Finanças

B3: o doce novembro vai continuar?

Ibovespa atinge o terceiro melhor resultado do século, mas, para saber se isso vai durar, temos de olhar para o exterior

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B3: favorecida pelos bons ventos de fora (Crédito: Istockphoto)

Por Paula Cristina

Quem investiu na Bolsa de Valores em novembro viveu um ciclo eufórico. O ganho de 12,54% em um mês e 16,04% no ano superou o que era considerado o melhor ativo de 2023, o Certificado de Depósito Interbancário (CDI), que ofereceu um retorno na casa dos 12,04% entre janeiro e novembro. Mas, afinal, que onda é essa? Para entender esse movimento é preciso olhar para trás.

O último resultado tão positivo no Ibovespa aconteceu em 2020 e, antes dele, em 2002. Essas revoadas de novembro no Brasil, como definem os especialistas, têm em comum o cenário externo. No começo do século, o empréstimo de US$ 4,6 bilhões que o Fundo Monetário Internacional fez ao Brasil estimulou uma entrada grande de investidores estrangeiros na Bolsa, que viam a oportunidade de ganhos no bojo da troca presidencial e ascensão de Lula.

Em 2020, a tensão política após vitória de Joe Biden sobre o então presidente Donald Trump também fez investidores ampliarem os horizontes, e o Brasil foi um dos beneficiados. Em 2023, a acomodação da inflação norte-americana (que apesar de estar acima da meta mostra sinais de controle) e a manutenção dos juros entre 5,25% e 5,50% sinalizaram aos investidores que talvez fosse a hora de buscar novos voos.

O ponto crucial para esse movimento se deu na segunda semana de novembro quando foi divulgado o Índice de Preços de Gastos com Consumo (PCE, na sigla em inglês). O termômetro, que é usado pelo Federal Reserve (Fed), ficou no zero a zero, abaixo do 0,4% do mês anterior, e do 0,2% esperado nos relatórios da Bloomberg, do Goldaman Sachs e do JP Morgan.

Outro ponto de destaque foi o “núcleo do índice”, que nada mais é que um indicador que exclui preços mais voláteis e, portanto, mostra com maior precisão se o ritmo da inflação está mais brando. E está. De setembro para outubro, a alta de 0,3% foi reduzida a 0,2%.

Isso levou a uma percepção generalizada (mas talvez precipitada) de que os juros nos Estados Unidos vão cair antes do previsto pelo Fed. Algumas agências norte-americanas falam em redução para o fim do primeiro trimestre, e não ao final de 2024, como indica o último relatório mensal do Fed, de 28 de outubro.

Christopher Foote, consultor do Fed de Boston (Crédito:Divulgação)

“Conforme a renda fixa amaricana pagava menos, mais subia a atratividade das bolsas no mundo.”
Christopher Foote, professor de Harvard e consultor do Fed de Boston

Segundo Christopher Foote, professor em Harvard e consultor do Fed de Boston, essa saída do mercado de capitais norte-americano tem criado um efeito interessante nas bolsas do mundo todo, mas não deve se sustentar por um ciclo longo. Ele reforçou à DINHEIRO que a inflação americana ainda está em 3%, bem acima dos 2% da meta.

“Temos um crescimento da economia que gira em 5%, e isso sugere que haverá uma contração maior da economia para atingir a meta da inflação”, disse. Essa evasão, segundo ele, está bastante atrelada aos pagamentos do Tesouro americano. Em outubro houve o maior pagamento de prêmios em 16 anos, tudo para que o governo central se financiasse, mas isso não continuou em novembro. “A lógica é simples: conforme a renda fixa americana pagava menos, mais subia atratividade das bolsas do mundo.”

ATRATIVO

Para Fernando Ferreira, estrategista-chefe da XP, a avaliação dos investidores estrangeiros é que faltam opções de investimento. A China vem perdendo espaço nos últimos anos e piorou depois da guerra da Rússia, e outros mercados considerados bons, como Índia e México estão mais caros que o brasileiro. “O Brasil tem uma combinação interessante porque ainda está barato, tem desconto grande e já está num ciclo de corte de juros mais adiantado.”

Na B3 esse foi o movimento sentido. Entre agosto e setembro, as entradas internacionais, que estavam em R$ 24 bilhões, caíram para R$ 6 bilhões ao fim de outubro. Com a mudança dos ventos nos Estados Unidos, a revoada começou na abertura de novembro e fez o mês terminar com entrada de R$ 18,2 bilhões, a melhor performance desde março de 2022. Com essa pressão compradora, fica fácil entender o salto do Ibovespa.

Diante do aumento do apetite estrangeiro, a onda também embala os investidores domésticos. Por aqui, a projeção de que a Selic continuará caindo nos próximos encontros do Copom foi a justificativa de quem decidiu trocar o investimento em renda fixa para apostas na B3. Isso porque os prêmios em contratos estão ligados às expectativas para a Selic. De 31 de outubro até aqui, taxas de CDI para janeiro de 2025 caíram de 10,55% a 10,32%. Já para janeiro de 2033, de 11,25% a 10,87%.

Um novembro que pode ser apenas uma brisa, ou um movimento contínuo, a depender da reunião do Fed, nos dias 12 e 13 de dezembro