Reforma sem fim
Por Carlos José Marques
O Brasil inteiro espera ansioso e parlamentares dizem correr para aprovar uma reforma tributária digna de nome ainda neste ano letivo. É tarefa hercúlea diante dos enormes desafios, pressões e pedidos de toda a ordem. O mar de exceções em jogo, as arrastadas negociações e as idas e vindas de votações entre Senado e Câmara retardam — e até comprometem — o projeto. Os Estados federativos protestam veementemente sobre o que alegam ser uma tungada mortal de recursos em suas respectivas arrecadações. O secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, diz que não há fonte de custeio para um fundo regional. A Zona Franca de Manaus clama por um tratamento especial que lhe garanta sobrevivência e não há consenso nem mesmo sobre os ajustes mais elementares. A propalada simplificação fiscal, através da soma de tributos em um único imposto (o decantado IVA) já virou quase uma quimera. Existem tantas categorias de IVA que até o contribuinte ficará confuso. E o que é pior: pelos cálculos, a alíquota do tal IVA pode chegar a inacreditáveis 27,5% — disparadamente, a maior do mundo. Nem dá para imaginar, nessa toada, que a carga vá de fato diminuir. O Brasil não é mesmo para amadores. O Imposto sobre Valor Agregado que, em diversos países, virou a fórmula ideal, até por permitir maior transparência sobre o que está sendo cobrado, por aqui foi transformado em uma colcha de retalhos. Todo mundo quer levar a melhor na conta, especialmente grupos que detêm maior poder de lobby sobre o legislativo. Talvez seja essa a principal razão para décadas de conversas em vão sobre uma estrutura tributária mais justa: ninguém cede. O Comsefaz (Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal), que representa os entes federativos, quer R$ 80 bilhões em um fundo de compensação para concordar com as mudanças. Emendas no projeto final não param de chegar e ele fica assim a rodar de casa em casa, da plenária do Senado à Câmara, em busca de um entendimento que nunca chega, sob os olhares perplexos da maioria dos contribuintes finais que tudo pagam e quase nada palpitam. É decepcionante. Enquanto isso, a tributação de grandes fortunas, que mexe com o bolso de quem pode de fato influenciar no parlamento, não entra na pauta. É quase assunto proibido. No cômputo geral, a almejada reforma traz poucas notícias boas para um carnaval de surpresas ruins. A boa é a da própria unificação prevista no IVA. O fato, no entanto, é que ele será “dual”. Ou seja: dividido em dois. Um concentrando tributos federais e o outro com a carga de impostos estaduais e municipais. A forma disso funcionar trás os mais variados temores de confusão no cômputo final. Tem gente que vai pagar “meia entrada” nas cobranças, integrando o bloco das exceções. Para a turma da arquibancada, o rigor da tarifa cheia. Já são mais de 40 anos nesse vai, não vai, dentro de um assunto primordial. Legisladores tentam traçar um novo caminho para um país que convive com o que é chamado de verdadeiro manicômio tributário. O tempo, o investimento e o esforço que se perde se buscando entender de onde vem tantas taxas dessa carga é insuportável. Decerto, de uma forma ou de outra, isso precisa logo mudar. Não há quem discorde neste pormenor: a virada é urgente.