Entenda o novo Brics, com a adesão de mais ditaduras ao bloco
Grupo de nações criado em 2009 para fortalecer economias emergentes oficializa a adesão de novos membros, mais de olho no comércio do que no modelo de gestão de seus governos
Por Jaqueline Mendes
Pela primeira vez desde 2009, quando Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul se uniram para criar o bloco econômico Brics, a sigla deixou de fazer sentido. Ou, pelo menos, ficou defasado. Na segunda-feira (1º), foi oficializada a inclusão de novos membros: Egito, Etiópia, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Irã. A Argentina, que também entraria para o grupo, ficou de fora por vontade do novo presidente, Javier Milei, que tentará acordos comerciais com países mais alinhados à sua visão ideológica.
A ampliação dos Brics, agora chamado de Brics 10, já havia sido decidida na cúpula de Joanesburgo, em agosto de 2023, mas o prazo para o clube aceitar novos países dependia da aprovação dos parlamentos e governos das nações convidadas.
O problema é que Brics 10 se torna, com a nova composição, um grupo de maioria de ditaduras e autocracias. É o caso de Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Irã e Etiópia. Mas nem o Brasil passa incólume sob essa análise. Dos dez países do Brics 10, nenhum se encaixa na categoria de democracias liberais em que, além de eleições, há ampla liberdade de expressão e liberalismo econômico, segundo critério do V-Dem, o instituto sueco que mede as democracias no mundo.
“Não há dúvidas de que a predominância de governos ditatoriais vai prejudicar a expansão dos negócios para fora da troca comercial entre os próprios membros”, disse o economista Renato Sampaio, da Fundação Getulio Vargas (FGV).
Se no campo político o Brics 10 preocupa, na área econômica não gera muita desconfiança. O fortalecimento do grupo, que agora representa pouco menos da metade da população mundial e quase um terço do PIB do planeta, deve permitir que ele continue a exigir um mundo multipolar e menos dependente do dólar ou dos Estados Unidos.
Um dos pilares do Brics 10 é “desdolarizar” suas economias, um bom negócio para Rússia e o Irã, que estão sob fortes sanções dos EUA.
O futuro do Brics 10 dependerá também da sua capacidade de se entender na política internacional.
“Será complexo chegar a um acordo com países de governos tão heterogêneos, especialmente sob a influência da China.”
Paulo Couto, cientista político
“Um exemplo recente foi a divergência de interesses sobre a guerra em Gaza”, afirmou Couto. Em outubro deste ano, a primeira grande reunião desse novo grupo com os dez integrantes do Brics será na cidade russa de Kazan. O clima do encontro, em um país em guerra, dará uma amostra de qual será a nova postura do Brics. Ou melhor, do Brics 10.