O futuro já chegou e ele é colaborativo

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Luís Guedes: "Em que pesem as dificuldades de abertura do processo de inovação e algumas exceções de empresas verticalmente integradas, a abordagem “faça tudo você mesmo” tem sido cada vez mais difícil de sustentar" (Crédito: Divulgação)

Por Luís Guedes

Há cerca de 20 anos um brilhante professor de Berkeley codificou e transformou em livro uma prática até então pouco estruturada. O ano era 2003 e o livro Inovação Aberta: O novo imperativo para Criar e Lucrar com Tecnologia transformaria o professor Henry Chesbrough em uma celebridade do setor. Foi a partir desse livro que se iniciou o estudo sistemático do processo por meio do qual as organizações aproveitam ideias e recursos sobre os quais não têm controle direto, mas que são insumos para impulsionar sua própria jornada de inovação.

Dada sua importância e alcance, ao longo do tempo a Inovação Aberta passou de prática a estratégia, entrelaçando-se na cultura de muitas empresas de sucesso, como é o caso da Natura, Comgás, Petrobras e Embrapa, para ficarmos em algumas que estão aqui, no nosso quintal.

Um dos fundamentos da inovação aberta é a acertada constatação de que nem todas as melhores cabeças do mundo trabalham para você, mesmo que você seja a Apple (estima-se que haja mais de 2 milhões de apps e jogos na App Store — quantos desses desenvolvedores a curiosa leitora, o conectado leitor, acredita que trabalham na Apple?)

Em um desafio de inovação aberto ao público que se tornou famoso, a Netflix convidou a comunidade a aprimorar seu algoritmo de recomendação de filmes. O vencedor receberia US$ 1 milhão! Foram mais de 40 mil equipes inscritas, de 186 países

A construção do (realmente) novo não pode se pautar apenas nos recursos e ideias internas — esse é um conceito que cada vez menos se disputa. Entretanto, a jornada é tudo, menos fácil.

Duas décadas de pesquisa acadêmica indicam que as maiores barreiras para a estruturação bem-sucedida da inovação aberta são internas, e não externas, à organização. Preocupações com a confidencialidade e com a propriedade intelectual são as mais comuns e lançam uma sombra de dúvida sobre as empresas relutantes em abrir o seu processo de inovação. Cabe aqui o chamado do poeta António Barahona: “É perigoso atravessar; é perigoso ficar no meio; é perigoso ter medo; é perigoso parar”.

O medo é útil, muito útil, mas passa a ser um problema quando nos imobiliza… Há muitas formas de contornar os obstáculos à abertura do processo de inovação, a maior parte deles cuidadosamente descritos na literatura ao longos desses últimos 20 anos.

Em que pesem as dificuldades de abertura do processo de inovação e algumas exceções de empresas verticalmente integradas, a abordagem “faça tudo você mesmo” tem sido cada vez mais difícil de sustentar.

A Netflix, por exemplo, criou uma narrativa interna propícia à inovação aberta aproveitando sua admirada cultura organizacional de “liberdade e responsabilidade”. Ambos os valores são condutores que fazem circular a criatividade, de dentro e de fora da companhia. Em um desafio de inovação aberto ao público que se tornou famoso, a Netflix convidou a comunidade a aprimorar seu algoritmo de recomendação de filmes. O vencedor receberia US$ 1 milhão! Foram mais de 40 mil equipes inscritas de 186 países e ao longo de três anos foram propostas centenas de soluções. A equipe vencedora era composta por engenheiros, estatísticos e cientistas da computação da Áustria, Canadá, Israel e Estados Unidos.

Ainda que o processo deva ser cauteloso, as organizações podem gerar considerável valor ao compartilhar sinergicamente ideias e conhecimentos. A obsessão por controle é coisa do século passado.

Luís Guedes é professor da FIA Business School