Inflação: especialistas mantêm otimismo, mesmo com alertas distintos; confira
IPCA de junho aponta desaceleração do índice e mantém as projeções dentro da meta, no entanto, economistas acreditam que o Banco Central só deve retomar o ciclo de cortes na taxa Selic em 2025
Por Paula Cristina
Como sinalizado nas últimas atas do Comitê de Política Econômica, o comportamento da inflação nos próximos meses parece ser a peça-chave para avaliar o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil. Apesar de alguns pontos de atenção no cenário futuro, como o aumento na tarifa de energia elétrica e dos combustíveis, por ora, os sinais são bons. Em junho, a inflação somou 0,21%, menos da metade da verificada em maio (0,46%) e abaixo das estimativas de analistas e corretoras. Com o resultado, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial, e é coletado pelo IBGE, reporta alta acumulada de 2,48% no ano de 2024 e 4,23% no acumulado de 12 meses.
Sozinho, tal resultado daria motivos para comemorar. Foi a menor inflação para o primeiro semestre desde 2020 e figura entre as três menores da década. Ainda que pressão dos grupos de saúde (+0,54%) e alimentos (+0,44%) tenham impedido uma deflação, o equilíbrio no setor de serviços e a deflação de 0,19% dos transportes sustentaram o respiro aliviado da equipe econômica. “O problema é que os efeitos das falas do presidente Lula, a recomposição dos preços indexados em dólar e os efeitos da alta dos planos de saúde só serão sentidos nas próximas leituras”, afirmou Gerson Casarin, professor de finanças da Universidade de São Paulo (USP) e ex-gerente de pesquisas de preços do IBGE.
Os alertas para os próximos meses são distintos.
• O reajuste no preço do combustível e no gás de cozinha anunciado pela Petrobras na segunda-feira (8) deve gerar um impacto entre 0,16 e 0,21 ponto percentual nas próximas leituras do IPCA.
• A petroleira informou que o preço do litro da gasolina deverá subir em R$ 0,20 para as distribuidoras, enquanto o botijão de 13 kg de GLP deverá ser elevado, em média, em R$ 3,20.
Para a estrategista de inflação da Warren Investimentos, Andréa Ângelo, isso significa que, para o final do ano, a estimativa do indicador passa de 4,10% para 4,28%. Ela calcula que o reajuste na gasolina representa impacto de alta de pelo menos 0,13 ponto percentual, dos quais 0,09 deverão aparecer já na leitura de julho do IPCA. Já o reajuste do GLP deverá impactar positivamente o índice em 0,05 ponto, segundo ela.
• Ainda houve o aumento da tarifa de energia elétrica, que passou em julho para a bandeira amarela. O aumento será de R$ 1,885 a cada 100 kW/h nas tarifas dos consumidores. A mudança ocorre em razão da previsão de falta de chuvas, o que dificulta a geração de energia no Brasil, segundo a Aneel. Em junho, alguns destes sintomas já foram vistos.
• Dentro do setor de habitação, por exemplo, o custo da energia elétrica subiu 0,3%, acima da média do IPCA e representando 0,10 p.p de contribuição no resultado final da inflação.
De acordo com André Almeida, gerente da pesquisa do IPCA do IBGE, a elevação nas tarifas de energia da população brasileira foi influenciada, sobretudo, pelo reajuste tarifário de 6,76% aplicado em Belo Horizonte (MG) pela Cemig no dia 28 de maio. Em 2023, a tarifa de energia elétrica residencial acumulou aumento de 9,52% no Brasil. A alta superou a inflação do País, que encerrou o ano em 4,72%, segundo o IBGE.
OTIMISMO CAUTELOSO
Alexandre Maluf, economista da XP, vê uma dinâmica melhor na inflação corrente, mas que não resolve os riscos no médio prazo. “Claro que, quando o IPCA vem abaixo do piso das expectativas, é para se animar. É uma boa leitura, mas no geral não muda muito a cabeça da política monetária”, pondera. Para o especialista, o resultado ainda é pouco para mudar a visão do Copom sobre a Selic, sendo necessária uma continuidade da redução e, principalmente, os sinais de controle de gastos na economia doméstica. “O curto prazo segue relativamente benigno, mas o médio prazo continua desafiador, diante do atual patamar de câmbio e as expectativas de inflação.”
Sobre um ciclo mais virtuoso, o economista sênior do Inter, André Valério, afirma que a redução do estresse sobre o comportamento da curva de juros ajuda a acomodar as expectativas do mercado. “Além disso, a perspectiva de início do ciclo de cortes nos juros americanos em setembro contribuirá para esse cenário.”
A perspectiva, segundo ele, é que haja condições para o Banco Central manter a Selic inalterada em 10,50% até o fim do ano, mas com a eventual retomada do ciclo de cortes podendo ocorrer no primeiro trimestre de 2025. Para que se confirme o cenário positivo, e todos os especialistas são unânimes sobre isso, é preciso contar com um elemento muito mais emocional que a racionalidade da matemática exige: que o presidente Lula evite colocar lenha na fogueira.