Finanças

Como vai ficar o crédito no fim do ano?

Enquanto grandes bancos brasileiros reforçam a intenção de reduzir taxas para incentivar a contratação de financiamentos, relatório do Goldman Sachs afirma que custo do dinheiro no Brasil vai permanecer alto e que a inadimplência deve crescer

Crédito: Istockphoto

Consumo no final do ano: datas festivas e promocionais podem favorecer a oferta de crédito (Crédito: Istockphoto)

Por Jaqueline Mendes

RESUMO

• Alto endividamento das famílias prejudica condições de financiamento
• Datas como Black Friday e Natal podem atuar no sentido de maior acesso a empréstimos
• Analistas têm opinião divergente: Goldman Sachs vê estagnação da oferta
• Programas como Desenrola buscam favorecer a liberação

O clima econômico no Brasil não está bom para o Papai Noel. Mesmo com a cotação do dólar mais baixa do que no Natal de 2022, quando estava R$ 5,25 contra R$ 5,10 previsto pelo Banco Central para dezembro deste ano, o último trimestre começou passando a percepção de que estará bem mais para frango com cerveja do que para champanhe com peru.

Pelo menos é isso que prevê um relatório divulgado na semana passada pelo banco americano Goldman Sachs. A explicação dos economistas do banco é que o crédito deverá seguir impeditivo para grande parte da população.

Eles afirmaram que o crescimento do estoque de recursos disponíveis para financiamentos e para empréstimos tem desacelerado, tanto no segmento de crédito livre quanto no direcionado. E o pior: a inadimplência das empresas voltou a crescer.

O relatório do Goldman Sachs chama a atenção porque contrasta com a perspectiva de reaquecimento do crédito na reta final de 2023. Os maiores bancos brasileiros, depois de acompanhar dois cortes consecutivos na taxa básica de juros, afirmaram que vão reduzir o custo aos consumidores para incentivar a contratação de financiamentos.

Itaú Unibanco, Banco do Brasil e Caixa afirmaram que estão reduzindo os juros de diferentes linhas de crédito. O mesmo ocorre com o Bradesco. O presidente do banco, Octavio de Lazari Junior, disse que vai reduzir os juros nas linhas em que houver espaço.

“Estamos avaliando em todas as linhas de crédito. Nas que tivermos oportunidade, vamos reduzir.”
Presidente do Bradesco, Octavio de Lazari Junior

Em coletiva de imprensa, Lazari afirmou que a demanda por crédito deve começar a voltar primeiro pelas grandes empresas, chegando por último às pessoas físicas. “O resultado do segundo trimestre mostrou uma evolução de 6% em relação ao primeiro, e veio dentro de nossas expectativas”, disse.

Para o executivo, a melhora do cenário para a economia brasileira deixa espaço para um maior otimismo com o crédito até o final do ano. “Os efeitos da pandemia já se dissiparam.”

1,9%
é a projeção de alta nas vendas do varejo de são Paulo no período de festas natalinas, mesmo com o crédito ainda reticente

Divergências

Então por que o Goldman Sachs pensa de outra forma? Vamos aos números usados pelos analistas do banco. O estoque de crédito, em termos nominais, cresceu 8,9% em 12 meses até agosto, contra 9,3% em julho. Já em termos reais, a alta foi de 4,1%.

As taxas de juros no crédito livre caíram tanto para pessoa física quanto para a jurídica. A inadimplência das empresas no crédito livre subiu ligeiramente, de 3,2% para 3,3%, entre agosto e setembro, e enquanto a das famílias recuou de 6,2% para 6,1%. Um resultado que o banco americano vê como fraco.

“Esperamos que as condições de crédito sejam exigentes nos próximos meses dado o alto nível de endividamento do consumidor, as taxas reais altas, as perspectivas de suavização da atividade real e várias situações de dificuldades no crédito corporativo”, afirmaram os analistas do Goldman Sachs.

Para eles, a situação só não é pior do que no ano passado porque tem acontecido generosas transferências fiscais, somadas a um ritmo robusto do mercado de trabalho.

Presidente do Bradesco Octavio de Lazari, diz que o banco já estuda formas de reduzir os juros em algumas linhas de crédito ainda em 2023 (Crédito: Zanone Fraissat)

Otimismo

Economista da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Ulisses Ruiz de Gamboa é bem mais otimista, prevendo alta de 1,9% no desempenho do varejo paulistano este ano na comparação com 2022.

Para a cofundadora da plataforma Bankly, Marilyn Hahn, o corte na Selic está repercutindo bem no mercado de crédito e no consumo. Segundo ela, a queda de meio ponto percentual na taxa básica em setembro influencia diretamente na tomada de crédito e no apetite ao consumo do brasileiro.

A isso deverá se somar a janela de final de ano, com eventos como Black Friday e Natal. “O bom resultado nas vendas no último trimestre será fator crucial para apoiar a tomada de decisão em relação a possíveis expansões do investimento da indústria e do varejo em 2024”, disse.

Nesse cenário de mais otimismo, o programa de renegociação de dívidas Desenrola Brasil terá papel protagonista, de acordo com Patrícia Zanlorenci, CEO da Vellore Ventures.

“Embora o efeito da taxa de juros ainda demore um pouco para surtir efeitos, porque existem outros fatores que afetam diretamente o mercado, como o risco alto de crédito e o alto grau de endividamento das famílias brasileiras, programas do governo federal como o Desenrola Brasil ajudam neste sentido.”