Como será a economia com Kamala ou Trump? Analistas opinam
A entrada de Kamala Harris na corrida presidencial deu um novo fôlego para o Partido Democrata e acirrou a disputa contra Donald Trump, mas os EUA e o mundo querem saber quais são os planos da nova candidata para a economia
Por Allan Ravagnani
Kamala Devi Harris, de 59 anos, a atual vice-presidente dos Estados Unidos, será a rival de Donald Trump na eleição de 5 de novembro para a Presidência do país. Seu nome virou consenso no Partido Democrata após a desistência de Joe Biden, no último domingo (21). A campanha real já começou, mas a formalização da candidatura só acontecerá na convenção do partido, no período de 19 a 22 de agosto, em Chicago.
Endossada por Biden em sua carta de desistência, Harris deu novo ânimo aos democratas e seus apoiadores. Em apenas três dias, sua campanha já arrecadou mais de US$ 100 milhões (R$ 559 milhões) em doações. Pesquisa da Ipsos divulgada no dia 22 já aponta empate técnico com Trump. As bolsas mundo afora fecharam a segunda-feira (22) no positivo, mas o mercado ainda quer saber quais são os planos da ex-promotora e procuradora-geral da Califórnia para o país. Em busca dessas respostas, a DINHEIRO ouviu economistas, profissionais de comércio exterior, de relações internacionais e acadêmicos, que ressaltaram as diferenças de estilo dela e do megaempresário.
ECONOMIA
• Donald Trump já mostrou como opera e Kamala ainda precisa detalhar seus planos, de acordo com o economista Igor Lucena. Ele ponderou que a economia com Trump será focada nos EUA, com uma visão mais protecionista e possivelmente com a imposição de uma tarifa de 60% em todos os produtos chineses, o que levaria ao encarecimento dos itens e um aumento na inflação. “Kamala deve ser mais parecida com Biden, com aumento de gastos públicos e endividamento para impulsionar o PIB”, afirmou.
• Para o professor honorário da Universidade de Oxford e advogado especialista em direito internacional, Daniel Toledo, a tendência dos democratas é de manter os gastos públicos elevados. “Acredito em aumento de benefícios públicos voltados para estudantes, população mais carente e até imigração”, disse. Designada para liderar os esforços relacionados à imigração ilegal, Harris, que é filha de mãe indiana com pai jamaicano, viu um recorde na entrada de pessoas sem documentação pela fronteira com o México.
• Para o economista e professor de relações internacionais da ESPM, Fábio Andrade, nas promessas do próprio Trump, irá ocorrer a maior deportação já vista na história dos EUA. “Durante o governo Trump, vimos crianças sendo presas, criança em cela, criança em jaula. Não tem porquê acreditar que será diferente. Então, existe aí uma diferença significativa entre eles. Ainda que a gente possa querer ver similaridades, as formas são completamente opostas”, completou.
RELAÇÕES INTERNACIONAIS
• No âmbito da política externa, o analista CNPI da Ouro Preto Investimentos, Sidney Lima, acredita que Harris deve ter uma abordagem mais cooperativa e multilateral, possivelmente fortalecendo as parcerias comerciais e ambientais com o Brasil.
• Do lado de Trump, o professor da ESPM acredita que haverá um esvaziamento de diversas organizações internacionais de cooperação, como a OMC, e qualquer outra que exigir reciprocidade dos EUA.
• Desse ponto de vista há uma divisão clara, afirmou Igor Lucena. “Com ela, vai ser a continuidade dos apoios para Israel e Ucrânia e a manutenção da aliança atlântica entre a Europa e os EUA, algo que ficou muito claro e muito positivo desde o começo de Joe Biden, que reverteu a política isolacionista de Donald Trump. Agora, eu não sei o que aconteceria, de fato, com Trump, se ele vai insistir em isolar os EUA, até porque ele mesmo viu que isso não deu certo”, apontou.
AMBIENTAL
• Sobre essa agenda, as candidaturas são extremamente opostas. Gestora pública e mestranda em políticas públicas, Gabi Sabino acredita que Harris deve expandir investimentos em energias renováveis e tecnologias verdes, mantendo o movimento de transição para uma economia sustentável.
• Andrade, da ESPM, lembrou que Trump retirou os EUA do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas e deve reforçar seu negacionismo em ações nesse sentido.
RELAÇÕES COM BRASIL
• Por ter ligações com as questões ambientais, Kamala deve dar apoio significativo nas questões climáticas, segundo Leandro Sobrinho, especialista em investimentos e sócio da Davila Finance. “Ao mesmo tempo, ela deve manter uma relação comercial neutra e estável com o Brasil. Trump vai focar no crescimento americano, e o Brasil, por sua vez, não está na mira de sobretaxação ou protecionismo por ele, pois não é visto como uma ameaça em nenhum segmento. Portanto, a relação tende a permanecer mútua e morna, sem impactos significativos.”
• Para Volnei Eyng, CEO da gestora Multiplike, Harris, sendo mais liberal, defende a maior proteção ambiental, uma agenda que se alinha mais com a do atual governo brasileiro. “A relação entre os países deve continuar amigável, mas não uma aliança, dado que o Brasil é um dos principais destinos dos investimentos chineses em infraestrutura, parte da iniciativa da Nova Rota da Seda de Pequim, vista como um risco à influência americana no continente”, disse.
DÓLAR
• Uma vitória da ex-senadora pode ser vista de forma positiva pelos mercados emergentes, incluindo o Brasil, devido à sua postura sobre comércio internacional e cooperação multilateral, que pode favorecer a estabilidade econômica global, de acordo com André Colares, CEO da Smart House Investments. “O dólar pode estabilizar ou ter uma valorização moderada, considerando a continuidade das políticas econômicas democratas, que tendem a promover a confiança no ambiente político e econômico”, disse.
• Já para Volnei Eyng, um governo Trump, com histórico de protecionismo e contra imigração, pode levar a um mercado de trabalho mais aquecido, inflação mais alta, juros maiores e um dólar mais forte, afirmou.
• O avanço de Harris pode repercutir até no mercado imobiliário brasileiro, segundo o CEO da Swiss Capital, Alex Andrade, especialmente em relação ao dólar. “Com Harris, espera-se uma política econômica menos protecionista, o que pode resultar em uma menor valorização do dólar, que pode influenciar positivamente o mercado imobiliário brasileiro, tornando-o mais acessível para investidores estrangeiros, e reduzindo os custos de importação de materiais”, completou. As cartas estão sendo colocadas na mesa. E o mundo acompanha atento casa jogada.