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Uma trindade que muda o mundo

China, Coreia do Sul e Japão se aproximam como havia muito tempo não ocorria

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Edson Rossi: "Enquanto o Japão cresceu de forma acelerada após os anos 1960, e a Coreia do Sul a partir dos anos 1980, a China andou. Mas veio a virada" (Crédito: Divulgação)

Por Edson Rossi

Existe uma lição definitiva na geopolítica. E nela — stricto sensu — não há o que chamamos de diplomacia. De forma reducionista, tudo se resume a um ponto: espaços para semear o fluxo de dinheiro (via transações comerciais, whatever). Pelo lado positivo (tratados) ou negativo (guerras). Assim é. Isso dito o Oriente vive um turning point. Emblematicamente, passa por Taiwan, que no sábado (13) elege seu presidente. Mas vai muito além. De toda forma, o que acontecer na ilha terá reflexos aceleradores (ou não) do que podemos chamar de Novo Oriente. Na corrida presidencial, Lai Ching-te (DPP), também conhecido por William Lai, é o cara da situação, atual vice-presidente. Do partido mais antiPequim (leia-se contrário à unificação com a China continental). Na média das últimas pesquisas, tinha 36% das intenções de voto. Na cola vinha Hou Yu-ih (KMT). Sua legenda defende uma futura reunificação com a China, mas mantendo o regime democrático em Taiwan (seria o pior para os Estados Unidos). Tinha 31% da média das intenções. Por fim, na briga estava Ko Wen-je (TPP), com 24%. Em sua plataforma, o meio termo entre os dois primeiros candidatos: defende uma Taiwan soberana, mas altamente atrelada à China, em especial nos campos cultural e econômico. Havia um quarto personagem, o bilionário empresário Terry Gou, fundador da gigante tecnológica Foxconn. Ele chegou a anunciar a candidatura, mas desistiu no último instante, em novembro, e disse que não apoiaria nenhum dos três. O vencedor assume em maio.

Não importa quem ocupe a cadeira. É pouco provável — mesmo num mundo de conflitos complexos como Rússia-Ucrânia e Israel-Palestinos — que Pequim decida agir pela força para ter Taiwan dentro de suas bordas, a despeito de isso ser meta manifesta do presidente chinês, Xi Jinping. Independentemente do resultado eleitoral de Taiwan, há em curso uma silenciosa aproximação que certa parte do Ocidente parece ignorar: a de China, Coreia do Sul e Japão. Tem menos de 50 dias o simbólico encontro que reuniu os ministros das Relações Exteriores dos três países. Dali nada saiu além de uma agenda protocolar. Mas… Foi a primeira desde 2019. Para falar dos três, vale falar de números — afinal, não existe diplomacia, existe somente fluxo de dinheiro. Exportações chinesas: EUA (1º), Hong Kong (2º), Japão (3º) e Coreia do Sul (4º). Exportações japonesas: China (1º), EUA (2º) e Coreia do Sul (3º). Exportações sul-coreanas: China (1º), EUA (2º), Vietnã (3º) e Japão (4º). Mais: dados do World Bank (2021) mostram que o fluxo de comércio exterior entre os três somou US$ 750 bilhões. É evidente que o crescimento chinês abaixo de 5% (desde o fim da pandemia) pode prejudicar um pouco. No entanto, o nuclear nesses números é que o nível de interdependência já não permite retrocessos ou solavancos.

Pelo lado americano, o olhar sobre Japão e Coreia do Sul sempre foi militar. Washington mantém nos dois países 80 mil soldados. Aparentemente, Pequim aposta no caminho da grana (não que descarte a força). Historicamente, China e Japão sempre foram ligados. Por séculos, até que nos anos 1850 uma expedição americana (com diplomacia & canhões) forçou a abertura dos portos japoneses, que fazia mais de 200 anos só aceitavam chineses e holandeses. O que se seguiu foi rápido. E colocou a relação sino-japonesa num confronto interminável. A primeira guerra entre os dois países (1894-1895) teve a Coreia como pivô. O segundo confronto China-Japão (1937-1945) aconteceu de forma paralela à Segunda Guerra Mundial, e teve como momento mais repulsivo o Nanjing Massacre (1937-1938) — uns 30 dias de saques, estupros em massa e extermínio de civis e militares chineses (entre 100 mil e 300 mil mortos, segundo a Britannica). Para povos que trazem tanta história, e respeitam essa história, aproximações como as reuniões recentes não são pouca coisa.

Enquanto o Japão cresceu de forma acelerada após os anos 1960, e a Coreia do Sul a partir dos anos 1980, a China andou. Mas veio a virada. No ano 2000, a economia chinesa era menos de ¼ da japonesa. Em 2010, ultrapassou os nipônicos se tornando a segunda maior do mundo. “Houve uma mudança significativa no equilíbrio de poder entre os três países”, escreveu Ryosuke Hanada, doutor em filosofia e especialista em assuntos de segurança para a região Indo-Pacífico. “Hoje, tanto a economia quanto as forças armadas da China superam em larga escala as de Japão e Coreia do Sul.” Segundo Hanada, a lógica de dois países contra um país (muito alimentada pelos EUA) virou outra, a de duas nações menores enfrentando um gigante. “Agora, a China vai calcular como incentivá-las a divergir de Washington.” Uma briga e tanto. E nessa Nova Ordem Oriental, há imensos e potenciais espaços para o Brasil.