Jovens, baixa renda e insatisfeitos atraem fintechs brasileiras ao México
Consolidados no Brasil, Mercado Pago, Nubank e Bradesco voam rumo ao segundo maior mercado da América Latina para expandir seus negócios
Por Letícia Franco
O México é o país mais visitado da América Latina, segundo dados da Organização Mundial do Turismo (OMT). Todo mundo quer ir para o México – e não só para passear. O país também é o destino de fintechs do mundo todo, que buscam fincar suas bandeiras no segundo maior mercado para o setor na região. Se na hora de escolher o destino de uma viagem, a cultura, a gastronomia e as belezas naturais são fatores decisivos, para as fintechs, o investimento no México é motivado pela economia estável, tamanho do mercado e sistema regulatório.
O ecossistema já soma cerca de mil empresas, sendo 217 estrangeiras de mais de 22 países, segundo levantamento da Finnovista. No pódio mexicano, velhas conhecidas do mercado brasileiro: Mercado Pago e Nubank.
O mais recente aporte foi do Nubank. O banco digital, que desembarcou em solo mexicano em 2019, anunciou no último mês um aumento de US$ 100 milhões na capitalização patrimonial da Nu México, elevando seu investimento no país para mais de US$ 1,4 bilhão. Em comunicado no dia 16 de abril, Iván Canales, diretor geral do Nu México, afirmou que isso reflete a estratégia da holding, que definiu o local como mercado prioritário para a empresa em 2020. “Nosso objetivo é apoiar a expansão da carteira e fortalecer nossa presença em todos os segmentos do mercado financeiro mexicano”, disse o executivo.
“Trata-se de um mercado cheio de oportunidades de desenvolvimento para a bancarização.”
Pethra Ferraz, Vice-presidente de Marketing do Mercado Pago para a América Latina
O investimento do Nubank não é um movimento isolado, nem o maior valor.
Líder do setor, o Mercado Pago, banco digital do Mercado Livre, revelou à DINHEIRO que prevê investir US$ 2,45 bilhões no México somente em 2024, superando em 48% o valor investido no ano anterior.
Lá, a marca contempla desde meios de pagamentos a serviços bancários hospedados em uma conta digital robusta e simplificada. E o montante será destinado para a melhoria de serviços:
• o aumento na concessão de crédito,
• multiplicação das soluções de pagamentos,
• consolidação como aplicativo de serviços financeiros digitais,
• impulsionamento da inclusão e educação financeira, entre outros.
De acordo com o levantamento Bank of America (BofA), a marca lidera a indústria bancária dos neobancos no México, com 6,9 milhões de usuários ativos mensais, seguido pelo Nubank, com 4,4 milhões, e PayPal (3,4 milhões). Atualmente, 15% da população mexicana, ou seja, 19 milhões de pessoas, são usuárias ativas das fintechs.
A fintech do Mercado Livre, que opera no Brasil há mais de 20 anos, aterrissou na terra dos tacos e das tortilhas em 2015. Desde 2022, o investimento da companhia no país gira em torno de US$ 5,77 bilhões. Segundo Pethra Ferraz, vice-presidente de marketing do Mercado Pago para a América Latina, o ecossistema mexicano é favorável para a chegada de concorrentes. “Um mercado com muito potencial com muitas oportunidades de desenvolvimento, de elevar o nível de digitalização e bancarização da população”, afirmou à DINHEIRO.
Diante desse cenário oportuno, outras companhias também fizeram as malas. Uma delas é o Bradesco, que por meio de sua subsidiária Bradescard México, adquiriu a Ictineo Plataforma S.A., uma instituição financeira popular (Sofipo) que atende pessoas físicas no México. A Bradescard tem cerca de 3 milhões de clientes no país, que detêm cartões de redes varejistas. A ideia é oferecer um banco digital a essa base a partir da modernização da Sofipo. A FitBank e Monkey Exchange são outros reforços para o ramo financeiro.
Tanto a forte preferência de fintechs estrangeiras pelo México em suas estratégias de expansão quanto o crescimento do mercado local são fomentados pela necessidade de inclusão financeira em um país onde menos da metade dos 130 milhões de habitantes tem conta bancária.
Para Adrian Kemmer Cernev, professor da FGV EAESP, a inclusão ocorre em três frentes:
• população jovem,
• baixa renda,
• e migração de clientes insatisfeitos com os bancos tradicionais.
“As fintechs vêm transformando o setor financeiro, simplificando o acesso ao crédito e apresentando produtos diferenciados”, disse.
Entre os motivos para a escolha do México como destino estão a necessidade de inclusão financeira dos jovens, pessoas de baixa renda e migração de clientes insatisfeitos
E O BRASIL?
Com cerca de 1,5 mil empresas ativas, segundo a Associação Brasileira de Fintechs (ABFIntechs), o Brasil é, de fato, o maior ecossistema de fintechs na América Latina.
• Pode-se dizer que, apesar do avanço do México, o Brasil está seis anos à frente.
• Um estudo feito pelo Bank of America apontou que cenário mexicano lembra o que era o Brasil em 2018, com os usuários representando uma parcela de 15% da população. Entre 2018 e 2020, as taxas mensais de downloads dos apps de fintechs no Brasil atingiram percentuais entre 90% e 160%. Já o México não apresenta esse ritmo acelerado, com avanço entre 10% e 30% ao ano.
• Mesmo com as diferenças, a escolha do México como o mercado da vez é resultado de grandes semelhanças entre os países. Brasil e México são terrenos férteis para as fintechs, pois contam respectivamente com os maiores PIBs da América Latina (US$ 2,1 trilhões e US$ 1,8 trilhão, segundo o Banco Mundial em 2023) e populações (215,3 milhões e 127,5 milhões, segundo o IBGE e o Banco Mundial).
“Apesar de o Brasil ser mais competitivo, os mercados ainda possuem características mais tradicionais”, afirmou o professor da FGV.
Segundo ele, a longo prazo, o mercado mexicano tende a repetir o ocorrido no Brasil: uma ampla oferta seguida da concentração do mercado.
Confirmada essa conjectura, será preciso pensar no próximo destino. Se hoje o México conquista turistas e investimentos de fintechs, assim como o Brasil anos atrás, a Colômbia desponta como o próximo carimbo no passaporte das fintechs, seguindo a mesma lógica: economia estável e necessidade de inclusão financeira.