Entenda o quebra-cabeça da Reforma Tributária: regulamentação pode ser complexa
Governo deve apresentar regulamentação em 15 de abril, mas ainda há mais dúvidas que certezas sobre onde encaixar cada peça
Por Paula Cristina
RESUMO
• Pressionado por Lira, governo corre para aprovar regulamentação
• Haddad diz que objetivo não é aumento de arrecadação, mas simplificação e transparência
• Analistas alertam para o risco de efeitos adversos sobre a atividade econômica
Três meses após ser aprovada, a Reforma Tributária ainda precisa organizar muitos pontos antes de entrar em vigor. Para tomar conta da narrativa, o governo corre para enviar ao Congresso a regulamentação das novas regras, tudo isso sob ameaça constante do presidente da Câmara, Arthur Lira, de desenvolver no Legislativo os parâmetros. De acordo com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a regulamentação está sendo desenhada desde a aprovação do texto e deve ser enviada ao presidente Lula na semana do dia 8 e ao Congresso no dia 15.
O ministro tem mantido firme o discurso de que o plano não é obter impacto financeiro para a União com a reforma, ou seja, não haveria aumento de impostos. Mas essa afirmação ainda está longe de ser absoluta. Ainda é preciso mensurar o custo do que falta ser definido, a começar da alíquota-padrão do novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA). Com base no texto da reforma aprovado no ano passado, o próprio governo estima uma alíquota em torno de 27%, o que seria uma das maiores do mundo.
Segundo Alcides Wilhelm, diretor do Wilhelm & Niels Advogados Associados, a regulamentação pode resultar em efeitos adversos sobre a atividade econômica. “A reforma é importante especialmente na busca por simplificação e transparência no sistema fiscal, mas é crucial considerar os impactos potenciais sobre os diversos setores econômicos”, disse.
Uma dessas ponderações foi feita pela Confederação Nacional do Comércio, no estudo sobre influência do aumento da carga tributária na redução da atividade econômica. Segundo a estimativa, a cada acréscimo de 1% na carga tributária do consumo pode resultar em queda no faturamento dos setores de turismo (0,49%), comércio (0,34%) e serviços (0,35%), prejudicando a dinâmica econômica desses segmentos. “A proposta de reforma deve ser cuidadosamente calibrada para evitar impactos negativos sobre o crescimento econômico e a competitividade de determinadas regiões”, disse.
Outro apontamento foi feito pela Universidade de São Paulo (USP) e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Em um estudo de prospecção, eles indicaram que a reforma terá efeitos assimétricos em regiões diferentes.
•Os Estados da região Norte, por exemplo, podem perder competitividade na atração de investimentos, o que resultaria em uma distribuição desigual do crescimento econômico dentro do Brasil.
• Desestimular o empreendedorismo também é um dos potenciais efeitos da reforma, a depender do resultado da regulamentação, em especial no setor de serviços, consumo das famílias e turismo.
BRILHO DE APPY
Depois de decidir as questões sobre quais setores ainda terão desoneração, como a reforma vai impactar segmentos diferentes e avaliar os impactos regionais das mudanças, o secretário extraordinário da reforma tributária, Bernardy Appy, deverá ser o homem de Haddad no Congresso.
“Queremos dar celeridade ao texto com as regulamentações para não conflitar com o período eleitoral dos municípios.”
Bernard Appy, secretário do Ministério da Fazenda
Ele lidera a Comissão de Sistematização (Cosist) criada pelo Ministério da Fazenda para tratar dos projetos de lei que regulamentarão a reforma tributária. O objetivo é dar celeridade aos textos para evitar que as matérias estacionem no Legislativo em função das eleições municipais. Até agora, a previsão é o envio de dois projetos de lei complementares ao Congresso Nacional, conforme afirmou Appy em evento na capital paulista em março.
• O primeiro trataria da lei geral dos novos tributos sobre bens e serviços (da CBS e do Seletivo, de competência federal, e do IBS, dos Estados e municípios).
• O segundo trará a regulamentação do comitê gestor do IBS e mais questões administrativas.
Há, ainda, dois textos finalizados pelo Estados, que devem ser enviados juntos pelo Executivo. São dois projetos de lei, um tratando sobre a regulamentação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) e outro sobre o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD).
Com tantas peças para terminar o quebra-cabeça, é difícil prever se a versão final da Reforma Tributária estará pronta antes de 2026.