Revista

Carta branca para o gasto

Crédito: Paulo Pinto/Agência Brasil

Carlos José Marques: "Sobrou para o ministro Fernando Haddad, que empenhou sua palavra em objetivos não críveis e teve de reconhecer, tardiamente, que a estratégia de arrumação da casa era uma utopia, promessa vazia politiqueira, sem base concreta" (Crédito: Paulo Pinto/Agência Brasil)

Por Carlos José Marques

Foi para as calendas a propalada responsabilidade fiscal. Quase nada mais existe que consiga frear a sanha de despesas do Estado brasileiro. O governo vai seguir gastando muito, no seu pendor perdulário, sem limite ou controle e o País viverá por mais algum tempo — ninguém sabe ou pode precisar até quando, a depender da disposição dos ocupantes do Planalto — na penúria orçamentária. Estava escrito nas estrelas. A promessa de déficit zero de fato não vingou, nunca passou de uma quimera e agora as próprias autoridades vêm a publicar para dizer e confirmar que não irão conseguir. Para 2025, quando imaginava-se algum superávit primário, da ordem de 0,5%, nas contas do próprio Ministério da Fazenda, a rota foi calculada e a torcida no momento é de ao menos empatar as contas — ou seja, despesas iguais às receitas. Os números claramente não fecham com as expectativas que vinham se montando e as razões são simples: com a voracidade de desembolsos para alimentar emendas de políticos e uma certa leniência federal com o inchaço da máquina pública não há mesmo como se chegar a nada diferente. Resultado concreto dessa esbórnia é a falta absoluta de condições do governo de investir no que realmente importa, como saúde, educação e segurança pública. O modelo da máquina estatal brasileira está fadado ao fracasso por torrar seus recursos, empenhando absurdamente mal a arrecadação. Enquanto sucessivos chefes da Nação protelarem a urgente reforma administrativa que, entra gestão, saí gestão, é levada em banho-maria, as chances de mudanças efetivas serão nulas. O pior é que a aversão de investidores ao risco tem levado a uma debandada que agrava ainda mais a situação. Na rota traçada, o crescimento econômico em bases sustentáveis ficou distante e a credibilidade das regras também saiu arranhada. O Brasil não precisava passar por isso. A revisão das metas foi decerto um tiro no pé. Ele deixa claro que não existe efetivamente o interesse numa consolidação fiscal. A dívida pública deve continuar subindo e as projeções da praça não são nada boas. Erodir a credibilidade do regime da LDO é demonstrar falta de comprometimento com a boa gestão. Ao invés de mudar a meta, o governo deveria ter tentado uma melhor adequação de seus compromissos. Mas preferiu o atalho mais fácil e temerário. Sobrou para o ministro Fernando Haddad, que empenhou sua palavra em objetivos não críveis e teve de reconhecer, tardiamente, que a estratégia de arrumação da casa era uma utopia, promessa vazia politiqueira, sem base concreta. A perdurar o endividamento ascendente pelos próximos anos o colapso do Estado será inevitável. Não haverá arrecadação que dê conta. De uma forma ou de outra, essa revisão de meta demonstra cabalmente uma espécie de esgotamento da estratégia de ajuste pelo lado das receitas. Sem um compromisso efetivo de corte no aparato da máquina não há saída. E, como disse o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, até mesmo o custo da política monetária (leia-se mais aumento de juros) sem a âncora fiscal, será alto. Tudo de ruim prenuncia-se no horizonte.