Teremos mais um Kennedy na Casa Branca?
Por Norberto Zaiet
Apesar da cobertura midiática, ainda se fala pouco sobre as eleições de novembro. O final do ano ainda parece um horizonte bastante distante para um mercado neuroticamente preocupado com os indicadores macroeconômicos divulgados diariamente. Esta eleição, no entanto, tem o potencial de fazer preço para muitos ativos. Está em jogo não somente o comando da Casa Branca, mas a totalidade da Câmara dos Deputados (435 congressistas) e um terço dos cem senadores. Com o país dividido e maiorias apertadas tanto na Câmara quanto no Senado, todas as vagas serão disputadas agressivamente.
A eleição presidencial em si, apesar de não parecer, pode trazer surpresas. Donald Trump tem a liderança nas pesquisas contra Joe Biden, e a cada pesquisa sua vantagem tem aumentado. Considerando somente esses dois candidatos, os levantamentos mais recentes indicam Trump ganhando, com 48% dos votos contra 43% de Biden. Correndo por fora está Robert Kennedy Jr., filho de Bobby Kennedy e sobrinho de JFK. Num cenário com os três na disputa, Trump tem 44%, Biden 38% e Kennedy 12%.
Do ponto de vista do mercado, Trump não assusta. Pelo contrário: o mercado avalia sua atuação na economia de maneira positiva, enquanto Biden é visto como um presidente hostil. Ao longo dos últimos anos, Biden acumula um histórico antagônico ao ambiente de negócios: participa de piquetes com líderes sindicais na porta de montadoras de automóveis, age contra o setor de energia e mantém um FTC (Federal Trade Commission, o CADE americano) em pé de guerra com as grandes corporações americanas. Uma reeleição pode reforçar essa atuação.
Do ponto de vista fiscal, os dois candidatos principais preocupam, pois ambos gostam de usar e abusar do orçamento federal. Como o dólar é a referência para todos os ativos, os EUA tem a vantagem de contar com certa leniência dos agentes de mercado em relação a uma política fiscal frouxa. Parece, porém, que a classe política começa a perceber que a conta desse gasto excessivo financiado com dívida vem em forma de aumento de preços – e aumento nos preços não elege nem reelege ninguém.
O que não está na conta é Kennedy. Sem qualquer esforço, ele já surge com 12% dos votos na pesquisa graças apenas ao seu sobrenome. Pouco se sabe sobre o que ele pensa em relação aos mercados e a economia em geral, mas o que se pode ler até aqui sugere um eventual “Presidente Kennedy” bastante diferente de Trump e Biden. Kennedy tem ojeriza ao Deep State – o chamado “Estado Oculto”, em referência à falta de transparência do governo. Acredita que os burocratas dominam a Casa Branca independente de quem for o presidente, e crê de maneira clara que a morte do seu pai e do seu tio foram arquitetadas e executadas pela CIA e pelo FBI. É um sujeito de opiniões fortes e fora do consenso, e que pode chacoalhar bastante as estruturas de poder.
Com o país dividido e boa parte do eleitorado com ânsia de escutar algo novo, sua retórica pode ser bem recebida por partes relevantes do eleitorado. Ainda mais quando lembramos que sua candidata a vice-presidente será Nicole Shanahan, ex-mulher de Sergey Brin, bilionário e fundador do Google. Isso certamente ajudará a abrir as portas das Big Tech na hora de buscar doações.
Nada de errado com novidades, mas o mercado não gosta de incertezas. Biden e Trump são conhecidos; Kennedy, não. O potencial de surpresas pode vir daí, e nada disso está no preço dos ativos.
Como regra geral, o mercado não liga muito para os políticos – até o momento em que a política passa a atrapalhar. O mercado gosta da Casa Branca comandada por um partido e o Congresso comandado por outro, pois assim o potencial de incertezas diminui, dado que um bloqueia a agenda do outro.
No momento, a política atrapalha muito pouco e a eleição ainda não está no radar. Vamos aguardar o que os próximos meses nos reservam.
Norberto Zaiet é economista, ex-CEO do Banco Pine e fundador da Picea Value Investors, em Nova York