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Os planos da VR para multiplicar negócios e benefícios

Companhia investe 12% do faturamento em tecnologia, compra startups, oferta mais e melhores serviços com foco na Classe C e nas pequenas e médias empresas para gerar maior impacto social

Crédito:  João Castellano

Claudio Szajman, presidente da VR: "Hoje vemos uma oportunidade de aproveitar essa gênese e posicionar a VR como uma companhia social” (Crédito: João Castellano)

Por Beto Silva

Claudio Szajman está à frente de negócios da família há 35 anos, em ciclos diferentes da economia e das empresas. Desde 2010 mora nos Estados Unidos, mas sempre com as rédeas do que ocorre no Brasil nas mãos. Do mercado americano ele extrai uma visão das grandes tendências do mundo ocidental. Principalmente dos movimentos do setor de tecnologia e serviços, como as chamadas big techs (Amazon, Apple, Google e Microsoft), em que a inovação é o carro-chefe. Também olha o que está acontecendo em venture capital e growth capital, o mundo privado de investimentos. Foi assim que teve oportunidade de aportar em companhias como a Space X, do excêntrico bilionário e empresário em série Elon Musk.

Claudio Szajman ainda ganhou ao longo dos anos experiência ímpar sobre o fluxo de desenvolvimento de negócios tradicionais, a partir da análise do comportamento de companhias de capital aberto. Na prática, apurou uma visão pluralizada, com perspectivas diferenciadas dos negócios globais e do próprio Brasil. Uniu seu background de operador do dia a dia à exposição de um mercado mais de investidor. Virou um empresário híbrido, como gosta de se definir. “Vejo uma beleza enorme nessa adição de perspectivas”, disse à DINHEIRO no final de agosto, quando esteve por algumas semanas no Brasil.

O executivo preside a VR, gigante de benefícios corporativos com atuação nacional, e a VR Investimentos, gestão de ativos locais e internacionais. Toca tudo dos Estados Unidos. Só vem para cá “quando necessita”.

Desta vez a necessidade bateu em sua porta para alinhar os rumos da VR, que está em fase de expansão, com aquisição de startups e abertura de novas verticais de negócios digitais.

São dois principais objetivos.
1) Um deles é ganhar mercado e continuar o crescimento da companhia, que em 2022 registrou faturamento de R$ 11 bilhões, 30% superior ao ano anterior. Em número de trabalhadores atendidos com os benefícios, saltou de 3 milhões em 2021 para 4,7 milhões agora (expressivo aumento de 56,7%). São 1,3 mil colaboradores e 85 mil empresas clientes, entre elas gigantes do porte de Correios, Petrobras, Sem Parar e Sicredi. Porém, o foco neste momento tem sido as pequenas e médias, mas aprofundaremos nesse assunto mais à frente. Nos últimos 12 meses foram realizadas 144 milhões de transações pela companhia.

2) O outro objetivo é gerar maior impacto social, fator que está no DNA da VR, criada em 1977 praticamente junto do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). “Hoje vemos uma oportunidade de aproveitar essa gênese e posicionar a VR como um ecossistema, de múltiplas formas de atuação, como uma companhia social”, afirmou Szajman. “É o alinhamento entre uma empresa que vai dar lucro, mas tem um compromisso com social”, disse, ao ressaltar a contratação da Nint, uma das maiores consultorias ESG do mercado, para avançar em seu impacto social com objetivos claros, definidos, resultados e metas mensuráveis até 2027. Projetos com a Central Única das Favelas (Cufa), por exemplo, estão no pipeline da VR. As iniciativas com a entidade já atenderam mais de 40 mil famílias.

Trabalhadores da empresa de pagamentos por tags Sem Parar possuem benefícios da VR, que passa a focar esforços na atração de pequenas e médias (Crédito:Divulgação)

Para atingir os dois objetivos — rentabilidade e social — é fundamental um fator que está no cerne da companhia: a tecnologia.

A VR nasceu com nome de seu principal produto, o vale-refeição. Por muitos anos permaneceu com esse monoproduto. Mudou a marca, abreviada para VR, e ampliou serviços, sempre com inovação embarcada.

Foi a primeira empresa do setor a avançar em pontos importantes:
* deixar o voucher de papel e lançar o cartão com chip;
* ter a própria maquininha;
* fazer pedidos pela internet;
* e oferecer crédito consignado também de forma on-line, antes mesmo do governo.

