O resfriado dos EUA
Por Carlos José Marques
E mais uma vez ocorre a circunstância que corrobora o corolário: os EUA dão um espirro, o mundo pega um resfriado. A simples suspeita de que a maior economia global poderia entrar em recessão colocou as bolsas do planeta em convulsão nos últimos dias. Foi um “Deus nos acuda”, com o valor dos papéis derretendo e pregões com queda diária de até 10%, como ocorreu no Japão. Era como se uma nova crise de proporções bíblicas estivesse por acontecer. A variável da política de juros americana era o farol a conduzir essa montanha-russa de emoções financeiras, e tanto investidores como corretoras em geral prenderam a respiração à espera de um desfecho que, supunham, seria dramático. Era fogo de palha.
Por mais que a economia na terra do Tio Sam e a variável política das eleições por lá inspirem cuidado e alertas, nada de concreto indica um apocalipse. Ao contrário, bastaram apenas alguns dias a mais para que os receios gerais fossem dissipados e a roleta dos aplicadores voltasse à normalidade. Tóquio se recuperou e, em efeito cascata, as demais bolsas seguiram com o abrandamento das preocupações quanto à saúde da economia americana. Praticamente desde outubro de 1987, em meio a um crash de escala global, as oscilações não tinham sido tão agudas. Com a cabeça fria, analistas e investidores puderam notar que, desta feita, haviam sido embalados numa onda que não passava de marola.
A volatilidade não cessou totalmente, muito embora a recuperação técnica das ações tenha se consumado com a sinalização de subida. Novamente foi o medo que dominou os mercados e, em parte, naturalmente, também a habitual especulação que leva alguns a lucrar muito perante a ansiedade e o temor dos demais. O aprendizado que se tira dessa derrocada geral pré-fabricada é que o planeta das aplicações voláteis não é para todo mundo. Habitá-lo e conviver com as suas variáveis requer sangue-frio e mentalidade calculista. Atenção e serenidade. A resposta da praça certamente foi pesada demais ante os sinais ainda rarefeitos de enfraquecimento da produção americana. Ocorreu uma venda em série e exacerbada dos papéis de companhias dos EUA em um desmonte chamado pelos especialistas de “carry trade”, desencadeando o nervosismo cíclico. Depois, em efeito rebote, as jogadas voltaram atrás com os técnicos lutando para explicar e justificar a extremidade das tensões que levaram ao descarte de títulos.
Em suma, a conclusão predominante foi de que ocorreram vendas forçadas, sem maiores fundamentos. No contrafluxo, ocorreram oportunidades de compra que não foram desperdiçadas pelos tubarões de sempre. Claro, como efeito colateral, o câmbio movido a dólar deu saltos pirotécnicos em escala intercontinental e agravou as perdas de muitos. De uma forma ou de outra, o pânico das bolsas se mostrou exagerado e a correção de rota, inevitável. Foi mais um refluxo passageiro, que vem trazendo estragos. Os EUA não devem entrar em recessão. Pegou, sim, um resfriado, e logo passa. O risco enquanto isso é o mundo dos investidores ficar com pneumonia.