Chuva no Sul, tempestade em Brasília
Por Marcos Strecker, Diretor de Núcleo
Foi uma tragédia anunciada. Não a catástrofe climática no Rio Grande do Sul, mas a turbulência política na maior empresa brasileira. A demissão de Jean Paul Prates na Petrobras já era esperada há meses, e sua cabeça era pedida por nove entre dez petistas. Apesar de também pertencer ao partido, Prates era o maior defensor de uma visão “pró-mercado” na estatal, na contramão do desejo do presidente Lula e de seus principais auxiliares de usar a petroleira para promover políticas públicas e dar uma mãozinha nas contas do governo.
Já há uma intervenção disfarçada nos preços dos combustíveis, que estão defasados em relação aos valores praticados no exterior, ainda que esse controle esteja muito longe do tabelamento praticado na gestão Dilma Rousseff. O governo já anunciou que voltará a investir nas refinarias que viraram sinônimo de escândalo na década passada (e levaram a companhia a ocupar a posição de mais endividada do planeta). Além disso, insiste em colocar na gestão de estatais políticos e companheiros. É evidente que há uma sensação de “déjà vu” no terceiro mandato de Lula, no pior sentido da expressão. A reação imediata na Bolsa, com as ações da Petrobras despencando, é o prenúncio de ainda mais mau humor entre investidores.
E isso aconteceu mesmo após Fernando Haddad ter botado água na fervura da crise que vinha consumindo ministros palacianos e Prates nos últimos meses. O ministro da Fazenda colocou um representante seu no Conselho da Petrobras e abriu caminho para um pagamento parcial de dividendos extras nas últimas semanas, o que acalmou acionistas e apontava para uma gestão mais profissionalizada na companhia. Os próximos dias mostrarão se Haddad ainda manterá influência sobre os rumos da petroleira, ou se os ministros Rui Costa (Casa Civil) e Alexandre Silveira (Minas e Energia) definitivamente mudarão a sua administração. No fundo, o resultado dessa briga antecipa de certa forma o próprio destino de Haddad, que também enfrenta fogo amigo por defender a responsabilidade com as contas públicas. Seu Arcabouço Fiscal está fragilizado, e muitos especialistas acham que é uma questão de tempo para também essa política, que nunca esteve na agenda do PT, naufragar.
Lula adiou esse desfecho por causa da queda na sua popularidade registrada pelos principais institutos de pesquisa. Tem mostrado irritação com seus ministros, além de cobrar publicamente resultados. Aparentemente essa sangria na percepção pública sobre o presidente foi estancada, e os últimos índices mostram estabilidade, o que não significa exatamente uma boa notícia para o Planalto. A economia sem dúvida é uma das âncoras da atual gestão, e uma mudança de rumo em uma das áreas que estava sustentando o governo pode antecipar problemas para o mandatário — e para o País.
Atualmente, há nuvens em formação sobre o prédio do Banco Central. O presidente da instituição, Roberto Campos Neto, deixará seu posto até o final do ano. Ele é o principal defensor da política de juros altos, que tem garantido a inflação controlada. Lula quer derrubar a Selic e acelerar a economia, diminuindo a cautela com a inflação. Essa política já levou a um desastre de proporções catastróficas na última década. Será que os economistas e seus alertas serão ignorados também nesse caso, assim como os ambientalistas que previram o desastre no Sul?