Finanças

O fantasma do subprime está de volta?

Crise no banco NYBC, que perdeu mais de 60% de seu valor de mercado em duas semanas, reacende temores de contaminação no sistema de crédito dos Estados Unidos

Crédito: Mario Tama/Getty Images/AF

Crise do subprime: motivos são os mesmos de 2008 (Crédito: Mario Tama/Getty Images/AF)

Por Jaqueline Mendes

Os ingredientes da crise são os mesmos: inadimplência em empréstimos imobiliários, desvalorização dos ativos concedidos como garantia, alto grau de alavancagem e excesso de títulos podres. Tudo isso pode descrever a crise do subprime, em 2008, mas é a situação do banco regional New York Community Bancorp (NYCB), que está enfrentando a maior crise de sua história. Fundada em 1859, a instituição perdeu nas últimas duas semanas 60% de seu valor de mercado, o menor desde 1997.

Com os clientes sacando seus investimentos, as ações caíram 22% em um único dia, na terça-feira (6). A corrida por resgate de ativos ganhou força depois que o banco anunciou um corte de dividendos e um aumento repentino de US$ 500 milhões em reservas para perdas com empréstimos.

O movimento remete ao que ocorreu com o Lehman Brothers e o tradicional banco Merrill Lynch (comprado pelo Bank of America), na crise do subprime. Naquela mesma época, Goldman Sachs e o Morgan Stanley pediram socorro emergencial ao Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA.

Apesar das semelhanças, muitos investidores afirmam que não existem motivos, por enquanto, para prever uma contaminação generalizada no mercado bancário americano.

Isso porque os problemas do NYCB, concentrados nos contrários de empréstimos imobiliários comerciais, não estão compartilhados com outros bancos. Esses empréstimos estão indo mal em muitos lugares, à medida que os valores das propriedades diminuem como resultado de taxas de juros mais altas e do aumento do trabalho remoto, que reduz a necessidade de imóveis comerciais.

NYCB teme que ocorra o mesmo que em 10 de março do ano passado, quando clientes sacaram, em um único dia, R$ 42 bilhões do SVB, o que levou o banco ao colapso (Crédito:Nikolas Liepins)
(Divulgação)

Além disso, o NYCB tem muito dinheiro vinculado a blocos de apartamentos em Manhattan, onde os aluguéis são controlados e não são reajustados de acordo com o aumento nacional dos aluguéis.

O banco também parece ter sido apanhado de surpresa por ter que manter mais reservas de capital depois de ter adquirido o falido Signature Bank no ano passado e ficar com ativos de mais de US$ 100 bilhões.

A Moody’s rebaixou a dívida do banco, mas o NYCB disse que isso não afetaria seus acordos contratuais, em um documento enviado à SEC (a comissão de valores mobiliários americana). O banco afirmou que possui “ampla liquidez”. A Fitch Ratings já havia rebaixado o banco para sua classificação mais baixa na sexta-feira.

Para o Bank of America (BofA), há um julgamento mais rígido sobre a crise do banco. “Tal como evidenciado no caso do NYCB, os reguladores parecem ter paciência limitada para quaisquer deficiências ou qualquer aspecto de uma instituição que possa fazê-la parecer fora da curva”, disse o banco, em análise.

TRAUMA

A preocupação se justifica. Em 10 março do ano passado, clientes retiraram US$ 42 bilhões em um único dia do Silicon Valley Bank (SVB). A instituição entrou em colapso. O governo federal dos Estados Unidos interveio para garantir os depósitos dos clientes, mas a queda do SVB espalhou pânico nos mercados financeiros globais.

O governo também fechou o Signature Bank, um banco regional que estava à beira do colapso, e garantiu seus depósitos.

O SVB possui operações no Canadá, China, Dinamarca, Alemanha, Irlanda, Israel, Suécia e Reino Unido.

O banco se beneficiou do crescimento do setor de tecnologia, alimentado por custos de empréstimos ultrabaixos e um boom induzido pela pandemia na demanda por serviços digitais. Dos nascidos no século retrasado, aos filhos da era da internet, todos os bancos têm os mesmos desafios.