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Não podemos nos iludir com o crescimento do PIB

Imaginem o que seria se a agropecuária, que brilhou nos últimos anos, mas recuou 2,3% no trimestre, tivesse registrado um bom desempenho

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Hugo Cilo: "Para capitalizar esse momento positivo, é essencial que governo e iniciativa privada trabalhem juntos na implementação de reformas estruturais" (Crédito: Divulgação)

Por Hugo Cilo

A máxima de que os números não mentem pode até ser verdade, mas é fato que eles podem não contar toda a história. O anúncio de que o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 1,4% no segundo trimestre de 2024 trouxe um sopro de otimismo ao cenário nacional, mas ainda não é suficiente para convencer de que o País entrou em um ciclo sustentável de expansão. O resultado superou as expectativas do mercado e demonstrou uma resiliência notável da economia brasileira diante de um contexto global incerto – com guerras persistentes na Ucrânia e no Oriente Médio, além da acirrada e imprevisível eleição americana.

Apesar do desempenho promissor da atividade econômica, as empresas brasileiras continuam enfrentando desafios significativos, que precisam ser enfrentados nos próximos anos para garantir um desenvolvimento sustentável a longo prazo.

Um dos principais obstáculos continua sendo a complexidade tributária. O sistema fiscal brasileiro é conhecido por sua burocracia e falta de transparência, o que aumenta os custos operacionais e dificulta o planejamento estratégico das empresas. A reforma tributária, embora esteja a caminho – com todos os seus defeitos e méritos –, ainda não trouxe soluções concretas para simplificar os processos e aliviar a carga sobre o setor produtivo.

A infraestrutura deficiente é outro fator que limita a competitividade. Problemas em rodovias, portos e ferrovias encarecem o transporte de mercadorias e atrasam a logística, afetando diretamente a eficiência das cadeias de suprimentos. Investimentos em infraestrutura são cruciais para melhorar a conectividade e estimular o crescimento econômico em diversas regiões do País.

Em tempos de juros elevados (com risco de alta), o acesso restrito ao crédito continua sendo uma barreira para o crescimento, especialmente para pequenas e médias empresas. As altas taxas de juros e as exigências rigorosas dificultam a obtenção de financiamentos necessários para expansão e inovação, agindo como bolas de ferro nos tornozelos dos empresários. Uma ação mais proativa dos bancos públicos, com fomento a programas de incentivo, poderia facilitar esse acesso e impulsionar o empreendedorismo.

A instabilidade política e econômica, junto à insegurança jurídica, também gera incertezas no ambiente de negócios. Mudanças frequentes nas políticas públicas e na legislação trabalhista criam um cenário imprevisível, desestimulando investimentos de longo prazo. É fundamental que haja um compromisso consistente com a estabilidade regulatória para fortalecer a confiança dos investidores e empresários.

Apesar desses desafios, o crescimento acima do esperado no segundo trimestre demonstra o potencial do mercado interno e a capacidade de adaptação das empresas brasileiras. Setores como agronegócio, tecnologia e energia renovável têm se destacado, mostrando que há oportunidades significativas a serem exploradas. Imaginem o que seria se a agropecuária, que brilhou nos últimos anos, mas recuou 2,3% no trimestre, tivesse registrado um bom desempenho. Ou se a taxa de investimento, indicador que sinaliza o bom desempenho da economia, estivesse acima de 20%, em vez dos atuais 16,8% do PIB. Mesmo assim, a indústria (4,2%), a construção civil (3,5%) e as indústrias de transformação (1,8%) compensaram esse recuo.

Para capitalizar esse momento positivo, é essencial que governo e iniciativa privada trabalhem juntos na implementação de reformas estruturais. Simplificar o ambiente regulatório, investir em infraestrutura e promover a inovação são passos indispensáveis para fortalecer a economia e garantir que o crescimento se traduza em desenvolvimento social e na redução das desigualdades.

Embora o cenário atual traga motivos para otimismo, não podemos nos iludir com a expansão do PIB e ignorar os obstáculos que ainda impedem o pleno potencial das empresas brasileiras. Enfrentar esses desafios com determinação e estratégia será determinante para consolidar um ambiente de negócios mais robusto e competitivo, capaz de sustentar um crescimento econômico duradouro. Crescer 1,4% na atual conjuntura global é positivo, mas poderia ser muito melhor.