Petrobras está entre as grandes corporações que têm contrato com a VR. No total, 85 mil empresas utilizam os benefícios da companhia (Crédito:Divulgação)

Essa evolução aconteceu até 2007, quando vendeu sua operação de emissor de benefícios para a Sodexo. Ao mesmo tempo, continuou a prestar serviço para a própria compradora, em contrato de até seis anos para usarem a processadora da VR, a plataforma a Smart.Net.

O acordo se estendeu até 2013. A partir de então, a família Szajman teve a liberdade para seguir sua caminhada. A decisão foi de, no ano seguinte, entrar novamente no mercado de benefícios corporativos, já que a marca VR e a processadora nunca foram vendidas.

A operação foi recomeçada do zero. Faturamento zero. Zero clientes. Quando houve a negociação com a Sodexo, a base era de 2 milhões de beneficiários. Dez anos após a reentrada no setor, são 4,7 milhões.

O atual momento da VR é de parcerias estratégicas e forte investimento em tecnologia. A relação com a Caixa Econômica Federal, iniciada em 2017, foi ampliada para formar uma joint venture com o banco e a Fleetcor. O acordo prevê a oferta de cartões pré-pagos com a marca VR exclusivamente no balcão Caixa. “É bastante relevante para distribuição, pois temos a capacidade de operar com o maior balcão bancário da América Latina em termos de varejo”, afirmou.

Nova fase

Passo a passo a companhia tem deixado de estar associada a um cartão e produtos para atuar na arena de soluções que atendam as necessidades dos empregados e resolvam as dores do setor de RH das empresas.

A ambição é ser a carteira digital do trabalhador brasileiro. Para isso, investe 12% do faturamento em TI. Tem como parceiras algumas corporações referências no mercado tecnológico, como Docusign, Salesforce e Sensedia.

Um processo contínuo que proporcionou à empresa ter um corpo tecnológico robusto, discorre Renato Teixeira, diretor-executivo de Plataformas da VR. “A gente autoriza em 60 milissegundos cada transação.”

A expansão dos serviços da companhia também está ancorada em M&A. Desde 2021 foram três aquisições de startups, com investimento total de R$ 300 milhões.

* A Audaz (atual VR Mobilidade) é especializada em soluções de mobilidade. Automatiza o processo de compra de vale-transporte e incentiva o uso de transportes alternativos pelos trabalhadores. A plataforma faz a roteirização inteligente do trajeto feito pelo colaborador, para diminuir os custos das empresas e reduzir o tempo que o empregado passa no trânsito. Tudo integrado à folha de pagamento e às operadoras de ônibus. São 3 milhões de cartões processados em 2022 e integração com 1.350 operadoras.

* Já a Pontomais (atual VR Gente) otimiza a rotina de trabalho do RH. É líder na área de controle de ponto on-line, com 20 mil clientes espalhados pelo País. Inclui processos automatizados de admissão, férias e folgas, escalas de trabalho e outras funcionalidades 100% digitais, inclusive com batida de ponto via WhatsApp.

* E a Global Points (atual VR Shopping), de soluções como cashback, programas de fidelidade e marketplace.

Admissão

No campo do lançamento de produtos, a companhia de benefícios lançou no primeiro semestre deste ano o VR Admissão, um sistema dedicado às empresas que querem otimizar o processo de contratação de funcionários e concluí-lo em até 15 minutos.

Gratuito, permite ao RH:
* receber os documentos de forma digital,
* realizar contratação on-line,
* elaborar processos customizáveis de seleção,
* reduzir o tempo do fluxo admissional.

Segundo Szajman, é a entrada da empresa no setor de gestão de capital humano.

“A primeira coisa que uma companhia faz em relação aos seus trabalhadores é uma admissão. Existe no Brasil uma certa complexidade operacional burocrática nesse segmento.”
Claudio Szajman

Ações sociais, como os projetos realizados com a Cufa, estão no pipeline da VR para avançar em seu impacto social (Crédito:Divulgação)

Todas essas funcionalidades e serviços estão empacotados pela VR em um modelo SaaS (Software como Serviço) em três grandes plataformas:

* a Loja VR, com todos os produtos na prateleira, criando uma jornada digital;
* o Super App para o trabalhador;
* e o Super Portal para o empregador.

Para Adalberto Alonso, CRO da Biti9, que arquiteta e implementa ferramentas de automação, inclusive em soluções de benefícios, a VR emerge como uma referência com esses serviços. “Demonstra uma visão coerente ao incorporar a automação em seus processos e oferecer soluções mais ágeis e eficientes aos seus clientes”, disse.

