Negócios

Apagão cibernético joga luz sobre concentração de negócios em tecnologia

Pane digital causa perdas bilionárias a empresas e requer reconfiguração de estratégias do mercado. Qual o tamanho da vulnerabilidade tecnológica?

Crédito: Amarjeet Kumar Singh

A pane provocou atraso de 43 mil voos, além do cancelamento de outros 4,6 mil (Crédito: Amarjeet Kumar Singh)

Por Letícia Franco

Conferir o aplicativo do banco, embarcar em um voo, assistir televisão e passar por consultas médicas são atividades comuns no dia a dia de muitas pessoas ao redor do mundo. De repente, tela azul. Os sistemas dos serviços financeiros e de saúde estão fora do ar, a TV não tem sinal e não dá para fazer check-in on-line ou conferir seu voo no telão do aeroporto. Foi o que aconteceu na sexta-feira (19). E não foi um ataque terrorista, nem uma elaborada ação de hackers. Como um daqueles eventos raros e inesperados que desafiam os modelos de risco, 8,5 milhões de dispositivos com o sistema operacional Windows, da Microsoft, foram afetados depois de uma atualização malfeita do mecanismo de proteção dinâmica chamado Falcon, da empresa de cibersegurança CrowdStrike.

Segundo a companhia, o problema durou um pouco mais de uma hora. Mas foi tempo suficiente para a paralisação e perdas bilionárias de empresas e pessoas mundo afora. As corporações norte-americanas que integram a lista da Fortune 500, exceto a Microsoft, enfrentarão US$ 5,4 bilhões em perdas financeiras decorrentes da falha, afirmou a seguradora Parametrix. É o pior apagão cibernético da história — até aqui, ressalta-se — e deve reconfigurar o mundo dos negócios.

5,4 bilhões de dólares em perdas financeiras decorrentes da falha 
8,5 milhões de dispositivos foram afetados ao redor do mundo

Em 2017, companhias como FedEx e Honda sofreram com o ataque de ransomware WannaCry. Foram mais de 200 mil computadores atingidos em 150 países.

Desta vez, foi muito maior e de uma forma diferente: por erro humano, mais possivelmente. E a busca por soluções para evitar outros estragos do tipo é justamente a tecnologia, que deve ser aprimorada para mitigar os efeitos de eventuais quedas em massa.

“Estamos caminhando a passos largos para uma dependência tecnológica cada vez maior, com evoluções positivas”, disse à DINHEIRO Luis Matos, professor da Faculdade de Informática e Administração Paulista (Fiap). O incidente jogou luz sobre a interconectividade de um amplo ecossistema, que engloba provedores de nuvem, plataformas de software, fornecedores de segurança e clientes. A Microsoft afirmou em comunicado que “é também um lembrete do quão importante é para todos nós, em todo o ecossistema tecnológico, priorizar a operação com implantação segura e recuperação de desastre utilizando os mecanismos que existem”.

Luis Matos, professor da Fiap, (acima) e Claudinei Elias, CEO da Ambipar ESG (abaixo) avaliam dependência tecnológica e como as empresas devem se preparar
(Divulgação)

Compreender a interconectividade do ecossistema é um ponto de partida crucial, mas não é o único aspecto a ser considerado pelas empresas para evitar apagões generalizados.

Fato é que não dá para falar sobre mercado de tecnologia sem levar em conta a sua alta concentração.

Os maiores serviços de computação em nuvem estão nas mãos de duas big techs majoritariamente: a Amazon e a Microsoft.

Os dois principais sistemas operacionais de smartphones pertencem a Google e Apple.

 E o que todas as empresas têm em comum? Suas raízes norte-americanas.

No caso das nuvens públicas, como Microsoft Azure e Amazon Web Service (AMS), elas tendem a crescer ainda mais com a Inteligência Artificial. Para Claudinei Elias, CEO da Ambipar ESG e especialista em cibersegurança, o caminho é segregar os riscos. “É preciso materializar os riscos e os planos de continuidade. Hospedar um ambiente operacional em uma nuvem e a recuperação em outra, pode descentralizar a dependência”, afirmou.

EFEITOS

Globalmente, a pane registrada na sexta-feira (19) provocou atraso de 42 mil voos e os cancelamentos de outros 4,6 mil. As companhias norte-americanas Delta Air Lines e a United Airlines estão entre as mais atingidas.
Assim como os serviços de telecomunicação, saúde e financeiro do país.
No Brasil, sistemas e operações também foram afetados.

Em decorrência disso, foram registrados atrasos em voos da Azul, instabilidade na plataforma de bancos e fintechs, como Bradesco, queda do site do STF, problemas nas distribuidoras de energia elétrica, entre outras celeumas.

Os efeitos no Brasil foram em menor escala devido à capilaridade e ao fuso horário, segundo os especialistas. Era madrugada no País quando a pane aconteceu. O futuro é interconectado. Embora tenhamos otimizações e avanços, essa jornada inclui bugs. Inevitáveis, por vezes. É preciso se preparar para sobreviver.