Carta do investidor estrangeiro ao presidente Lula
Por Norberto Zaiet
Caro presidente, esperamos que esteja bem. Fazia tempo que não o víamos. A última vez que prestamos atenção a uma fala sua foi logo após a confirmação da sua eleição: ouvimos atentamente a um discurso em cima de um carro de som na Avenida Paulista. O senhor agradeceu a Deus e ao povo brasileiro, e entre muitas coisas ouvimos: ‘O meu governo será montado com a cara da minha vitória, com os partidos que participaram, com gente da sociedade que pode contribuir’. Ficamos empolgados, afinal sua eleição havia congregado muita gente que, de fato, poderia contribuir.
Vieram-nos as lembranças dos seus primeiros governos. Superávit primário, Banco Central autônomo, inflação sob controle, crescimento de crédito e consumo, Pré-Sal, reservas internacionais, grau de investimento. Bons tempos.
Quando da sua eleição para o terceiro mandato, a lógica de quem acompanhava de longe foi pensar que o senhor iria, mais uma vez, conduzir a convergência do Brasil ao grau de investimento. O pessoal local, sempre mais cético, não acreditava. À medida que o senhor apontava a equipe que conduziria vários aspectos do seu governo, percebia-se que ela não tinha a cara da sua vitória, mas sim a cara do seu partido. Pelo menos até agora, infelizmente, o investidor local esteve certo.
Presidente, tem muita coisa boa acontecendo no Brasil. A balança comercial é positiva e crescente, o agro brasileiro é exemplo para o mundo, o setor financeiro é solido e eficiente, o mercado interno é grande e pujante, a base energética é verde e limpa, e a democracia, apesar de jovem, vem mostrando que não leva desaforo para casa.
“Hoje em dia aqui ninguém fala em Brasil. Está fora do radar. Só se fala em Nvidia, Microsoft, Apple, Google, Amazon. Quando alguém levanta a mão para falar de mercados emergentes, os nomes que aparecem são chineses e indianos”
O estrago que veio depois dos seus dois mandatos iniciais foi muito grande, presidente. Consertar envolve sacrifício, vai precisar cortar aqui e ali, sim. Não tem jeito. Mas o benefício será imenso. Se começar a arrumar a casa, o Brasil vai perceber o efeito positivo da Balança no câmbio. Pode acreditar, o real vai se valorizar e, com isso, a inflação vai ficar quieta no canto dela. O Banco Central, qualquer que seja e com quem seja, vai cortar juros com tranquilidade: o mercado vai forçar a queda.
Nós, aqui de fora, iríamos começar a olhar de novo para o Brasil. É, presidente, hoje em dia aqui ninguém fala em Brasil. Está completamente fora do radar. Tem tanta coisa nova acontecendo em Inteligência Artificial – e as empresas americanas estão indo tão bem – que fica difícil olhar para fora, ainda mais para um País que não parece estar no caminho da convergência.
Aqui fora só se fala em Nvidia, Microsoft, Apple, Google, Amazon. Quando alguém levanta a mão para falar de mercados emergentes, os nomes que aparecem são chineses e indianos. China e Índia, presidente, veja o senhor. Quando o primeiro-ministro indiano vem a Washington, fazem jantar de Estado para ele na Casa Branca e os presidentes de todas estas empresas se estapeiam para participar.
Presidente, o investidor estrangeiro adora histórias novas. A sua eleição foi uma história nova que ficou velha muito rápido. O presidente Lula pragmático, que muitas vezes precisou deixar o partido de lado – para falar com outra voz quando estava fora do palanque – seria uma história nova e, sem dúvida, muito bem recebida por aqui.
Caso isso não aconteça, vamos esperar 2026. Está quase aí. Nesse meio tempo, tem muita novidade aparecendo por aqui todos os dias. Presidente, infelizmente o mercado não costuma dar trégua para quem não faz a lição de casa: segue piorando todo dia. Para quem faz, entretanto, a recompensa sempre vale o sacrifício.
Norberto Zaiet é economista, ex-CEO do Banco Pine e fundador da Picea Value Investors, em Nova York