Vulnerabilidade x fraqueza: a síndrome do predador

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Jorge Sant’Anna: "A imagem do líder carrancudo, sério, pouco acessível, que causa medo, hoje projeta a percepção de fraqueza, de incapacidade de engajar emocionalmente seus interlocutores" (Crédito: Divulgação)

Por Jorge Sant’Anna

Os felinos, particularmente nossos gatos, entre outros animais, têm uma história de sobrevivência antes de serem domesticados. Na natureza, para sobreviver, desenvolveram o instinto de esconder suas dores, pois uma doença ou lesão os transformariam em alvo fácil para os predadores e rivais por estarem mais vulneráveis, podendo ser hostilizados ou abandonados por seu grupo. Esconder a expressão facial da dor podia ser a diferença entre a vida e a morte.

Esse instinto também está presente no Homo sapiens, e é muito eloquente no mundo corporativo. O estereótipo do líder heroico, “macho alfa”, por muito tempo dominou a mentalidade empresarial e foi incentivado por escolas de negócios de todo mundo.

Criar um afastamento emocional entre o líder e seu time era uma competência essencial, especialmente para os CEOs. Demonstrar vulnerabilidade e conexão emocional era visto como fraqueza, que o expunha a ameaças e punha em risco sua sobrevivência corporativa.

No entanto, recentemente, a vulnerabilidade genuína tem se tornado uma de suas competências mais importantes. O influxo da geração Z e Millenium no mercado de trabalho acelera essa tendência. Hoje, os jovens têm maior predisposição à abertura emocional e buscam segurança psicológica, criando um novo ambiente de trabalho.

Brené Brown, professora e pesquisadora da Universidade de Houston e autora de “A coragem de ser imperfeito”, enfatiza que vulnerabilidade não é fraqueza, mas nossa medida mais precisa de coragem e que os líderes que se mostram vulneráveis e assumem riscos têm maior probabilidade de construir relações de confiança, encorajar a inovação, criatividade e crescimento.

Inovação e alta performance são produtos da colaboração e inclusão de todos os colaboradores, independentemente de seu nível e função. Criar um ambiente de segurança psicológica depende da capacidade do líder de promover empatia e confiança.

É preciso muita coragem para os líderes demonstrarem vulnerabilidades. Segundo Brené, “vulnerabilidade é incerteza, risco de exposição emocional”. Vulnerabilidade não é fraqueza. Em todos os momentos da vida, de alguma forma, nos sentimos vulneráveis. E é a coragem que nos permite lidar com tais situações de modo satisfatório.

“O líder vulnerável não precisa ter todas as respostas, mas fazer as perguntas certas. Ao ser vulnerável e humilde, ele projeta uma imagem de força legítima e sustentável”

A imagem do líder carrancudo, sério, pouco acessível, que causa medo, hoje projeta a percepção de fraqueza, de incapacidade de engajar emocionalmente seus interlocutores. Quando temos coragem de nos abrir emocionalmente, nos sintonizamos com o sistema límbico de nosso interlocutor, um conjunto de estruturas cerebrais interconectadas que processam as nossas emoções. Neste instante, uma conexão poderosa acontece, a comunicação passa a se dar pela via emocional. Esse é o momento mais profundo da liderança.

O líder vulnerável não precisa ter todas as respostas, mas fazer as perguntas certas; não precisa saber tudo nem ter todas as soluções. Ele sabe que quem está com ele tem muito mais capacidade de resolver alguns problemas do que ele próprio. Ao ser vulnerável e humilde, ele projeta uma imagem de força legítima e sustentável.

Tudo muito novo. Que tipo de líder você é ou se prepara para ser? O que inspira, cuida e desenvolve ou aquele que ainda está no mundo selvagem, se defende o tempo todo e acredita que vulnerabilidade é sua maior fraqueza?

Jorge Sant’Anna é diretor-presidente e cofundador da BMG Seguros e membro do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Bancos