Negócios

Petrobras: quem vai rir por último?

Com aval do governo, companhia estuda voltar atrás na decisão de reter a distribuição de dividendos extraordinários para acalmar os ânimos dos investidores. O receio agora é com uma eventual troca de comando da empresa e nova mudança nas regras do jogo da estatal

Crédito: Ricardo Stuckert

Lula e Prates foram personagens centrais da mais recente polêmica na Petrobras, após a decisão de suspender e retomar o pagamento de dividendos (Crédito: Ricardo Stuckert)

Por Hugo Cilo

O sorriso largo do presidente Lula e do CEO da Petrobras, Jean Paul Prates, na foto acima, tirada no ano passado, demonstra a relação amistosa que existe entre eles, mas contrasta com os momentos tensos que tomaram conta dos bastidores da maior empresa brasileira nos últimos dias. A estatal voltou aos holofotes do mercado depois de admitir que deve rever o não pagamento de dividendos extraordinários, anunciado no começo de março e que se tornou o estopim de uma crise desnecessária. Com mediação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o Conselho de Administração recolocou o tema na pauta das discussões. A decisão final deve sair ainda este mês.

A expectativa é de que ao menos metade dos R$ 49,3 bilhões retidos sejam distribuídos aos acionistas — o que simboliza um afago aos investidores e, ao mesmo tempo, retira da empresa o status de vaca leiteira do mercado financeiro. “Estamos falando com os diretores da Petrobras. Isso [o pagamento dos dividendos] vai gerar mais segurança. Penso que está bem encaminhado”, disse Haddad.

Novas descobertas na margem equatorial e investimentos estratégicos definidos em 2023 em US$ 12,7 bilhões trazem perspectivas para a companhia (Crédito:Vitoria Velez)

Com a polêmica dos dividendos quase superada, a Petrobras tem lidado com um novo incêndio. Desde a semana passada, declarações cruzadas nos bastidores sugeriam que o presidente empresa, Jean Paul Prates, estava com a cabeça a prêmio.

Os rumores quase viraram convicções depois de o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, dizer a interlocutores que Lula o sondou para assumir o comando da Petrobras. Pode até ser verdade, mas queimou a largada. Lula teria se irritado com mais uma fonte de burburinho envolvendo a companhia, em um momento de queda na popularidade e aumento das críticas do mercado à atuação do governo como principal acionista da petroleira.

(Valter Campanato/Agência Brasil)

“Tenho o mais profundo respeito e admiração pelo presidente Jean Paul. Mas cabe a mim a defesa das políticas públicas e da visão estratégica.”
Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia

A tese da demissão de Prates foi alimentada nos bastidores também pela suposta saraivada de críticas do ministro Alexandre Silveira, de Minas e Energia, contra o presidente da Petrobras. Ele teria se irritado com a forma como Prates expôs Lula no caso dos dividendos, jogando sobre as costas do presidente da República o peso da decisão.

Mas Silveira, nos últimos dias, agiu em sintonia com Lula para apaziguar os ânimos na estatal. “Tenho o mais profundo respeito e admiração pelo presidente Jean Paul. Tenho carinho e profundo respeito pelo ser humano que ele é”, disse Silveira. “Mas cabe a mim, sim, a defesa intransigente das políticas públicas e da visão estratégica que norteou os eleitores brasileiros”, afirmou.

O próprio Lula tratou de colocar panos quentes na crise e sinalizou que o CEO da estatal continua. O presidente se reuniu com Haddad e Prates na terça-feira (9). A defesa de Prates no comando da empresa teve endosso de Haddad. O ministro da Fazenda é um dos poucos que defendem a permanência de Prates no comando da estatal e a opinião dele costuma ter um peso grande nas definições de Lula.

Haddad expôs seu incômodo com a turbulência na governança da companhia em decorrência do vazamento de informações sobre os embates do ministro das Minas e Energia e o presidente da estatal.

PROJEÇÕES

O saldo positivo das últimas turbulências na Petrobras — se houver algum — deverá ser o aumento da transparência e da governança, que tem sido fortalecida desde a grande crise da estatal, sob o governo Dilma Rousseff. Essa é a avaliação do economista Ramon Coser, especialista da Valor Investimentos.

Para ele, a Petrobras, desde os eventos Lava Jato e Pasadena, tem feito o papel dela na parte de compliance. “A empresa tem focado no core dela e fortalecido sua reputação de maior exploradora de petróleo em águas profundas do mundo”, afirmou.

O petista Aloízio Mercadante, presidente do BNDES, vazou sua conversa com Lula e amplificou as turbuléncias na estatal (Crédito:Daniel Ramalho)

A descoberta de petróleo na Bacia Potiguar, segunda em águas ultraprofundas da margem equatorial do Brasil, na última terça-feira (9), eleva as perspectivas de ganhos da empresa, seguindo o plano da instituição de descobertas de novas reservas e ampliação das pesquisas. As perspectivas de ganho através de novas fontes de exploração também apaziguam as turbulências existentes nos últimos meses, elevando o valor das ações.

Além disso, as perspectivas de expansão dos negócios da empresa tendem a dissipar os atuais problemas. Na visão de João Lucas Tonello, analista da Benndorf Research, a empresa deve se beneficiar do crescimento nas exportações de petróleo e nas vendas de produtos de petróleo no mercado interno. A redução das importações de Gás Natural Liquefeito (GNL) também pode contribuir para o crescimento do lucro.

(Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil)

“Estamos falando com os diretores da Petrobras. vai gerar mais segurança. Penso que está bem encaminhado.”
Fernando Haddad, ministro da Fazenda

Em segundo lugar, na avaliação de Tonello, a Petrobras pode investir em produção e fluxo de gás para aumentar o fornecimento de gás nacional. Isso é crucial para manter a dívida bruta da Petrobras em um nível saudável, dentro da faixa de referência entre US$ 50 bilhões e US$ 65 bilhões. “Aumentar a eficiência operacional também pode ser uma estratégia eficaz, já que a Petrobras alcançou recordes operacionais ao longo do último ano, apoiados por uma estratégia comercial bem-sucedida para diesel e gasolina”, disse.

O especialista da Benndorf Research garante também que a Petrobras deve se beneficiar de investimentos estratégicos. Em 2023, a empresa investiu US$ 12,7 bilhões, um crescimento de 29% em comparação com o ano anterior. “Por isso, é importante evitar uma política de intervenção do governo que possa atrapalhar a política de pagamento de dividendos da companhia”, afirmou Tonello.

Para evitar novas turbulências, as eventuais mudanças nas políticas da estatal precisam ser tomadas com mais racionalidade, segundo Rafael Kenji, especialista em investimentos e CEO da FHE Ventures. “Todas as decisões tomadas pelo Conselho Administrativo, e acompanhadas pelos executivos da empresa, devem defender os interesses da Petrobras, seguindo todas as normas de seu Estatuto”, disse.

Assim que a novela dos dividendos e da suposta troca de presidente da Petrobras for concluída, a imagem de Lula e Prates sorrindo em público voltará a fazer todo o sentido.