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A armadura das despesas obrigatórias

Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Carlos José Marques: "Os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet, estão quebrando a cabeça para fazer surgir alternativas de receitas, quase como mágicos no picadeiro" (Crédito: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Por Carlos José Marques

Há hoje no País uma discussão que não pode ser mais adiada: as despesas obrigatórias. Já há algum tempo, elas vêm engessando qualquer possibilidade de movimento do governo e, por tabela, de gestão adequada da economia. Os recursos, mesmo quando não vinculados, estão diretamente comprometidos com dívidas ou emendas. Há pouca margem de manobra, para não dizer nenhuma. Os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet, estão quebrando a cabeça para fazer surgir alternativas de receitas, quase como mágicos no picadeiro. Não tem de onde tirar tanto coelho da cartola diante, especialmente, de imprevistos como a tragédia do Rio Grande do Sul, que eleva os orçamentos federal, estadual e municipal para outro patamar de compromissos. E nem poderia ser diferente. A emergência social impõe a prioridade. Mas tirar recursos de onde quando eles estão completamente comprometidos ou vinculados?

Ninguém efetivamente quer perder sua fatia no bolo ou pagar mais impostos para ratear as demandas naturais da Nação, muito embora todos venham ao púlpito para gritar a favor do socorro financeiro emergencial aos irmãos gaúchos combalidos. No atual estágio de necessidades, decerto as despesas obrigatórias anularam espaços para gastos extras e devem aprofundar o déficit público. Não há mais margem alguma para gerir a máquina. O mercado cobra disciplina fiscal, mas não considera as circunstâncias, e não há mais de onde tirar sem flexibilizar metas. A capacidade de investimento, por exemplo, no atual momento, está quase que estrangulada por completo. E a culpa é de quem?

Em meio à rolagem de dívidas crescentes, os juros vão aprofundando o rombo. No efeito bola de neve, a taxa dos títulos públicos vai às alturas. Em uma década, nessa toada, a dívida já saltou impressionantes 23%, alcançando quase 80% do PIB em março último. Em outras palavras, é como se tudo o que o País produzisse servisse apenas para cobrir os gastos. Se fosse uma família, o Brasil estaria muito perto da insolvência contábil. E a razão para tamanho dispêndio vem principalmente das despesas obrigatórias que, no caso brasileiro, estão entre as maiores do mundo. Não é para menos. A reforma administrativa até hoje segue como uma quimera e as contas com o funcionalismo público não param de crescer. O sistema previdenciário é um outro ralo escoadouro de dinheiro e, mesmo após a última reforma, segue impagável dado o avanço geométrico dos aposentados em uma Nação que vem envelhecendo rapidamente. Saúde e Educação são outros dois focos concentradores de verbas que, em contrapartida, não oferecem a qualidade e padrão desejáveis. Some a tudo isso Bolsa Família, incentivos sociais e empresariais de toda ordem, a equação não fecha.

O debate sobre como guiar a peça orçamentária se torna premente diante de tantos desafios. Quais as escolhas que os cidadãos acham correto fazer? Para onde deve ser orientado o dinheiro que sai do seu, do meu, do nosso bolso? Despesas obrigatórias precisam estar dentro do horizonte de concordância da maioria. Atualmente, 90% do que entra no caixa da União já tem destinação específica e dirigida. Não dá para se mexer nessa armadura. Os ministros Haddad e Tebet estão tendo de gerir o mínimo de recursos para o máximo de necessidades e nessa toada do cobertor curto acaba faltando para todo mundo.