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Escritórios de advocacia engordam o caixa no “mercado” de sentenças judiciais

Prática muito comum com os precatórios, compra antecipada de ações em julgamento atraem fundos e viram fonte de faturamento para escritórios de advocacia

Crédito: Omar Paixão

"Nos últimos meses, triplicamos o volume de antecipação, em um movimento de crescimento exponencial", diz Columbano feijó Sócio do A7-Pró (Crédito: Omar Paixão)

Por Jaqueline Mendes

O ano mal começou e o advogado Columbano Feijó, sócio do A7-Pró, escritório especializado em recuperação de ativos, registrou um recorde histórico: R$ 16 milhões em antecipação de ações judiciais para seus clientes. Do total, R$ 12 milhões vieram de fundos de investimentos, interessados em operar nesse segmento como estratégia de diversificação de portfólio, e os demais R$ 4 milhões com recursos do próprio escritório. Detalhe: faz só um ano que a A7-Pró atua nessa modalidade. “Nos últimos meses, triplicamos o volume de antecipação, em um movimento de crescimento exponencial”, afirmou Feijó à DINHEIRO.

Assim como no caso dos precatórios (recebíveis de dívidas expedidas pelo judiciário para receber montantes de municípios, estados ou União, autarquias e fundações após a condenação judicial), as ações judiciais privadas em julgamento se tornaram mais recentemente um produto para negociação, principalmente por escritórios de advocacia que enxergaram na operação de alternativa para turbinar o faturamento. É uma forma de antecipação de recebíveis do ponto de vista do cliente, que transfere ao escritório o risco de perder o processo.

As cifras, à primeira vista, podem não chamar a atenção de investidores, já que os fundos parceiros do A7-Pró, por exemplo, têm em caixa mais de R$ 400 milhões para investir. Mas o potencial de crescimento é atraente. Para se ter uma noção do tamanho desse mercado, apenas o Tribunal de Justiça de São Paulo — o maior e mais movimentado do País — emitiu mais de 5 milhões de sentenças no ano passado. “Não temos números precisos que demonstrem o tamanho desse nicho, mas estamos falando de algo na casa de bilhões”, disse Feijó.

Os ativos mais vultuosos, segundo Feijó, geralmente envolvem processos contra grandes companhias, dos mais variados setores. Como a compra de um ativo jurídico é considerada uma ação de alto risco, a avaliação do crédito passa por minuciosa análise do escritório, que propõe abatimento de 10% a 60% do valor estimado pela ação, com ganho mensal de 1,6% ao mês, em média.

Você sabia?
A Justiça encerrou 2022 com estoque de 81,4 milhões de processos em tramitação.
Ao ano, são 31,5 milhões de novas pendências. Bom negócio tanto aos que querem investir em compra de ação judicial quanto aos que precisam de dinheiro e não querem esperara tramitação do processo

(Divulgação)

O deságio varia muito de ação para ação, e envolve o estágio da ação, as jurisprudências relacionadas e os custos a serem absorvidos pelo escritório, como as custas do processo. Uma vez o ativo jurídico adquirido, há uma sub-rogação — quando um terceiro se coloca no papel de alguém para agir em seu lugar ou suceder-lhe nos direitos.

Por isso, os riscos envolvendo a operação reduzem à medida que as etapas do processo vão ficando para trás. “É importante que envolvam disputas com devedores solventes e podem ser créditos jurídicos ou arbitrais. É um alto risco, mas vai se reduzindo na medida da solidez jurídica da ação e, principalmente, das jurisprudências, como as do Superior Tribunal de Justiça, já que elas orientam as decisões dos tribunais”, afirmou o advogado da A7-Pró. “Há casos em primeira instância, segunda ou até já transitado em julgado, mas no qual a pessoa precisa de dinheiro imediatamente.”

CRESCIMENTO

A julgar pelos números, a tendência é que a antecipação de créditos judiciais ganhe ainda mais força nos próximos anos, visto que o número de processos só avança. Em 2022 (dado mais recente), o Poder Judiciário brasileiro atingiu um marco histórico em número de casos: 31,5 milhões de novas demandas chegando à Justiça, alta de 10% sobre o ano anterior.

O dado é da 20ª edição do relatório Justiça em Números, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O estudo reúne dados dos 91 órgãos da Justiça, não englobando o Supremo Tribunal Federal (STF) e o CNJ.

Considerando apenas ações ajuizadas pela primeira vez, sem considerar os casos em grau de recurso e as execuções judiciais, o volume total é de 21,3 milhões de casos, 7,5% a mais que em 2021.

Ao todo, a Justiça terminou o ano de 2022 com um estoque de 81,4 milhões de processos em tramitação. Cerca de 22% desse total eram de processos que estavam suspensos, sobrestados ou em arquivo provisório. Ou seja, não será por falta de processos que o mercado de antecipação vai sucumbir.