Até onde vai a corrida pelo dólar? Analistas comentam
Busca pela moeda americana deve continuar em alta enquanto permanecer o ambiente de juros altos e fortalecimento da economia americana
Por Jaqueline Mendes
A combinação entre alta dos juros americanos, reaquecimento da maior economia do mundo (que cresceu 2,4% no segundo trimestre) e incertezas no mercado global tem promovido uma corrida por investimentos em dólares desde o ano passado. E não é um movimento pontual, segundo relatório do banco britânico HSBC. A instituição avalia que a moeda continuará a se fortalecer no próximo ano diante de perspectivas piores para a economia global. Em razão da guerra na Ucrânia e sinais de crise no setor imobiliário chinês, a divisa americana tem se tornado um porto seguro para investidores avessos a riscos. “A demanda por ativos ligados à economia dos Estados Unidos devem seguir em alta”, escreveram estrategistas do banco, em relatório.
No mês passado, todas as principais moedas registraram perdas de valor frente ao dólar. O yuan e a rupia indiana se aproximaram de mínimas históricas, enquanto o real teve desvalorização de 4,6%.
“Mesmo se as perspectivas globais se tornarem ainda mais sombrias, os EUA parecerão relativamente mais atrativos e o dólar poderá resistir a qualquer ciclo de flexibilização do Federal Reserve”, afirmou o HSBC. “Com uma perspectiva mais difícil para a Europa, China e outras economias, o mercado poderá ver cada vez mais riscos negativos para o crescimento global e se voltar ainda mais para o dólar”, escreveu o banco.
O Bloomberg Dollar Spot Index, que acompanha a divisa americana frente às principais moedas, registrou desde julho oito semanas consecutivas de ganhos, a sequência mais longa desde 2005.
Por isso, o HSBC prevê que o euro cairá para perto da paridade, a US$ 1,03, no primeiro trimestre de 2024, contra a estimativa anterior de US$ 1,15. A moeda japonesa, o iene, deverá se enfraquecer para 148 por dólar no mesmo intervalo, o que representa uma mudança acentuada em relação à previsão anterior de 132.
4,6%
Foi a perda de valor do real frente ao dólar no último mês. Valorização da moeda americana deve seguir alguns meses
Tendência
A corrida global pelo dólar é um fenômeno conhecido no dicionário econômico como fly to quality, segundo Cristiane Quartaroli, economista do Banco Ourinvest, mas ela considera cedo para cravar que essa busca vai continuar em 2024.
“O dólar costuma ser um ativo de refúgio de investidores e nesses últimos meses temos visto fuga de capital de emergentes, mas há a perspectiva de mais entrada de dólares no Brasil e se a economia continuar melhorando, a inflação continuar caindo, a gente tem um pano de fundo positivo para o Brasil na atração de dólares”, disse. “Nossa taxa de juros está bastante atrativa, apesar do cenário adverso no campo fiscal.”
Na avaliação do economista Rodrigo Correa, estrategista da Nomos, a busca vai continuar, especialmente por investidores de países emergentes como o Brasil. “O Brasil, como periferia do planeta, tem cada veze mais buscado a internacionalização dos ativos”, disse.
Já Cassio Spina, fundador e presidente da Anjos do Brasil, organização sem fins lucrativos de fomento ao investimento-anjo, avalia que a facilidade de investir em moeda americana tem ajudado a busca pela dolarização. “Antigamente, era mais complicado e trabalhoso. Hoje ficou muito simplificado.”
Anthonio Araujo Junior, CEO do Grupo Smart Business e da ABM Advocacia, afirma que o dólar americano tem sido cada vez mais procurado como refúgio para investimentos porque em um mundo cada vez mais polarizado, conflitos e tensões regionais têm levado investidores a buscar segurança no dólar. “A tendência de busca pelo dólar como refúgio deve se manter nos próximos anos.”
“O Brasil, como periferia do planeta, tem cada veze mais buscado a internacionalização dos ativos”
Rodrigo Correa, estrategista da Nomos
Na prática, isso significa, mais do que a tendência de investimento, um alerta macroeconômico: as incertezas e volatilidades do cenário econômico global permanecerão presentes. Tudo isso enquanto os preços sobem em todo canto do globo, os Bancos Centrais divergem sobre como agir, e o comércio global, feito em dólar, tende a crescer.