Futurologia: economia em equilíbrio ou um desequilíbrio esperando para acontecer?
Por Norberto Zaiet
A euforia dos mercados de risco nas últimas semanas está diretamente relacionada à queda generalizada na curva de juros norte-americana, em todos os vértices. E a curva de juros, por sua vez, está reagindo a um equilíbrio econômico que tem se mantido bastante resiliente nos últimos meses: inflação em queda com desemprego perto das mínimas históricas.
A teoria econômica indica que apertos monetários da magnitude dos realizados pelo Federal Reserve ao longo do último ano levariam a taxa de desemprego a patamares bem acima de 4%. E desemprego em alta significa economia desacelerando, dado que o consumidor perde poder de compra. Uma desaceleração muito forte gera recessão, empurra a inflação ladeira abaixo e força o banco central a baixar juros. A queda de juros, por sua vez, freia o aumento do desemprego, e a economia passa a crescer novamente. Pode ser que isso ainda aconteça nos próximos meses, mas o fato é que, ao contrário de todas as expectativas, não aconteceu.
Como tudo indica que a inflação seguirá em queda nos próximos meses, o todo poderoso mercado de juros, aquele de quem todos os mercados dependem, mandou o recado: com inflação convergindo para 2%, ninguém precisa de juros nominais a 5%. E o Federal Reserve concordou: indicou, na semana passada, diversos movimentos de queda nas taxas de juros de referência, os Fed Funds, ao longo do próximo ano.
O resultado é um final de ano para ninguém botar defeito. A queda na curva de juros teve o efeito de uma injeção de esteroides em mercados que há muito tempo estavam letárgicos: small caps, setor financeiro, bitcoin (e todos os seus parentes). Sobrou até para o Ibovespa.
“O mercado de ações depende da curva de juros, mas a curva de juros não depende do mercado de ações”
A questão que fica é se esse equilíbrio, que, segundo a teoria econômica é frágil, se manterá. Sofreu muito em performance quem esperou que ele fosse quebrado durante 2023. A resposta, caro leitor, ninguém tem. É possível que ele se mantenha — se for esse o caso, a pista de decolagem dos ativos de risco ainda é bastante longa. Entretanto, equilíbrios estão aí para serem, eventualmente, quebrados.
O pano de fundo macroeconômico é complexo. O déficit fiscal americano é crescente, e a teoria (sim, ela mais uma vez) indica que déficits crescentes financiados através de emissão de dívida tendem a custar mais ao longo do tempo. Assim, as taxas de juros de longo prazo deveriam refletir um prêmio em relação às de curto prazo, ou seja, deveríamos ter uma curva de juros ascendente. O que vemos no mercado, já há bastante tempo, é o oposto: uma curva invertida que, em teoria, indica uma recessão. Não vou nem entrar no campo da política, mas é bom lembrar que no ano que vem teremos eleição presidencial nos EUA.
A verdade é que a quantidade de moeda emitida durante a pandemia mexeu com todos os equilíbrios. O consumidor ainda tem dinheiro remanescente daquela época em poupança. A maioria dos empresários conseguiu se financiar a prazos longos com taxas baixíssimas, empurrando os vencimentos de dívida para o futuro. Em condições como essas, equilíbrios que parecem frágeis duram mais tempo. Os economistas do futuro vão estudar esses tempos com grande interesse.
Apesar das incertezas, nesse final de ano agradeço imensamente a você pela companhia durante 2023. Que tenhamos sabedoria para enfrentar os desequilíbrios que 2024 pode trazer. Feliz Ano Novo!
Norberto Zaiet é economista, ex-CEO do Banco Pine e fundador da Picea Value Investors, em Nova York