Lições sobre liderança no front da guerra em Israel
Por César Souza
Éramos seis pessoas (eu, minha mulher, Cris, nossa filha Yasmim e um casal de amigos com a filha também adolescente) em Jerusalém, quando fomos surpreendidos pelo início brutal dessa nova guerra. Havíamos passado dias maravilhosos conhecendo o trabalho inovador e disruptivo de várias startups israelenses. Visitamos dois kibutz, tivemos aulas sobre a complexa geopolítica dessa região nos trajetos entre cidades com relíquias arqueológicas e locais religiosos, como o Mar da Galileia e o Rio Jordão.
De repente, o foco da visita mudou: passou da Montanha da Bem Aventurança e do Monte das Oliveiras para bunkers e abrigos onde pudéssemos nos proteger dos ataques violentos que partiam do Hamas, o grupo palestino que controla a Faixa de Gaza. Na segunda-feira (9), conseguimos a duras penas embarcar para Dubai e daqui retornaremos ao Brasil em segurança. Naquela manhã, ainda no aeroporto de Tel-Aviv, tivemos de correr para um local seguro após soar alarmes de bombardeios e mísseis. Estávamos sem dormir direito havia três dias.
Além do desgaste físico e emocional, a situação de guerra gerou aprendizados que podem ser úteis para o exercício eficaz da liderança. Aqui vão algumas reflexões:
1. Focar na solução e não no problema: não adianta dispersar tempo e energia se lamentando sobre o acontecido. Repetia para mim mesmo e para os demais: “apaixone-se pela solução, não pelo problema!”
2. Definir o problema de forma correta: nosso desafio não era voltar para casa (forma incorreta), mas sim sair do local da guerra. Isso ampliou o leque de alternativas e facilitou a busca da solução.
3. Estar atento aos sinais imperceptíveis que podem ser reveladores: ao receber uma notinha do diretor do hotel logo no início do conflito, dizendo que iriam reduzir o quadro de funcionários, um sinal amarelo foi aceso: a guerra vai escalonar, pois os jovens funcionários podem estar sendo convocados para o serviço militar imediato e os funcionários árabes podem estar sendo afastados por temor de serem agentes infiltrados. Essa percepção acelerou a nossa busca pela solução.
4. Ter sempre um plano B e um C: nunca dependa de uma única alternativa. Buscamos passagens aéreas para decolar do aeroporto; consideramos saída terrestre pela Jordânia transportados por beduínos; acionamos amigos para nos colocar em contato com a Embaixada do Brasil para eventual resgate, até muito antes de ser cogitada a Operação da FAB.
5. Utilizar o network de cada membro do grupo. De forma sinérgica conseguimos mobilizar dezenas de pessoas que nos ajudaram a buscar alternativas e a nos dar conforto espiritual e energia positiva sempre indispensável nos momentos de crise.
6. Evitar se intoxicar com informações nocivas das redes sociais: sabemos que, em tempos de guerra, a primeira vítima é a verdade. O mesmo ocorre quando existe confronto entre acionistas de uma empresa, em épocas de eleições ou até mesmo em conflitos conjugais. Cada lado constrói uma narrativa aterrorizante. Perder tempo com isso nos faz sofrer e diminui nossa capacidade de focar na solução.
7. Autolideranca é essencial: manter a força interior, a saúde física e mental, o bom humor e atitudes positivas são fundamentais para enfrentar situações adversas. Repetia para mim mesmo e para os meus entes queridos: “Não podemos adoecer, nem entristecer, temos de ficar lúcidos e aptos para sair dessa. Temos um problema lá fora, não podemos ter outro dentro de cada um de nós”.
8. Saber gerenciar nossas emoções: entender que o medo, a raiva e a frustração são sentimentos normais e legítimos. Sabedoria não é negá-los, mas saber como lidar com cada um deles. Minhas emoções represadas só foram liberadas na decolagem, quando olhei pela janela do avião e vi uma pontinha do território israelense. Senti então o gosto muito salgado das minhas lágrimas tanto pelo alívio da partida quanto pela tristeza de saber que muitos ali ficaram.
Concluo tomando de empréstimo uma frase do Ariano Suassuna, enviada por quem muito agradeço por ter me inspirado a escrever este texto: “Tudo que é ruim de viver pode ser bom pra contar!”
César Souza é fundador e presidente do Grupo Empreenda