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O boom dos mercados em novembro e as Sete Magníficas

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Vitoria Saddi: "O crescimento de 52% no Nasdaq foi basicamente devido à excepcional performance das Mag 7" (Crédito: Divulgação)

Por Vitoria Saddi

No mês de novembro, houve um boom generalizado nas principais bolsas de valores do mundo. Na América Latina, as duas principais — medidas pelo Ibovespa no Brasil e IPC no México — subiram em média 13%. A bolsa chilena subiu cerca de 9% no mesmo período. Na Europa, os dois principais índices (STOXX50 e DAX) também subiram cerca de 12%. Nos EUA, as duas principais bolsas de valores do mundo tiveram altas espetaculares. Enquanto o S&P500 subiu 12%, a bolsa de tecnologia, a Nasdaq, subiu quase 15%. Na Ásia o Nikkei em Tóquio, o Hang Seng em Hong Kong e CSI 300, que reúne as 300 maiores empresas em Xangai, tiveram altas de 11%, 9% e 6% respectivamente.

A alta de novembro está bastante ligada ao movimento de interrupção de alta dos juros nos Estados Unidos. A queda no núcleo da inflação dos preços ao consumidor, a redução do ritmo de crescimento da folha de pagamento nos EUA e a queda do ritmo de crescimento do PIB são alguns dos fatores que justificaram a interrupção do ciclo de alta pelo Fed. Não há muitas dúvidas que o boom nestes mercados está relacionado à política monetária americana. A questão agora é quando a autoridade monetária americana irá começar o ciclo de corte da taxa básica em 2024: março, junho ou dezembro. De fato, os mercados antecipam bastante a economia. E, sem dúvida, a alta de novembro é o espelho da melhora conjuntural dos EUA.

Vejo dois grandes movimentos. Esse conjuntural, ligado à política monetária americana que justifica a alta, quase histórica, de novembro. O outro é estrutural e ligado à silenciosa revolução da inteligência artificial e dos modelos neurais de linguagem. O movimento se tornou público em novembro de 2022, quando foi lançado o ChatGPT. A partir daí, iniciou-se uma corrida de todas as empresas de tecnologia para adaptar, melhorar e superar a excepcional capacidade preditiva e de resolução complexa de problemas inaugurada pelo ChatGPT.

Quando do advento da internet e a criação do primeiro navegador, o Netscape, tivemos um boom nunca visto na criação de ‘empresas de internet’, sendo que a maioria delas faliu em menos de um ano. O processo atual é análogo ao boom da internet no sentido que deverá abarcar todas as instâncias da vida cotidiana. As principais ações que estão respondendo por 80% do crescimento de 52% do Nasdaq são chamadas de magnificent 7 (Mag7). As Mag7 são as ações das seguintes empresas: Alphabet, Amazon, Apple, Meta, Microsoft, Nvdia e Tesla.

A expectativa do mercado é que as Mag 7 devam crescer cerca de 18% nos próximos cinco anos (até 2028), contra 4% das demais. O lucro dos próximos cinco anos das Mag 7 deve atingir 15%, contra 2% das demais ações. E o valuation das Mag7 está sendo comparado aos da tech bubble dos anos 2000. Ou seja, é possível que tenha início um processo de crescimento muito maior do que os fundamentos, algo que alguns chamam de bolha especulativa.

Bolhas são processos especulativos que descolam dos fundamentos e registram altas excepcionais. Nos anos 2000, tivemos a bolha da internet, com a posterior falência de diversas empresas de tecnologia. Em 2008, nos EUA, tivemos um processo de bolha do mercado residencial americano. As hipotecas das casas foram securitizadas e transformadas num produto atrativo para o mercado financeiro, conhecido como collaterilized debt obligation (CDO). Estes CDOs eram vendidos para outros bancos no mundo todo e tinham mercado cativo pois eram considerados ativos livres de risco (já que eram ativos garantidos pelo Tesouro americano). Com a inadimplência generalizada das residências, o preço dos CDOs caiu a valores próximos de zero. O problema é que tal ativo era responsável por 75% a 80% do ativo de bancos como Goldman Sachs, Citibank e Merrill Lynch. O resto é história e o processo levou à maior crise financeira do século 21.

O crescimento de 52% no Nasdaq foi basicamente devido à excepcional performance das Mag 7. A perspectiva de manutenção e alta sustentada do crescimento das Mag 7 sugere o início de um uma bolha ou crescimento especulativo. De todo modo, nos períodos que antecedem as explosões das bolhas temos um crescimento econômico significativo e liquidez abundante no mundo. É isso que esperamos para 2024.

*VITORIA SADDI é estrategista da SM Futures. Dirigiu a mesa de derivativos do JP Morgan e foi economista-chefe do Roubini Global Economics, Citibank, Salomon Brothers e Queluz Asset, em Londres, Nova York e São Paulo. Também foi professora na California State University, na University of Southern California e no Insper. É PhD em economia pela University of Southern California.