Economia

A novela da privatização da Sabesp: sem laudo, Justiça manda parar tudo

Processo de privatização avança no legislativo, mas é suspenso por determinação da Justiça até que se apresente estudos sobre impacto orçamentário

Crédito: Lalo de Almeida

Sabesp: 28 milhões de clientes e valor de mercado de R$ 39,1 bilhões (Crédito: Lalo de Almeida)

Por Jaqueline Mendes

Maior empresa de saneamento do País, a Sabesp voltou ao centro da disputa entre o legislativo paulista, o governo do Estado e a Justiça nos últimos dias – e deixou mais distante, ao menos por enquanto, a ambição do governador Tarcísio de Freitas de usar a desestatização da companhia como trunfo de sua gestão em ano de eleições municipais.

Depois de o processo avançar na primeira audiência pública na Câmara de São Paulo, a Justiça mandou parar tudo. A juíza Celina Kiyomi Toyoshima, da 4ª Vara de Fazenda Pública da Justiça de São Paulo, determinou na quarta-feira (24) a suspensão da segunda votação na Câmara do projeto de lei que prevê a adesão da capital paulista à privatização da Sabesp, até que seja feito um laudo de impacto orçamentário.

“O estudo de impacto orçamentário deve ser apresentado para qualificar o debate e a participação das pessoas na discussão do projeto de lei, já que se um aumento súbito nas contas acontecer, quem sentirá mais será a população vulnerável”, disse a juíza.

O projeto de lei foi aprovado em primeira votação na quarta-feira (17) pelo placar de 36 votos favoráveis e 18 contrários. A sessão ocorreu em meio a manifestações na galeria e discussão entre vereadores. O texto ainda precisa passar por uma segunda votação em plenário. O texto aprovado contém mudanças na lei municipal para permitir que a capital mantenha o contrato de fornecimento com a empresa, mesmo depois da venda.

A mesma votação terá de ser feita em quase todos os 375 municípios paulistas em que a empresa atua, o que pode levar mais de um ano. “A gente vem discutindo plano de investimento para cada um, porque a adesão dos municípios é voluntária. Estamos tentando mostrar para cada um a vantajosidade, os investimentos que serão feitos nos próximos anos, como vai ficar para o cidadão daquele município, para que eles possam ter clareza”, afirmou o governador de São Paulo.

(Bruno Escolastico Sousa Silva)

“A adesão dos municípios é voluntária. Estamos tentando mostrar para cada um a vantajosidade e os investimentos que serão feitos.”
Tarcísio de Freitas governador de São Paulo

A Sabesp é a segunda maior companhia de saneamento da América Latina.

Atualmente, metade das ações da empresa está sob controle privado, sendo que parte é negociada na bolsa de valores B3 e parte na Bolsa de Valores de Nova York, nos Estados Unidos.

Com capital misto, o governo do Estado detém 50,3% das ações. O projeto prevê a venda da maior parte dessas ações, com o governo mantendo poder de veto em algumas decisões.

Em 2022, a empresa registrou lucro de R$ 3,1 bilhões. Desse total, 25% foram revertidos como dividendos aos acionistas, R$ 741,3 milhões e R$ 5,4 bilhões, destinados a investimentos. Com 28 milhões de clientes, o valor de mercado da empresa chegou a R$ 39,1 bilhões.

A suspensão temporária do tramite de privatização foi comemorada pela ala sindical. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) tem liderado o movimento de resistência à privatização sob argumento de que trata-se de um serviço público essencial e um direito humano universal, que é a água.

O plano, no entanto, é que a Sabesp invista R$ 68 bilhões na universalização dos serviços de água e esgoto. Condição será atingida quando 99% dos paulistas tiverem acesso à água e 90% tiverem acesso a coleta de esgoto. O estado pretendia atingir o objetivo até 2033, mas o prazo será antecipado para 2029 com a privatização.

A privatização tem atraído grandes grupos de investidores, inclusive o ex-ministro da Economia Paulo Guedes. A participação de Guedes deve ocorrer por meio da gestora de fundos de investimento Yvy Capital, que tem como sócios ele, Gustavo Montezano, ex-presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), o ex-diretor geral da OMC (Organização Mundial de Comércio), Roberto Azevedo, o ex-Bank of America no Brasil, Rodrigo Xavier, e o ex-diretor de privatizações do BNDES, Fábio Abrahão.

Liderados por movimentos sindicais, paulistas protestam contra a proposta de privatização da empresa de saneamento. Muitos temem aumento das tarifas e queda na qualidade do serviços, como ocorre com a Enel (Crédito:Rafael Magalhaes)

A gestora teria fechado acordo com a Aegea Saneamento para participar de um consórcio que disputará a compra de parte da Sabesp. O acordo com a Aegea, segundo a coluna, é destravar capital nacional e internacional para projetos voltados à economia de baixo carbono.

Além disso, a Aegea é líder de investimentos privados em saneamento no País com 56% de market share e planeja comprar metade dos 30% que a Sabesp pretende colocar à disposição do mercado.