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A revisão dos instrumentos de longo prazo do Fed

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Vitoria Saddi: "Ao adotar uma abordagem mais flexível e transparente, o Fed pode melhorar sua capacidade de responder às mudanças nas condições econômicas" (Crédito: Divulgação)

Por Vitoria Saddi

A política monetária desempenha um papel crucial na estabilidade econômica de um país. Compreender e adaptar essa política às necessidades contemporâneas é essencial para garantir o crescimento sustentável e a estabilidade financeira. De fato, a cada quatro anos o Federal Reserve faz uma avaliação dos objetivos de longo prazo da sua política monetária, estratégia de comunicação e instrumentos. Foi nesse contexto que em junho passado o Brookings Institute promoveu um debate com acadêmicos e ex-membros do Fed e elaborou um relatório com vistas a oferecer um conjunto robusto de recomendações para a nova revisão que ocorrerá este ano. Meu objetivo é avaliar as principais conclusões do simpósio do Brookings.

A revisão anterior foi em agosto de 2020, quando o Banco Central dos EUA apresentou seu atual quadro de políticas e a inflação estava persistentemente abaixo de 2%. Naquele momento, o objetivo do Fed era evitar a deflação. Em 2020, para neutralizar os efeitos negativos da taxa Fedfunds atingir zero – o chamado “zero lowerbound” (ZLB) –, a autoridade monetária gerou (de modo não intencional) duas assimetrias que estão contidas na sua função de reação atual. A primeira delas é a abordagemdo Fed quanto à meta de inflação, o chamado “FAIT” – Flexible Average Inflation Targeting. Com o FAIT o Fed se compromete a responder mais enfaticamente quando a inflação cai abaixo de 2% através da manutenção da inflação acima de 2% por um certo período. Entretanto, quando a inflação fica acima de 2%, não há tal compromisso. Ou seja, é assimétrico: inflação abaixo de 2% é ruim, e o Fed não irá tolerar por muito tempo. Inflações acima de 2% são consideradas “normais” e toleráveis. A segunda assimetria é a abordagem do Fed no tocante ao nível de emprego. Em 2020, ele estabeleceu que não iria subir juros somente como resposta a um mercado de trabalho aquecido. Antes de 2020, ele subia juros sempre que o desemprego caísse a um nível baixo que pudesse pressionar os preços. Neste sentido, uma recomendação importante do relatório é a reavaliação das funções de reação assimétricas.

O artigo também enfatiza a importância de definir o emprego máximo de forma consistente com a estabilidade de preços. Isso implica que a política de pleno emprego deve ser compatível com a meta de inflação do Fed. Atingir o pleno emprego sem comprometer a estabilidade dos preços é um desafio complexo, mas crucial para a eficácia da política monetária.

Após o Fed conseguir trazer a inflação para a meta, o relatório defende a ideia de reconsiderá-la. A meta de inflação de 2% tem sido um pilar da política monetária, mas o relatório sugere que possa ser necessário revisá-la para garantir a eficácia contínua da política em atingir seus objetivos de longo prazo.

A comunicação eficaz é fundamental para a transparência e credibilidade. O artigo destaca a necessidade de melhorar as estratégias de comunicação da autoridade monetária para garantir que o público e os mercados financeiros compreendam suas políticas e metas. A estratégia de “fowardguidance” teve êxito em evitar a deflação e a economia a ficar estagnada no ZLB. No entanto, a mesma estratégia retardou a alta de juros quando a inflação ficou acima de 2%.

O artigo também sugere a reavaliação da eficácia do “dot plot”. Tal instrumento é uma ferramenta de comunicação usada pelo Fed para mostrar as projeções dos membros do Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC) sobre as taxas de juros. No entanto, a eficácia dessa ferramenta pode ser limitada pois o mercado pode tomar a média de projeções como um “fowardguidance” e subestimar a incerteza inerente às previsões futuras, sobretudo quando há mudanças no horizonte e no “dot plot”.

As recomendações apresentadas no relatório do Brookings visam aprimorar a eficácia da política monetária do Fed. Ao adotar uma abordagem mais flexível e transparente, o Fed pode melhorar sua capacidade de responder às mudanças nas condições econômicas. A necessidade de construir credibilidade para a nova estratégia e respeitar os compromissos das orientações futuras levou a uma menor ênfase na gestão de riscos. Como consequência, o Fed tornou-se menos sensível aos riscos de alta da inflação, atrasando a ação conforme os dados começaram a divergir do cenário predominante assumido.

*VITORIA SADDI é estrategista da SM Futures. Dirigiu a mesa de derivativos do JP Morgan e foi economista-chefe do Roubini Global Economics, Citibank, Salomon Brothers e Queluz Asset, em Londres, Nova York e São Paulo. Também foi professora na California State University, na University of Southern California e no Insper. É PhD em economia pela University of Southern California.