Uber quer crescer no Brasil, mas esbarra na demora da regulamentação trabalhista
Há uma década no Brasil, a plataforma de transporte por aplicativo se tornou sinônimo do setor ao mesmo tempo que protagoniza impasses trabalhistas
Por Letícia Franco
Desde a Revolução Industrial, toda empresa que quebra um paradigma marca o seu tempo. É o caso da Uber, que ao solucionar um problema de mobilidade urbana com uma alternativa de transporte mais acessível, aliando tecnologia e preços mais baixos que o tradicional táxi, também se transformou em sinônimo da maior mudança nas relações de trabalho das últimas décadas. Em evento para comemorar os 10 anos das operações da norte-americana no Brasil, que chegou às vésperas da Copa do Mundo de 2014, a empresa registrou grandes feitos ao longo dos anos, entre eles o fato de ter sido fonte de renda para 5 milhões de pessoas no País. Se é um de seus maiores triunfos, também consiste em um dos principais dilemas: conduzir a relação de trabalho dos motoristas parceiros que nos últimos anos se tornou alvo de ações judiciais e tentativas de regulamentação por parte do governo.
Essa relação de trabalho informal, que ficou popularmente conhecida como “uberização”, não é a principal disputa que a companhia trava em território brasileiro. Logo no início da sua jornada, enfrentou a animosidade com os taxistas e ficou à margem da legislação. Em São Paulo, o aplicativo foi alvo de uma liminar que proibia seu uso, mas ela foi logo derrubada. No entanto, conforme o serviço era oferecido, a Uber ganhou espaço e se consolidou no mercado. “Hoje, operamos em todas as capitais e mais de 500 cidades. Já transportamos 125 milhões de passageiros”, afirmou Silvia Penna, diretora-geral da Uber no Brasil.
Superado esse primeiro obstáculo, a empresa precisou lidar com as tensões com os próprios motoristas cadastrados na plataforma. Em 2017, a Justiça julgou pela primeira vez o vínculo empregatício entre o motorista e a Uber. Na prática, era um processo para tentar estabelecer diretrizes na relação de trabalho. A empresa saiu vitoriosa.
Segundo Olivia Pasqualeto, professora de direito do trabalho e previdência da FGV, trata-se de um período turbulento, com pouca resolução. Foram mais de 100 projetos de lei, com as mais distintas abordagens sobre o tema e de todas as esferas de poder. “As incertezas que permeiam até hoje são, em parte, resultados da complexidade da atuação da plataforma.”
O vínculo não é negociado quando o motorista se torna parceiro, porém, o aplicativo é controlado por uma empresa, o que pode gerar uma interpretação de relação de trabalho.
PRÓXIMA PARADA
No ano em que completa uma década no Brasil, uma nova rota começa a ser percorrida pela Uber. Após meses de negociação e adiamentos, o governo do presidente Lula enviou ao Congresso, em março, um projeto de lei que estabelece uma nova categoria de vínculo empregatício: trabalhador autônomo por plataforma, com direitos como limite de jornada de trabalho, remuneração por hora e contribuição previdenciária.
O projeto que aguarda discussão do Congresso foi elaborado a partir de discussões entre governo, trabalhadores e empresas, como a própria Uber. De acordo com especialista da FGV, se aprovado, as plataformas terão de desenvolver mecanismos para atender às exigências. Mas, diante da proposta atual, o desfecho tende a ser ainda favorável para as empresas do setor. “Foi um meio-termo para dar continuidade a uma atividade que gera renda para milhões de brasileiros”, afirmou Pasqualeto.
5 milhões
de pessoas já utilizaram a plataforma como fonte de renda
125 milhões
É o número de passageiros atendidos durante uma década de operação no país
500 de cidades
onde a Uber atua. Com Presença em todas as capitais
A rota planejada pela Uber envolve a expansão de serviços no País, que vão desde mais parcerias com taxistas até soluções de saúde e uma categoria de carros híbridos e elétricos, segundo Dara Khosrowshahi, CEO global da plataforma. Além do investimento de R$ 1 bilhão nos próximos cinco anos para o Tech Center da companhia em São Paulo.
Porém, os novos trajetos da companhia em um de seus maiores mercados dependem das resoluções trabalhistas. Assim como transformou todo setor com a sua chegada, a Uber também pode fazer parte de um novo marco das relações de trabalho do século XXI.