Economia

TCU manda recado para o governo: déficit pode dobrar

Tribunal de Contas da União já deu o aviso que Fernando Haddad tem dado a Lula: sem cortar desonerações, a projeção de arrecadação do governo federal em 2024 fica superestimada

Crédito: Adriano Machado

Lula e Haddad: tribunal de Contas tem dúvidas sobre a factibilidade da contenção de gastos conforme planejou o governo (Crédito: Adriano Machado)

Por Paula Cristina

Ainda que o mercado e os economistas sugiram que o governo federal não conseguirá zerar o déficit público em 2024, pairava alguma dúvida, afinal, Lula III surpreendeu expectativas de crescimento do PIB, controle da inflação e manutenção do emprego. O problema é que agora quem fez o alerta foi o Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo a Corte, do jeito que estão desenhadas as linhas de arrecadação e despesa, há grandes chances de o País encerrar 2024 com déficit de R$ 53 bilhões, quase o dobro dos R$ 28 bilhões previstos na margem variável aplicada na Lei Orçamentária deste ano e, consequentemente, ferindo a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Como tem alertado o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o TCU ressaltou os problemas das desonerações em excesso, que no ano passado representaram uma renúncia de R$ 136,8 bilhões, 13% mais que em 2022.

Com essa perspectiva, o TCU alerta que pode ser necessário para o governo acionar gatilhos de contenção de despesas em 2025 e 2026. Isso porque ferramentas estruturais, como o novo Arcabouço Fiscal, ainda tem efeito incerto.

O Tribunal também alertou, por exemplo, que não é “possível concluir sobre a viabilidade, a razoabilidade e a factibilidade” da promessa de reduzir em R$ 12,5 bilhões a despesa com benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) a partir de revisões de aposentadorias.

Além disso, os ministros observaram que, sob os parâmetros atualmente projetados pela equipe econômica para o crescimento e a taxa de juros, a sustentabilidade da dívida não será alcançada na próxima década.

EM 2023 o governo federal renunciou R$ 136,8 bilhões em impostos, 13% mais que em 2022

Durante o julgamento, o relator do processo, ministro Jhonatan de Jesus, afirmou que a inclusão de R$ 168,5 bilhões em receitas extras, condicionadas à aprovação de medidas legislativas, gera insegurança quanto ao cumprimento das metas estipuladas. Segundo o texto, “no Projeto de Lei Orçamentária da União para 2024, a estimativa da Receita Primária Federal Líquida em 19,2% do PIB é muito acima do que foi observado nos anos recentes”. Em suma, para o TCU o Brasil está sentado numa peça ficcional.

DÁ PARA ZERAR

Para Fernando Haddad, o objetivo de zerar o déficit e perseguir o aumento da arrecadação é plausível e viável. “No que me diz respeito, se eu não tivesse muita convicção do que eu estou perseguindo, eu não estaria defendendo há 13 meses a mesma coisa”, disse ele em entrevista na segunda-feira (22).

Apesar disso, ele reconhece que o esforço precisa ser conjunto. “Não vai ser um ministro que vai conseguir entregar o resultado. Eu dependo do Judiciário, do Executivo e do Legislativo. E até agora eu não posso reclamar de ninguém.”

R$ 2,3 trilhões
foi o volume arrecadado pela União em 2023

 
-0,12%
foi a queda real do valor arrecadado no ano passado

19,2% de receita líquida
prevista na LDO parece difícil de acontecer, diz o TCU

Ao longo de 2023 a arrecadação do governo foi quase excelente. Segundo dados divulgados pela Receita Federal, foram recolhidos R$ 2,318 trilhões no ano passado. O resultado representa uma queda real (descontada a inflação) de 0,12% na comparação com 2022, quando o recolhimento total de tributos bateu recorde e somou R$ 2,218 trilhões, em valores nominais.

Mesmo assim, o resultado de 2023 foi o segundo melhor da série histórica em termos reais, justamente atrás do desempenho de 2022. A série da Receita Federal começa em 1995. O Fisco apontou o crescimento real de 21,60% na arrecadação do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), em razão da apreciação da taxa Selic, que se manteve em 13,75% ao ano até agosto. “Destaca-se, especialmente, o desempenho dos fundos e títulos de renda fixa”, afirmou a Receita em seu relatório.

Segundo a ministra do Planejamento, Simone Tebet, todas as premissas apontadas na LDO pela Fazenda foram checadas por sua Pasta. “O que consta no Orçamento de 2024, o Ministério do Planejamento e Orçamento checou e vimos que era plausível”, disse ela.

A ministra entende, porém, que as mudanças promovidas pelo Legislativo puxaram para baixo a estimativa de arrecadação, e agora o governo terá de fazer um levantamento para mapear os impactos das medidas aprovadas. “Toda vez que o Congresso faz alteração, ele mexe nessa balança, para mais ou para menos. No caso da arrecadação, mexeu para menos.”

Com o papel e a caneta nas mãos, os técnicos da Fazenda e do Planejamento já começaram a fazer as contas, e se não fechar, não terá sido por falta de aviso. O TCU fez seu papel.