“Vemos empresas como a VR não apenas como líderes de mercado, mas como visionárias que estão moldando o futuro do setor.”
Adalberto Alonso, CRO da Biti9

Com as soluções, a empresa mantém sua atenção ao público da Classe C, que forma 70% de sua base, e democratiza o acesso à tecnologia para as PMEs.

Lembra que voltaríamos ao tema das pequenas e médias? Voltamos! O Super Portal concentra os principais serviços para o RH. Nele é possível pagar pedidos com Pix, serviço pioneiro no mercado. E escolher o combo que precisa, desde ponto eletrônico, vale-alimentação, vale-refeição, VR Admissão e outros.

Vários diferenciais, segundo o presidente da VR. “A empresa menor não precisa comprar a tecnologia, não precisa comprar software, não precisa comprar hardware. Entregamos a solução pronta, com menos custos e, às vezes, até de graça.”

Na avaliação de Cláudia Danienne, psicóloga organizacional e especialista em Gente & Gestão, a VR trilha “um ótimo caminho” com seu hub de soluções. “Se seguir com esse mindset, criará uma grande vantagem competitiva, pois estará cada vez mais preparada para oferecer o incremental ao mercado, se distanciando dos competidores.”

Desafios

A VR tem pela frente ao menos dois desafios.
* O primeiro é ganhar espaço em um mercado dominado há décadas por poucas empresas. Além dele, Sodexo, Alelo e Ticket detêm 90% do setor. Porém, muitas startups com serviços especializados e segmentados estão surgindo. Ou têm ganhado corpo ou têm sido compradas pelas gigantes.
* O segundo é se adaptar ao decreto publicado pelo governo federal no último dia de agosto que estabelece mudanças no sistema do PAT. Entre as principais alterações está a portabilidade entre operadoras de benefícios, em que o trabalhador pode escolher com qual vai atuar, independentemente da opção feita pela empresa em que ele é contratado.

Em nota, a Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT) afirma que a medida, carente de detalhes e prazos, é positiva no contexto geral, mas pode ter efeitos negativos para a concorrência e para o trabalhador. “É preciso a definição de um prazo razoável e claro para a adoção do mecanismo, o que não ocorreu no decreto. Falta a devida regulamentação.”

Nada que a VR, em seus 46 anos de história, não tire de letra e continue na jornada de empresas e trabalhadores. Para que o slogan “VR facilita a vida” seja de fato colocado em prática.

Parceria com a CEF, iniciada em 2017, foi ampliada com a criação de uma joint venture para ofertar cartões pré-pagos com a bandeira VR (Crédito:Thiago Calil)

ENTREVISTA
Claudio Szajman,presidente da VR

“Não temos de satisfazer as casas de aposta de mercado”

Com várias verticais de negócios surgindo na companhia, o cartão de benefício vai deixar de ser protagonista como um produto?
O protagonista é o trabalhador. O produto vai se adaptar às necessidades do trabalhador e nós temos de ter a capacidade de ter um menu de serviços muito amplo e adaptável frente à necessidade dele. O trabalhador é que oferece para gente uma série de oportunidades a partir das características do cotidiano.

Como encara as incertezas da economia?
Existem coisas que nós não controlamos e temos que nos adaptar frente a essas condições. É difícil fazer projeções muito longas. Hoje em dia, três a cinco anos é um período muito longo para fazer projeções financeiras, mas não é muito longo para o propósito. Porque o desafio do propósito é grande, com compromissos de desenvolvimento sustentável. E o compromisso que eu tenho de entregar para os acionistas é o conjunto da obra. Não temos que satisfazer as casas de aposta de mercado.

Mas tem de acompanhar os indicadores econômicos. Eles afetam a VR?
Afetam a todos nós. Temos uma economia com juros muito alto, o segundo maior juro real do planeta. Uma companhia de pequeno ou médio porte começa a sentir dificuldades financeiras, perde o acesso ao sistema financeiro tradicional e começa a agir como historicamente a gente viu agindo no Brasil: por sobrevivência. Isso afeta todos nós, porque vai ter menos empresas, menos trabalhadores formais.

Mas há expectativa de baixar os juros e consequentemente melhorar o setor?
Sim e sim. O ponto é que não se pode esperar isso tudo acontecer para se mobilizar frente ao ambiente que é extremamente complexo. Essas condições (de juros e inflação) eu considero informativas, mas elas não vão nos tirar do eixo. Elas são fórmulas de a gente navegar conforme o vento.