Ataques cibernéticos: efeito cascata
Após ação hacker na Colômbia, fragilidade da segurança digital na América Latina fica evidente. Especialista diz que só investimento não basta
Por Victoria Ribeiro
Dia 13 de setembro, uma quarta-feira, entrou definitivamente — e de forma negativa — no calendário da multinacional de telecomunicações IFX Networks. A empresa sofreu um ataque hacker que derrubou o sistema judiciário colombiano, se tornando um dos maiores ciberataques da história do país. As informações, que nunca são 100% oficializadas, são de que um grupo de criminosos usou um ransomware para criptografar e roubar dados, incluindo informações de cidadãos colombianos. A amplitude da invasão também alcançou Argentina, Chile e Panamá. Presente em 16 países latino-americanos, a IFX Networks presta serviços de telecomunicações. No caso da Colômbia, foi contratada para prestar serviços a entidades públicas, entra elas Poder Judiciário, Ministério da Saúde e Superintendência da Indústria e Comércio. O caos levou inclusive o presidente do país, Gustavo Petro, a criar um gabinete de gestão de crise.
Para Marcos Oliveira, gerente nacional da Palo Alto Networks, multinacional americana focada em segurança cibernética, o episódio colombiano deve ser encarado como representação da fragilidade da América Latina no quesito da segurança digital. Presente em mais de 150 países, incluindo o Brasil, a Palo Alto Networks tem apenas cinco anos de vida e é uma multinacional americana focada em segurança cibernética. Oliveira diz que esse é o tipo de evento que não pode passar despercebido. “Porque se tratou de um ambiente ideal para os invasores”, afirmou. Ideal tem a ver também com a visibilidade alcançada. O ransomware é um ataque sofisticado e cada vez mais comum e acontece quando criminosos usam um programa para invadir sistemas, bloquear bancos de dados, backups ou credenciais. Após isso, passam a exigir resgate em troca de restabelecer a liberação do acesso.
“Não adianta ter preparo tecnológico se não existe uma consciência dentro do ambiente corporativo” Marcos Oliveira gerente nacional da Palo Alto Networks
Isso pode significar a interrupção do funcionamento das operações por dias. No caso colombiano, parte dos acessos ao Ministério da Justiça permanecia fora do ar mais de 24 horas após o ataque. Entre os principais desdobramentos desse tipo de malware, segundo Oliveira, está o efeito cascata. Uma espécie de inspiração a outros ataques em outros países. Um pouco como ondas de crimes no ambiente físico: roubo de celulares geram temporadas de roubos de celulares, assim como sequestros-relâmpago geram mais sequestros-relâmpago. “Na Colômbia, o ataque foi direcionado a uma empresa de telecomunicações, mas acabou se expandindo a outras empresas e países”, disse Oliveira. “O impacto, seja o financeiro, de imagem ou de interrupção de serviço, acaba servindo para todos aqueles que estão interligados.”
O Brasil passou por eventos semelhante. Instituições públicas como o Ministério da Saúde, o Tesouro Nacional e o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) já foram alvo de ransomware. De acordo com os dados mais recentes da Unit 42, a unidade de Inteligência e Pesquisa de Ameaças da Palo Alto Networks, houve aumento de 51% nos ataques de ransomware no País em apenas um ano. Questionado sobre as hipóteses que podem explicar os dados brasileiros, Oliveira respondeu que são muitas. A começar por algo considerado cultural: a sociabilidade. “O Brasil é um país sociável e aberto. Isso significa que estamos sempre aptos a correr riscos”, afirmou.
Outro ponto levantado por ele está relacionado à grande quantidade de instituições financeiras — o que colabora para uma massificação de dados — e a um fator que nasce da pandemia de Covid-19. “No momento em que as empresas precisaram assumir o modelo home office, o controle sobre a segurança se rompeu”, disse Oliveira. Segundo ele, porém, apesar de todas essas hipóteses, a principal está associada a desafios financeiros. “Nós não temos recursos especializados em cyber na maioria das empresas, o que colabora para que o grau de maturidade seja inferior em relação a outros países.”
QUESTÃO DE COMPORTAMENTO Mas não é só o preparo que deve existir. A resposta aos ataques, na opinião de Oliveira, também precisa estar na ‘ponta da língua’. Não se trata sobre ser ou não atacado, e sim sobre a rapidez de reação. “A estrutura precisa estar definida para estancar a invasão o mais rápido possível”, afirmou. Para isso, a tecnologia deve ser considerada essencial, não a única solução. “Não adianta a empresa ter esse preparo tecnológico se não existe uma consciência do ambiente corporativo em geral.” Sim. Os funcionários também são uma porta de acesso. “A responsabilidade não é só da empresa. A fragilidade está no todo”, afirmou. “O problema é que, apesar dos riscos, boa parte do corporativo ainda não entendeu a necessidade de arquitetar uma estrutura.”