Revista

A conta das empresas do governo

Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Carlos José Marques: "Não é sustentável nos dias de hoje que governos façam das estatais o seu quintal para traquinagens" (Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Por Carlos José Marques

Com a chegada do final do ano vai aparecendo afinal a fatura das companhias estatais neste primeiro exercício de gestão Lula — que já teve, lá atrás, sonoros problemas com essas organizações em virtude das denúncias de desvios sem fim nos seus caixas. Pois bem, havia decerto uma grande expectativa sobre como elas iriam se comportar com a volta ao poder do demiurgo de Garanhuns. E, a julgar pelos números preliminares que surgem, as perspectivas não são nada boas. Nas contas oficiais, o Tesouro Nacional poderá ter de cobrir um rombo estimado em nada menos que R$ 5,6 bilhões. Essa seria a soma do déficit gerado pelo universo das empresas do Estado que deve ser arcada, na ponta final, diretamente pelo contribuinte. Naturalmente, no festival de desarranjos orçamentários existe um misto de práticas deletérias como a do inchaço de estruturas com indicações políticas, o descaso com despesas operacionais e até mesmo os subsídios para políticas populistas indevidas. Na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) existe até uma brecha para que as companhias do governo possam, juntas, registrar um resultado negativo de até R$ 3 bilhões. Mas o valor ultrapassou, e muito, esse teto. Chegou a quase o dobro e, para variar, não há de onde tirar a receita que cubra o estouro. Sobra para o Tesouro, que deve gerar algum tipo de caixa extra tentando fazer frente à despesa. Elementar. É nessa toada que apareceu nos últimos dias mais uma artimanha casuística, a medida que vai se tornando usual, de lançar uma emenda para garantir o aumento real de 0,6% nos gastos dentro da LDO de 2024. A proposta foi protocolada pelo senador Randolfe Rodrigues, líder do governo no Congresso, para que o contingenciamento sugerido ao próximo exercício fiscal permita, e garanta, um crescimento real das despesas de considerável envergadura, mesmo que isso venha a comprometer a meta do resultado primário. A essa altura do campeonato, o artifício não teria como ser evitado. Diante das evidências de que as estatais estão se apresentando mais dispendiosas do que o aceitável, o que há a fazer? Vendê-las era uma opção que foi engavetada. Evidentemente que o “ajuste” de 0,6% a mais na LDO não será todo destinado a cobrir o buraco das companhias públicas. Existem outras rubricas extremamente onerosas na lista de destinações do Estado. Porém, a falta de disciplina dos dispêndios estatais salta aos olhos. Boa parte delas, teoricamente, não depende — ao menos não totalmente — dos recursos da União. São empresas do porte de uma Dataprev, Correios, Serpro dentre outras. Não estão incluídas no grupo jóias da coroa como a Petrobras, nem mesmo as estatais financeiras (o que poderia levar os valores às alturas, caso contabilizados). Ao que tudo indica, as experiências pretéritas de prejuízos bilionários com as práticas de inchaço da máquina parecem não ter servido de nada. Mesmo após a Lei das Estatais, que proibiu o artifício, por exemplo, das indicações políticas nessas companhias, verifica-se que o comportamento não mudou. Proliferam esquemas nada transparentes — logo no primeiro ano — que sugerem uma escalada no rumo errado. Não é sustentável nos dias de hoje que governos façam das estatais o seu quintal para traquinagens. É preciso que os órgãos fiscalizadores sejam rígidos nesse sentido e coíbam os abusos.