A política de economia circular já passou pelo senado, mas o maior desafio está nas ações
Por Beatriz Luz
O Senado aprovou, em março, o Projeto de Lei 1.874/2022, que determina a criação da Política Nacional de Economia Circular (PNEC). O texto, que será analisado na Câmara dos Deputados, prevê um direcionamento para um novo modelo econômico no País, que vai além do uso eficiente dos recursos e prioriza o redesign dos produtos, com foco na durabilidade, modularidade, reparo e reuso. Mas qual a importância dessa política e por que devemos nos atentar a ela?
O primeiro objetivo de uma política pública é servir como ferramenta de conhecimento e educação. É um instrumento essencial de transformação da sociedade, instituindo novas regras e valores, garantindo direitos e removendo barreiras. A aprovação da PNEC serve como um guia para as lideranças empresariais, que serão incentivadas a redefinir as cadeias produtivas e reavaliar modelos de negócios, responsabilidades e relações comerciais. Uma nova proposta de investimento e retorno se torna prioritária, a fim de garantir a circulação contínua de materiais em todas as regiões do Brasil.
Outro ponto importante é a criação de um arcabouço mais favorável para a tomada de decisão, fator determinante para a elaboração de linhas de fomento dedicadas ao tema. Novos instrumentos financeiros, como os do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), precisam ser guiados por estratégias nacionais e, assim, contribuírem para reduzir o risco do investimento privado e acelerar a transição.
O Projeto de Lei detalha os princípios da circularidade com abrangência e com propostas de valor para estimular ações além da reciclagem e da gestão de resíduos, e incluir regeneração, novo design para produtos, direito de reparo e opções de remanufatura. Também reitera a necessidade de integração dos diferentes elos da cadeia produtiva para termos soluções em escala, apresentando a importância do olhar sistêmico e a necessidade de engajamento entre indústria, governo e sociedade civil.
Entre as principais entregas, a política promete a criação do Fórum Nacional de Economia Circular, que reunirá os ministros do Meio Ambiente; da Ciência, Tecnologia e Inovação; da Fazenda; e do Desenvolvimento Regional, além de representantes do setor privado. Esta é uma iniciativa importante para a elaboração de planos de ação nacionais e para estimular estados e municípios a criarem instâncias similares. A pergunta que fica é se temos, nos governos locais, as habilidades e os recursos necessários para tal.
O maior gargalo é o entendimento de “como fazer” e de quem vai pagar a conta — um desafio não só do Brasil, mas de diversos países. No texto, o Mecanismo de Transição Justa aparece como ferramenta para auxiliar a indústria na implementação das soluções, mas há poucas informações sobre os requisitos necessários para acessá-lo.
A PNEC reitera ainda a necessidade de campanhas de comunicação voltadas à população e de ações que promovam capacitação, para gerar empregos mais qualificados e com novas habilidades. Neste caso, o Mecanismo de Transição Justa deve dar suporte a iniciativas que promovam novas oportunidades de trabalho.
A rapidez no processo de aprovação da nova política indica que a urgência de agir pelo planeta está sendo compreendida em diversas esferas. Como comparação, a tramitação da Política Nacional de Resíduos Sólidos demorou cerca de 20 anos, enquanto o ciclo de apresentação e aprovação da PNEC está previsto para ser finalizado em menos de 1 ano, o que mostra a relevância na vida dos brasileiros e no mercado global.
É imprescindível irmos além das diretrizes apresentadas. Planos de ação precisam ser elaborados de forma colaborativa e multisetorial, instrumentos para mobilizar a indústria devem ser instituídos e estratégias de financiamento precisam ser definidas, considerando um olhar sistêmico. Mas o documento por si só representa um indicativo de que estamos no caminho certo e é, definitivamente, um marco estratégico de posicionamento do Brasil no contexto global.
Beatriz Luz é fundadora e diretora da Exchange 4 Change Brasil e do Hub de Economia Circular Brasil