desenvolvimento social — e ele está diretamente ligado ao capital humano que ela emprega”.

Ou seja, independentemente da causa que a companhia queira encampar, ela terá de ser coerente com a história construída internamente ao longo do tempo. “Sem isso não há verdade na construção dessa narrativa — e a sociedade acabará cobrando”.