Tecnologia

Connecting Food, a foodtech que combate o desperdício

Connecting Food une alimentos descartados a organizações sociais

Crédito: Istockphoto

Dados da ONU apontam que o desperdício atinge 27 milhões de toneladas de alimentos (Crédito: Istockphoto)

Por Victória Ribeiro

Depois de 15 anos de carreira vividos no ambiente corporativo, impulsionados pela formação em engenharia de alimentos, Alcione Pereira decidiu trilhar um caminho que une a tecnologia a um problema persistente no Brasil: o desperdício de alimentos. No país marcado pelos contrastes, dados levantados este ano pela Organização das Nações Unidas (ONU) apontam que por aqui 21 milhões de pessoas não têm o que comer diariamente e 70,3 milhões estão em insegurança alimentar, enquanto, paralelamente, o desperdício atinge 27 milhões de toneladas de alimentos. Movida por essa conta que não fecha, Alcione buscou um laboratório de empreendedorismo focado em impacto social, o Social Good Brasil, fez conexões com organizações da sociedade civil e, dali, viu nascer a Connecting Food, pioneira foodtech brasileira especializada em conectar os alimentos que seriam descartados por empresas, mas ainda bons para o consumo, às organizações sociais que atendem pessoas em situação de vulnerabilidade social.

“A Connecting Food não é uma ONG, é um negócio de impacto social. Ela também desmistifica a ideia de que trabalho social e lucro não podem caminhar juntos”, afirmou Alcione.

Conforme a CEO da foodtech explica, os alimentos redirecionados são aqueles considerados sem valor comercial por questão estética, mas perfeitos para consumo, como é o caso das bananas fora do cacho ou mais maduras.

No caso das indústrias, de acordo com ela, alimentos que às vezes têm erros na embalagem ou estão relacionados a um pedido cancelado ganham novo destino. Através desse fluxo, a Connecting Food atende hoje 535 organizações, em 273 cidades de todos os estados do País. “São organizações com diversos tipos de fragilidade, que acolhem pessoas em situação de rua, vítimas de violência doméstica, crianças no contraturno escolar e pessoas LGBTQIA+”, disse a executiva.

ACOMPANHAMENTO DE METAS

Para todo o processo acontecer, segundo Alcione, a tecnologia é essencial. É através dela que os dados sobre a quantidade de alimentos são coletados e as doações são monitoradas para posteriormente servir de base para gerar relatórios que permitem acompanhar as metas de cada uma das empresas-clientes. “Nós trabalhamos a partir de um sistema ERP, que é tipo um SAP, só que para a gestão de doação de alimentos. A tecnologia é a chave do processo”, afirmou a CEO.

Além do tech, o processo exige critério do ponto de vista jurídico, sanitário e legal. Apesar de recente, promulgada pelas taxas elevadas de fome durante a pandemia de Covid-19 em, a Lei nº14.016 colaborou para sanar inseguranças relacionadas à responsabilidade civil e legal da doação.

“Existem bancos de alimentos e programas de doações há mais de 30 anos, porém não havia uma lei. Isso deixava espaço para dúvidas e questionamentos do tipo ‘se não permitem, é proibido?’”. A existência da lei, contudo, não alivia a limitação do arcabouço legal que regula as doações.

“Hoje, a gente compete com o descarte. Só para se ter ideia, quando você faz uma doação, muitas vezes você está sujeito a pagar impostos, algo que não acontece quando você descarta como resíduo.”
Alcione Pereira , CEO da Connecting Foods

Parece loucura. É.

Alcione Pereira , CEO da Connecting Foods (Crédito:Divulgação)

“Trabalhamos a partir de um sistema ERP, que é tipo um SAP, só que para a gestão de doação de alimentos. A tecnologia é a chave do processo”

“Estamos fazendo vários roadshows em Brasília, levando, por exemplo, a pauta do arcabouço legal das doações”, afirmou a executiva. A importância da iniciativa, de acordo com Alcione, está atrelada à força da cultura do desperdício no Brasil, muito associada ao “melhor sobrar do que faltar”.

A CEO disse que no Brasil o alimento é símbolo de status. “Você oferecer mais, significa que tem mais. Isso está completamente associado aos índices de desperdício.” Como destaca, é uma pauta que precisa ganhar notoriedade.

Quando se trata das dificuldades, a principal tem sido driblar o paradigma de que trabalho social e empresa lucrativa não andam juntos. O crescimento da Connecting Food segue. A empresa teve alta de 50% em faturamento entre 2022 e 2023 e espera o mesmo em 2024.

“O ESG foi aval para o processo de formação desse mercado”, disse ela. E junto vem a inteligência artificial . “A ideia é escalar para mais de 10 mil pontos de monitoramento e a IA com certeza vai tornar isso possível.”